terça-feira, 28 de agosto de 2018

Canivetes de estimação

fotominimalismo





Foto: AVianna, ago 2019.

pencas de orquídeas




mais belas que em vasos
florescem pencas de orquídeas
livres no quintal


Foto: Mercêdes Fabiana, jun 2018, jardim.

Nú de Egon Schiele

Meus quadros favoritos



Egon Schiele

(Schiele é um dos pintores favoritos deste blogueiro. O quadro acima atesta mais uma vez o distanciamento entre a Arte e o Belo...)

Vermelho e amarelo sobre azul

fotominimalismo




Foto: AVianna, ago 2018.

Por que proteger os padres pedófilos?


Pela quarta vez este blog volta ao tema dos abusos sexuais cometidos por padres, desde o escândalo da Pensilvânia, nos Estados Unidos. Agora, trago a opinião de peso de umHélio Schwartsman, na crônica de hoje (28.ago.2018) para a Folha: Pedofilia assombra o Vaticano – Igreja protege padres mesmo quando eles agem em desacordo com os valores apregoados.
Schwartsman, como bom filósofo, faz logo duas boas perguntas: “por que parece haver tantos casos de pedofilia envolvendo clérigos católicos e por que a igreja os protegeu em vez de denunciá-los?” 
Ele mesmo responde: “A rigor, não sabemos se padres cometem mesmo mais abusos sexuais do que a população masculina em geral. Parece razoável, porém, afirmar que o celibato exigido dos sacerdotes é uma idiossincrasia católica que merece exame. O veto ao casamento constitui uma espécie de fachada perfeita para pedófilos, já que legitima e confere elevado status social à vida de solteiro e ainda proporciona a oportunidade de interagir com jovens numa posição de poder. Não por acaso, outras atividades que atraem pedófilos incluem as de professor, pediatra, técnico esportivo, chefe de escoteiros.”
 Pedofilia é doença, e a Igreja pouco pode fazer sobre isso. Porém, os repetidos esforços para acobertar os abusos, isso é inadmissível e é a razão da indignação deste blogueiro. Pedofilia também é crime, o que exige algum tipo de punição.
A conclusão de Schwartsman é clara e ao mesmo tempo preocupante. “O problema aqui é que a igreja, a exemplo de outras organizações complexas voltadas a propagar uma ideologia, investe tanto na formação dos padres, os vetores encarregados de transmitir os memes religiosos e zelar por sua pureza, que eles se tornam mais valiosos que os fiéis. [O grifo é meu.] Mesmo quando estão agindo em desacordo com os valores apregoados, a instituição os protege.”
Não seria este o momento adequado para que toda a sociedade, independentemente da religião, discutisse abertamente o problema dos abusos sexuais, na tentativa de, se não aboli-los, ao menos reduzir sua incidência, protegendo nossas crianças?




segunda-feira, 27 de agosto de 2018

Histórias Afro-Atlânticas no MASP



O Instituto Tomie Ohtake e o MASP, duas importantes instituições culturais de São Paulo, juntam-se para criar a belíssima exposição “Histórias Afro-Atlânticas”. São curadores da mostra Adriano Pedrosa, Lilia Schwarcz, Ayrson Heráclito, Hélio Menezes e Tomás Toledo, gente da mais alta qualificação cultural.
            Estão expostas cerca de 400 obras de mais de 200 artistas, tanto do acervo do MASP, quanto de coleções brasileiras e internacionais, incluindo desenhos, pinturas, esculturas, filmes, vídeos, instalações e fotografias, além de documentos e publicações, de arte africana, europeia, latino e norte-americana, caribenha, entre outras. 
“Os empréstimos foram cedidos por algumas das principais coleções particulares, museus e instituições culturais do mundo. Entre elas, destacam-se: Metropolitan Museum, Nova York, J. Paul Getty Museum, Los Angeles, National Gallery of Art, Washington, Menil Collection, Houston, Galleria degli Uffizi, Florença, Musée du quai Branly, Paris, National Portrait Gallery, Londres, Victoria and Albert Museum, Londres, National Gallery of Denmark (SMK), Copenhague, Museo Nacional de Bellas Artes de La Habana e National Gallery of Jamaica.” (O que nos dá a dimensão artística da exposição!)
            A exposição é composta de núcleos temáticos: no Instituto Tomie Ohtake estão Emancipações; Ativismos e resistências; e no MASP, Mapas e margens; Cotidiana; Ritos e Ritmos; Retratos; Modernismos afro-atlânticos; Rotas e transes: Áfricas, Jamaica, Bahia. 
“Histórias afro-atlânticas busca, assim, oferecer um panorama das múltiplas histórias possíveis acerca das trocas bilaterais – culturais, simbólicas, artísticas, etc. – representadas em imagens vindas da África, da Europa, das Américas e do Caribe.” 
O Brasil é um território chave nessas histórias, pois recebeu cerca de 40% dos africanos que, “ao longo de mais de 300 anos, foram tirados de seus países para serem escravizados desse lado do Atlântico (número correspondente ao dobro dos portugueses que se estabeleceram no país para colonizá-lo).”  
Vale lembrar que o Brasil foi o último país a abolir a escravidão, em 1888, por meio da Lei Áurea, que completa 130 anos em maio deste ano.
Exposição belíssima (até 21 de outubro), imperdível mesmo! 




Amnésia

Flávio Cerqueira

(tinta látex sobre bronze, 2015)

Foto: AVianna, ago 2018, S.Paulo





Bólido lusitano




O fotógrafo conseguiu capturar, uma façanha, a passagem de um bólido lusitano pelas ruas de Lisboa!

Foto: Paulo Sergio Viana, ago 2018.

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Homenagem a Otavio Frias Filho



Em 31 de dezembro de 2017, Otavio Frias Filho publicou interessante artigo na Folha, sob o título Mártires do estilo. Este blog volta ao assunto, também como homenagem ao grande jornalista e intelectual. 
Diz Otavio: “Vivemos numa época em que se escreve mais do que nunca. Quem, incluindo o autor destas linhas, não gostaria de melhorar sua capacidade de expressão escrita? No entanto, se as regras gramaticais estabelecem de modo inequívoco como escrever direito, não existem regras que assegurem como escrever bem.”  
            Em seguida ele cita três manuais para bem escrever: Tirando de Letra: Orientações Simples e Práticas Para Escrever Bem (Companhia das Letras), do casal Chico e Wilma Moura;  Como Escrever Bem - o Clássico Manual Americano da Escrita Jornalística e de Não Ficção (Três Estrelas), de William Zinsser; e o terceiro livro é Guia de Escrita - Como Conceber um Texto com Clareza, Precisão e Elegância (Contexto), de Steven Pinker.
Enfatiza Otavio: “Todos os esforços em favor da simplicidade despojada são bem-vindos num país como o nosso, onde ainda se cultiva uma escrita ornamental, feita mais para iludir do que expor e esclarecer. Não se trata apenas da prolixidade afetada própria do Judiciário ou da verborragia evasiva no ambiente parlamentar. 
Bulas, manuais de uso, documentos oficiais, instruções ao consumidor etc. são redigidos de maneira nebulosa, eufemística, quando não abstrusa, no hábito deliberado de evitar compromissos e eludir responsabilidades. Comunidades inteiras (urbanistas, pedagogos e psicólogos, por exemplo) tendem a escrever num dialeto infestado de ideias vagas e substantivos abstratos que traduzem pouco sentido objetivo.”  
Simplicidade despojada, eis o que recomenda o grande jornalista, falecido recentemente. (Frias Filho esqueceu-se de acrescentar os psicanalistas, em particular os chamados lacanianos, no rol dos prolixos.)
A partir deste conselho, o da simplicidade, digo que qualquer pessoa medianamente educada pode escrever; isso, no entanto, não acontece. Escrever tornou-se um tabu, as pessoas têm pavor de escrever, uma carta que seja. Dizem, Não sei escrever. Perdem a oportunidade de praticar algo muito simples, que chamo de terapêutico. 
Aqui vai minha dica para os que não têm o hábito de escrever constantemente: escreva hoje uma carta a um amigo, parente, pessoa a quem você estima. Vamos torcer para que ele responda...
                        



A menina Denny



Richard Roberts, Vladimir Ulianov e Maxim Kozlikin na gruta de Denisova,
onde foram achados os restos da jovem híbrida
Foto: IAET SB RAS, SERGEI ZELENSKY



A manchete do artigo de Daniel Mediavilla para El País de ontem 
(22 ago 2018)é espetacular:Achada a primeira filha fruto do sexo entre duas espécies humanas diferentes.
            Diz a reportagem: “Há mais de 50.000 anos, uma mulher neandertal e um homem denisovano fizeram sexo e alguns meses depois ela deu à luz uma menina. Muitos séculos mais tarde, numa gruta siberiana junto à cordilheira de Altai, foram encontrados os ossos que deixou aquela menina híbrida, que teria 13 anos ao morrer. Há quase uma década se sabe que os neandertais, denisovanos e humanos modernos tiveram descendência em algumas circunstâncias, mas nunca havia sido encontrado um filho de um casal misto.” 
Os genomas das duas espécies indicam que elas se separaram há mais de 390.000 anos. Entretanto, continuaram procriando em territórios de fronteiras comuns. Ocorreram relações ocasionais entre as espécies do gênero humano que compartilhavam o mundo há dezenas de milhares de anos. “O genoma de Denisova 11, ou Denny, como foi chamada a garota, mostra que a relação de seus progenitores não era o primeiro cruzamento entre espécies da sua família. O pai também tinha neandertais entre seus antepassados.” 
Sabe-se que os humanos modernos fizeram sexo com neandertais há pelo menos 100.000 anos, e hoje todos os habitantes do planeta, salvo os subsaarianos, têm em seu genoma DNA daquela espécie extinta. 
Afirma Mediavilla: “As incógnitas em torno daquela etapa da humanidade, quando os humanos ainda não tinham imposto sua lei e pelo menos três espécies tremendamente inteligentes compartilhavam planeta e fluxos, são abundantes.” 
“No entanto, trabalhos como o publicado nesta quarta são uma amostra de que a ciência pode abrir janelas inesperadas para o passado. Em 2006, o pesquisador Bruce Lahn, da Universidade de Chicago, propôs que neandertais e humanos tinham intercambiado genes há 40.000 anos.” 
Conforme contou então ao El País, as revistas Science Nature recusaram-se a publicar o trabalho porque consideravam que esse cruzamento era impossível. Em apenas uma década, aquela visão sobre o sexo no Pleistoceno e suas consequências ficou de pernas para o ar.”

Reside aí a beleza do chamado Pensamento Científico: a partir de fatos novos, a compreensão da vida se renova, às vezes muda completamente, dá uma cambalhota, para se renovar mais adiante. Embora necessária, é difícil tolerar a incerteza. Daí o aparecimento do Pensamento Religioso (nada contra a Religião), bem mais primitivo, onde as verdades são dogmáticas, imutáveis, baseadas exclusivamente em crenças, sem o amparo dos fatos. 



terça-feira, 21 de agosto de 2018

Miséria


Com as mãos em garra, sequela da lepra, foi perguntado onde morava. Respondeu:
– Naquela manilha que desemboca no Ribeirão das Mortes.

Filme de terror


Ao saber que o filho de 7 anos havia sido abusado, tomou do 38 e, em plena missa, desfechou 6 tiros no padre.

4 presentes de aniversário (microcontos)


I

Perguntou à filha de 4 anos o que ela queria de presente de aniversário.
– Um tablet novo.


II

Perguntou à filha de 8 anos o que ela queria de presente de aniversário.
– Um tablet novo.


III

Perguntou à filha de 12 anos o que ela queria de presente de aniversário.
– Um tablet novo.


IV

Nada mais perguntou.

Dez chamamentos ao amigo 3

III

Se refazer o tempo, a mim, me fosse dado
Faria do meu rosto de parábola
Rede de mel, ofício de magia

E naquela encantada livraria
Onde os raros amigos me sorriam
Onde a meus olhos eras torre e trigo

Meu todo corajoso de Poesia
Te tomava. Aventurança, amigo,
Tão extremada e larga

E amavio contente o amor teria sido.

Hilda Hilst
Júbilo, memória, noviciado da paixão
In Da poesia, Hilda Hilst, Comp. das Letras, 2017

Saint-Michel et Notre-Dame

Meus quadros favoritos


Maximilien Luce


Foto: AVianna, Paris, 2016.

Fotoabstração N. 49





Foto: AVianna, maio 2016.

Sunset

Meus quadros favoritos


Joseph Arthur Palisser Severn

Aquarela! (1887)

Abusos na Pensilvânia: alguma repercussão

Há poucos dias este blog reclamou da pouca ou nenhuma repercussão resultante da denúncia de abusos sexuais na Pensilvânia, Estados Unidos, incluindo uma resposta satisfatória do Vaticano. (http://loucoporcachorros.blogspot.com/2018/08/padres-predadores-da-pensilvania.html)
       A resposta através de carta pontificial veio ontem; se satisfatória, é uma outra questão. (Este blog também se manifestou sobre isso: (http://loucoporcachorros.blogspot.com/2018/08/ainda-os-abusos-da-pensilvania.html)
       Hoje surge artigo na Folha de S. Paulo (21.ago.2018), assinado por Mariliz Pereira Jorge, à altura que o escândalo merece, a começar pelo estrondoso título: Por onde anda Deus quando um padre estupra uma criança?
       Afirma Mariliz: “O relato dos casos é de embrulhar o estômago dos mais fortes. Na Argentina, o caso mais estarrecedor é de estupro e espancamento de crianças surdas, cometidos por padres nas cidades de La Plata e Mendoza. Na Austrália, perto de 4.500 denúncias foram feitasàs autoridades eclesiásticas e uma investigação descobriu que 7% dos sacerdotes foram acusados de abuso contra menores. O Ministério Público brasileiro investiga casos denunciados na Paraíba. Tudo em sigilo.” 
       Há uma nova e estarrecedora informação, a de que 
no caso da Pensilvânia o Vaticano sabia de algumas ocorrências desde a década de 1960. Desde então, “padres, bispos, cardeais eram afastados das paróquias e, pasme, transferidos para outras onde cometiam de novo, de novo e de novo monstruosidades contra indefesos. Eram promovidos ou, no máximo, transferidos para Roma, numa aposentadoria compulsória, como essas que acontecem quando gente do Judiciário brasileiro faz merda”, enfatiza Mariliz.
Mariliz bate forte: “Nem Francisco se salva dessa lama em que a Igreja Católica afunda a cada dia. Apesar de ter pedido tolerância zero, teve uma das atitudes que mostram a serviço de quem ele está ao pedir provas das vítimas chilenas, quando esteve no país no ano passado, e foi cobrado por causa dos escândalos envolvendo um padre e um bispo. Não foi o único caso em que se colocou ao lado dos agressores.”
Mariliz demonstra a mesma revolta deste blogueiro diante desses crimes que permanecem e permanecerão impunes; diz ela, “cadê a indignação, a gritaria e os protestos contra essas atrocidades? Tão importante quanto, por onde anda Deus na hora em que um padre estupra uma criança de seis anos?”






segunda-feira, 20 de agosto de 2018

Mergulho na literatura



A ilustração acima encabeça interessantíssimo artigo de Alberto Manguel, sobre as primeiras palavras de livros famosos, publicado em El País (18 ago 2018). (https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/15/cultura/1534349346_859583.html)
            De tão sugestiva – um mergulho na literatura – e tão bem elaborada, a ilustração ganhou destaque neste blog.
Autor: Pep Boatella.

Ainda os abusos da Pensilvânia

O Vaticano divulgou nesta segunda-feira (20-ago-2018) carta do papa Francisco direcionada aos católicos: ele reconhece que abusos sexuais cometidos por membros da Igreja Católica dos EUA foram acobertados (ao menos "301 padres predadores" abusaram de mais de mil crianças). (Como poderia não os reconhecer?)
"Mostramos não ter nenhum cuidado com os pequeninos; os abandonamos", escreveu o papa. 
         “É essencial que nós, como igreja, sejamos capazes de reconhecer e condenar, com dor e vergonha, as atrocidades perpetradas pelas pessoas consagradas, clérigos e todos aqueles a quem confiamos a missão de zelar e cuidar dos mais vulneráveis", disse.
O papa afirmou ainda que a maioria dos casos "pertençam ao passado”. (Para os abusados, trata-se de um passado que não passa.)
Francisco pediu que todos os católicos ajudem a igreja a "extirpar" a cultura do abuso "em nossas comunidades". 
Ativistas ligados às vítimas de abuso sexual pela igreja expressaram desapontamento em relação à fala de Francisco. É verdade que Francisco chamou os casos de "crimes", ao contrário da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, que se referiu apenas a "pecados e omissões" em resposta ao relatório da Pensilvânia.
"Mais ações, menos palavras", disse Anne Barrett-Doyle, co-diretora da BishopAccountability.org, centro americano que registra casos de abusos pela igreja ao redor do mundo. 
Aquelas pobres crianças, infelizmente, não têm voz própria para se defenderem.




Paraíso Perdido, o Filme!



Um bom filme lava a alma!
         Assisto o argentino/espanhol O Cidadão Ilustre e me delicio com a mistura literatura e cinema; vejo o americano Luckyque me fala ao coração ao tratar da velhice e da morte; e agora me deparo com filme brasileiro da melhor qualidade, comparável ao melhor cinema do mundo, com o título maravilhoso de Paraíso perdido, que trata da paixão.
         Não há outra razão para colocá-los juntos nesta crônica, a não ser que ambos têm bons diretores, ótimos atores, uma boa história para ser contada, e excelentes roteiros. Que mais é preciso para se rodar um bom filme?
         A baiana nascida em Salvador Monique Gardenberg (1958) é cineasta, diretora teatral e produtora cultural. Pensou realizar um filme popular; recorreu à musica dita brega e foi buscar um clássico do gênero, Márcio Greyck, autor de Impossível Acreditar que Perdi Você: “Venha me dizer sorrindo / Que você brincou / E que ainda é meu / Só meu, o seu amor.”   
(Interrompo aqui esta crônica e peço ao meu caro leitor que ouça essa música, composta em 1973, antes de prosseguir na leitura: https://www.youtube.com/watch?v=N9N1ymZObCg).
         Monique reuniu elenco espetacular: Erasmo Carlos, Júlio Andrade, Seu Jorge, Hermila Guedes, Júlia Konrad, Malu Galli, Jaloo, Lee Taylor, Humberto Carrão, Marjorie Estiano e outros. O desempenho de cada um deles, a começar por Erasmo Carlos, o patriarca da família, certamente sob a melhor direção, é ponto alto do filme. (Erasmo conta que a diretora o orientou a assistir a "Violência e paixão" (1974), do diretor italiano Luchino Visconti, para compor o personagem.)
         A história se passa num cabaré ou boate de qualquer cidade brasileira. Melhor dizer as histórias, pois a trama é composta de histórias de amor dos membros da família que administra a boate. Homofobia, violência contra a mulher, amor livre, a paixão levada ao limite extremo, são apresentados através de fantástica trilha sonora (a cargo de Zeca Baleiro).
         A música brega embala a paixão vivida por cada um: o sofrimento de um homem cuja mulher desapareceu, a paixão de um travesti por um rapaz que não se aceita homossexual, o amor livre entre duas ex-presidiárias e um policial, o cantor que deseja ser ator (Seu Jorge está magnífico nesse papel, além de ser um grande cantor). Paixão na medida certa.
         Compõem a trilha sonora nomes bem conhecidos como Márcio Greyck, Reginaldo Rossi, Ângela Maria, Paulo Sérgio, Odair José, José Augusto, Roberto Carlos, Zé Ramalho, Waldick Soriano e outros mais.   
         Eis como a diretora define seu filme: “O filme é um grito de amor e liberdade em contraposição a esse conservadorismo e moralismo, que eu não esperava do Brasil”. ..."É uma homenagem a essa música romântica que já foi tão rejeitada e vítima de preconceito, exatamente como nos outros temas que trato no filme.”  ... Completa Marjorie Estiano: "Para mim, brega é uma maneira extrema, desmedida e rasgada de falar. Não acho que seja pejorativo. Às vezes, dizemos como é preciso se portar para parecer elegante. Mas no amor não há esse lugar de elegância".
         Uma palavra sobre Ímã, personagem central do filme, representada por Jaloo, um estreante no cinema. Dono de voz original, potente, canta vestido de mulher mas só admite ser chamado de homem.
         Enfim, um grande e emocionante filme, brasileiríssimo! 

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Copo-de-leite

fotominimalismo




Foto: AVianna, Paris, mai 2016.


Cheiro de chuva



“Por que o cheiro da chuva é tão bom?” A pergunta serve de título para o artigo de Mary Halton, repórter de ciência da BBC News (12 ago 2018).
Diz Halton: “Bactérias, plantas e até trovoadas têm influência no aroma de ar limpo e terra molhada que a gente sente após uma tempestade.” 
Conhecido como "petrichor", esse odor tem sido estudado por cientistas e fabricantes de perfume. A palavra "petrichor", cunhada por dois pesquisadores australianos, vem do grego "petros" (pedra), e de   "ichor" (o fluido que passa pelas veias dos deuses). Esse cheiro que a gente sente quanto a chuva bate no solo é produzida por uma molécula   criada por um certo tipo de bactéria.
Essa molécula é o "geosmin", produzido pela bactéria Streptomyces, presente na maioria dos solos saudáveis, e que também é usada para produzir alguns tipos de antibióticos. Quando as gotas de água caem na terra, fazem com que o geosmin seja lançado no ar, tornando-o bem mais abundante do que antes da chuva.
De acordo com Nielson, “pesquisas sugerem que o geosmin pode estar relacionado ao "terpeno"- fonte do perfume de várias plantas. 
E a chuva pode acentuar essas fragrâncias.
"Normalmente, as químicas das plantas que têm cheiro bom são produzidas pelos 'cabelos' das folhas. As chuvas podem danificar as folhas e, com isso, soltar os componentes dela".  
"A chuva também pode romper materiais secos das plantas, liberando substâncias químicas de forma similar a quando quebramos e esmagamos ervas. Com isso, o cheiro fica mais forte."
Períodos de seca também podem reduzir o metabolismo das plantas. O retorno das chuvas pode desencadear uma aceleração, fazendo com que as plantas exalem um cheiro agradável.”  
As trovoadas também desempenham um papel relevante, ao criar um aroma de ozônio acentuado e limpo, em decorrência das descargas elétricas na atmosfera. 




Blanchot e a questão da arte



A questão da arte

“Em que consiste a arte, em que consiste a literatura? A arte é para nós, então, coisa do passado? Mas por que essa pergunta? Ao que parece, teria sido outrora a linguagem dos deuses, que os deuses, tendo-se evadido, deixaram no mundo como linguagem que fala da ausência dos deuses, da falta deles, da indecisão que ainda não resolveu o destino deles. Fazendo-se a ausência mais profunda, tendo-se tornado ausência e esquecimento de si mesma, parece que a arte procura tornar-se a sua própria presença mas, em primeiro lugar, oferecendo ao homem o meio de se reconhecer, de se satisfazer a si mesmo. Nesse estágio, a arte é o que se chama humanista. Ela oscila entre a modéstia de suas realizações úteis (a literatura torna-se cada vez mais prosa eficaz e interessante) e o inútil orgulho de ser essência pura, o que se traduz mais frequentemente pelo triunfo dos estados subjetivos: a arte torna-se um estado de alma, é “crítica da vida”, é a paixão inútil. Poético quer dizer subjetivo. A arte assume a figura do artista, o artista recebe a figura do homem no que este tem de mais geral. A arte exprime-se na medida em que o artista representao homem que ele não é somente como artista.”

                  Maurice Blanchot
                  O espaço literário
                  Ed. Rocco, 2011.

Olha eu aqui!

Charge do dia


O cão humaniza a família.

Padres predadores da Pensilvânia

A BBC News Brasil traz hoje (16.ago.2018) na Folha de S. Paulo notícia mais detalhada sobre “Os chocantes casos de abuso cometidos por 'padres predadores' contra centenas de menores nos EUA”.
O documento divulgado pela Suprema Corte da Pensilvânia afirma: "Nós, membros deste grande júri, precisamos que vocês ouçam isso. Talvez alguns de vocês tenham escutado algo parecido antes... Mas nunca nesta escala". "Para muitos de nós, esse tipo de histórias ocorreram em outro lugar, em algum lugar distante. Agora sabemos a verdade: ocorreram em todas as partes".
Trata-se de mais de mil menores de idade ou mais, que foram abusados sexualmente ao longo de 70 anos por cerca de 300 padres de seis dioceses do estado da Pensilvânia.
O documento de 900 páginas revela em detalhes os mais diferentes tipos de abuso, "enquanto funcionários eclesiásticos tomavam medidas para encobri-los".
O artigo da BBC apresenta em seguida detalhes de seis casos exemplares, com os seguintes títulos:um abuso disfarçado de 'exame de câncer'; 'por favor, ajude-me, abusei sexualmente de uma criança'; o padre que engravidou uma jovem de 17 anos; uma criança nua na casa do pároco; vítimas identificadas por cruzes de ouro; o padre que providenciou um aborto para sua vítima.
O procurador conclui: "O padrão foi de abuso, negação e ocultação". “E o pior, destacou ele, é que ainda que a lista de padres que cometeram abusos seja longa, "não acreditamos que o relatório abrange todos". "Temos certeza de que muitas vítimas nunca se apresentaram para testemunhar”.
            A mídia tem dado pouco destaque a esta tragédia. (O artigo em questão nem ao menos é assinado.) O Vaticano permanece em silêncio. O governo dos Estados Unidos não se pronuncia. Dizem que os crimes são antigos e estão prescritos.
            Se as vítimas continuam sofrendo os efeitos dos traumas, como é possível falar em prescrição dos crimes?
            Que religião é essa?



quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Homenagem aos 100 anos de nascimento de Irving Penn


Marlene Dietrich, 1948
Foto: Irving Penn



A retrospectiva em homenagem aos 100 anos de nascimento do fotógrafo norte-americano Irving Penn apresentará, no IMS Paulista, mais de 230 fotografias concebidas ao longo de quase 70 anos de carreira, além de cerca de 20 periódicos. Serão exibidas suas em Nova York, América do Sul e México, retratos de povos indígenas de Cuzco, no Peru, e retratos de figuras como Truman Capote, Picasso e Joan Didion. 

A exposição, que ficará em cartaz de 21 de agosto a 18 de novembro de 2018 no IMS Paulista, é organizada pelo The Metropolitan Museum of Art, em colaboração com a Fundação Irving Penn. A itinerância internacional foi possível graças ao apoio da Terra Foundation for American Art.





Tradição em Paris

A foto do dia


Mictórios a céu aberto
causam polêmica em Paris

Foto: Thomas Samson / AFP

É tradição em Paris a existência de mictórios públicos, abertos, digamos "no meio da rua e de todos"! O que é comprovado pela interessantíssima, até histórica, foto abaixo, datada de 1875.



Pode ser de mau gosto, mas que alivia, alivia...

terça-feira, 14 de agosto de 2018

Jogadores de cartas

Meus quadros favoritos


Paul Cézanne


Dez chamamentos ao amigo 2



II

Ama-me. É tempo ainda. Interroga-me.
E eu te direi que o nosso tempo é agora.
Esplêndida avidez, vasta ventura
Porque é mais vasto o sonho que elabora

Há tanto tempo sua própria tessitura.

Ama-me. Embora eu te pareça
Demasiado intensa. E de aspereza.
E transitória se tu me repensas.


Júbilo, memória, noviciado da paixão
In Da poesia, Hilda Hilst, Comp. das Letras, 2017

Mata um homem e come


Da série
Mais 47 cenas do romance familiar


Menino bem pequeno, duas falas de minha mãe soavam-me incompreensíveis, enigmáticas mesmo, não faziam qualquer sentido, com a agravante de que eu não dispunha do vocabulário de hoje para enfrentá-las, o que me causava indiscutível angústia e irritação maior ainda. O que será que ela quer dizer com isso, perguntava-se o menino pequeno.
            – Mãe, tô com fome.
            – Mata um homem e come!
            Como assim, mata um homem e come? Se eu repetia Tô com fome, lá vinha ela com a mesma absurda resposta. Já podia compreender que a ordem não era para ser obedecida literalmente. Então, o quê?
            Hoje eu sei, era apenas uma rima.
            A segunda fala, não menos misteriosa, causava-me ainda maior irritação, pois trazia um quê de obscenidade, o que era imperdoável, vinda de minha mãe. Quando o menino pequeno era contrariado em sua vontade de reizinho, reagia com ostensiva raiva, inconformado. Ao que a mãe retrucava:
            – Tá com raiva? Tira a cueca e pisa em cima.
            Não me lembro se naquele tempo eu já usava cuecas – palavra carregada de sensualidade! –, mas como seria possível que minha raiva passasse ao pisar numa cueca? A raiva escoaria pelo chão qual raio vindo do céu em dia de tempestade? 
            Incrível mesmo era o efeito de tais palavras: de início a raiva aumentava, para em seguida diminuir, até desaparecer. A mãe não conhecia a expressão, mas já sabia como “desmoralizar o sintoma”.
            

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Acidente

Da série
Mais 47 cenas de um romance familiar


Sentávamos à mesa alguns minutos antes das onze porque às onze em ponto o almoço era servido, o pai na cabeceira, a mãe no lugar mais próximo da cozinha, os filhos em silêncio. A panela de arroz era destampada e o perfume inundava a sala de jantar.
            Falava-se pouco durante a refeição. Vez ou outra um filho distraído batia com a mão num copo com água ou refrigerante, e o líquido despejado na toalha acarretava no pai reação violenta, que exclamava aos berros: 
– Ôôô lerdeza! 
O responsável pelo desastre tremia de pavor, o almoço estragado.
A partir de certa época, o pai passou a colocar água ou refrigerante apenas até a metade dos copos.


sexta-feira, 10 de agosto de 2018

Partituras inéditas de Villa-Lobos


Partituras inéditas de Heitor Villa-Lobos 
Foto: Dida Sampaio/Estadão


A reportagem é de João Luiz Sampaio, para o Estado de S. Paulo (10 Ago 2018): encontrado em Brasília manuscrito considerado perdido do compositor Heitor Villa-Lobos.  Trata-se da parte de piano do Concerto Brasileiro para Dois Pianos e Coro, estreado no Rio de Janeiro em 1934 pelo próprio compositor e pelo pianista José Vieira Brandão. O achadofoi realizado pelo pesquisador Alexandre Dias, criador e diretor do Instituto Piano Brasileiro. 
Informa Sampaio que a partitura referente às intervenções do coro já pertencia ao acervo do Museu Villa-Lobos, mas, sem o restante da música. “Na verdade, sem a parte do piano, não dava para entender exatamente o que o compositor buscava alcançar com a partitura. Agora, é possível enxergar com mais clareza o que ele propunha”, explica Dias. 
A história da descoberta começou há alguns meses, quando Márcio Brandão, filho de José Vieira Brandão, procurou o Instituto Piano Brasileiro, criado em 2015 com o objetivo de reunir, digitalizar e editar acervos de compositores e pianistas brasileiros. “José Vieira foi grande amigo, o braço direito de Villa-Lobos, estreou obras como suas Bachianas Brasileiras n.º 3 e o Ciclo Brasileiro”, lembra Dias. “O Márcio tinha 145 pastas grandes com manuscritos, fotos, cartazes, programas, gravações. Para se ter uma ideia, já digitalizamos cerca de 8 mil páginas, e isso corresponde a 10% do material que estava disponível.”
Entre esse material, Diasencontrou uma partitura com a anotação Atrevido, escrita para dois pianos. “Ali o sinal de alerta acendeu, porque o Concerto Brasileiro foi uma homenagem a Ernesto Nazareth, e sabíamos que nele o Villa evocava duas obras dele, Atrevido e Odeon. Comparamos então com a parte do coro e elas se sobrepunham, encaixavam.”
O Instituto Piano Brasileiro é uma iniciativa de Dias, que, ao lado de alguns parceiros, já descobriu peças inéditas de Nazareth, João Pernambuco e Fructuoso Viana, entre outros autores. Em três anos, mais de 200 mil documentos já foram digitalizados, além de centenas de gravações, muitas delas inéditas. 
“No IPB, Dias conta com a ajuda de alguns pesquisadores parceiros, mas, sem patrocínio, depende de uma campanha de crowdfunding para bancar o trabalho, além de investir do próprio bolso no projeto. “Cada material é importante. Quando a última edição de uma obra desaparece, é como um animal que entra em extinção. Mas, mais do que isso, no momento em que tudo é catalogado e digitalizado, é possível cruzar informações, entender a história do piano no Brasil, descobrir novos repertórios, oferecê-los a artistas”, explica ainda.”
 A obra de Villa-Lobos é monumental em qualidade e extensão. Resta muita coisa a ser descoberta, catalogada, editada e principalmente gravada, para alegria de seus admiradores.