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sexta-feira, 2 de julho de 2021

Quase feinhos





quase feinhos
humildes
o pequeno bando
de quatro pardais
banha-se
na bacia de baixo

na bacia de cima
forte bravo ditador
reina o bem-te-vi
cercado de sedentas abelhas








Fotos: AVianna, jun 2020

quarta-feira, 7 de abril de 2021

A rua da minha casa em tempos de pandemia

 



às !0 horas e 46 minutos de uma 
                                        [quarta-feira

chego até o portão

as casas todas em silêncio

esperança de encontrar algum ser vivente

não ouço nem mesmo o latido de um cão

o gato malhado se esconde no bueiro

pardais não pousam nos fios de 

                                        [eletricidade

as árvores parecem tristes

a rua da minha casa completamente 

                                        [deserta

uma caçamba de recolher entulhos

poderia dar sinal de que ainda há vida 

                                        [por aqui

nem isso

eu, só 

            – atrás de grades




Foto: AVianna, abr 2021

 

quarta-feira, 31 de março de 2021

poema moderninho escrito depois do banho dos passarinhos

 

quando a cabeça arruína

fica difícil escrever

vou olhar passarinhos

se banharem 

na fonte do meu jardim

primeiro banha o amarelo

depois os azuis

eles têm suas regras

que seguem à risca

esse o jeito que inventei

de desarruinar a cabeça

quando não consigo escrever








Fotos: AVianna, mar 2021

domingo, 28 de fevereiro de 2021

gatafunho de poema

Para a Ciça




gato gosta de bagunça

caixa vazia

panos velhos

papeis sobre a mesa onde

refestelado repousa repetidamente

sua imemorial preguiça

vida vagarosamente arrastada

bicho (ou é gente?)

indecifrável

imprevisível

indomável

chamado gato



Foto: Cecília Vianna, fev 2011

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

escoa a vida

 

escoa a vida

me agarro a fiapos

tênues frágeis fios

de esperança

conduzem antes à morte

que à lida

despenco no abismo

habitado por Caos

fundo infindo

por onde escoa a vida

para o mineral

princípio de tudo

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

como se fosse


 



caminho pelo jardim

e vejo as coisas

como se as visse

pela última vez

o mogno gigante

o abacateiro a mangueira o limoeiro

as flores, ah as flores

sabiás bem-te-vís pardais joões-de-barro

brincam à roda de mim

tudo me parece belo

tão familiar que faz parte de mim

velho e novo ao mesmo tempo

acaricio meus cães 

como se fosse a derradeira vez

não sinto pena

não sinto saudade

o que sinto é amor

por meus cães

pelo meu jardim 

 

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

em algum lugar de minha juventude

 

em algum lugar de minha juventude

tempo em que acreditava em Deus

li em Saint-Exupéry 

“é melhor descascar batatas pelo amor de Deus

que edificar catedrais”

 

chegada a velhice

açoitado pela doença e pela peste 

tempo em que não mais acredito em Deus

Saint-Exupéry ainda vem em meu auxílio

 

na cozinha de minha casa

descasco batatas de verdade

coloco-as para cozinhar

tempero com alho cebola pimenta

à espera da companheira

 

quando ela chega o almoço está pronto

ganho elogios pelas batatas

penso que é melhor descascar batatas

pelo amor à vida que me resta

 

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

o amolador


o som agudo da flauta

invade a casa

os cães latem

 

outra vez a flauta do amolador de facas

chega aos meus ouvidos

a me lembrar que a vida continua

 

a despeito das máscaras

do isolamento

do perigo da faca amolada

 

no ar a ameaça permanente

da foice amolada

a flauta em silêncio

 


quarta-feira, 18 de março de 2020

aconchegadamente




se deseja varanda acolhedora
cubra o piso com lajotas
use boa madeira de guarda
pinte de branco as paredes
forre o teto com madeira
decore-a com diversas plantas 
de variadas flores e perfumes
e espere vinte anos
até que tudo se ajeite
aconchegadamente


Foto: AVianna, mar 2020
iPhone 11

sábado, 1 de fevereiro de 2020

morre a grande árvore



pavoroso estrondo 
tomba a grande árvore
pessoas morrem
cães morrem
árvores morrem
ainda que mais brando
vivo este luto
arrancada pela raiz
brutalmente
morre a grande árvore
a serra elétrica lhe despedaça o corpo 


terça-feira, 21 de janeiro de 2020

o tronco e a flor






a flor precisa do tronco
que é suporte – ampara protege
o tronco não precisa da flor
sempre viveu sem ela
quando a flor fenece
posto que tanta beleza
não pode durar para sempre
o tronco – agora só tronco
é desalento solidão



Foto: AVianna, fev 2010, jardim.

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

envelhecimento





há beleza no envelhecimento
da primeira folha da palmeira
desaparece o verde
surge o castanho avermelhado
quase dourado
para melhor refletir o sol
há sabedoria no envelhecimento
da primeira folha da palmeira 




Foto: AVianna, jan 2020
iPhone 11 Pro Max

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

janelas de Sevilha








janelas de Sevilha
não são janelas
são portas
que se abrem para dentro
jardins
fontes
perfume
luz do sol
penetram pelas janelas de Sevilha


Fotos: AVianna, out 2008.



terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Beija-flor repousa





                    o beija-flor repousa
                    terá aprendido em algum lugar
                    o significado da palavra
                    camuflagem
                    ou nasceu sabendo
                    como todos nós
                    e nossos instintos


Foto: AVianna, fev 2008, jardim.

sábado, 6 de julho de 2019

ingenuidade







diante da imensidão
da montanha
o fotógrafo ingênuo
procura captar a emoção
da primeira vez 
que a viu de perto
mil fotografias são insuficientes
ele guarda a máquina
olha para a cordilheira
e chora


Fotos: AVianna, jun 2019, Mendoza
IPhone8

domingo, 30 de junho de 2019

imensa cordilheira




a imagem da cordilheira
imensa
majestosa 
cheia de mistério 
impregnou a retina do viajante 

ele revê fotografias
compulsivamente 
na esperança de reencontrar o sentimento 
provocado pela experiência 
de vê-la de perto 

imensa cordilheira 
cheia de mistério




Foto: AVianna, jun 2019, Mendoza
IPhone8

segunda-feira, 9 de julho de 2018

passantes

A foto do dia


Serra da Mantiqueira



passantes

de onde vêm
para onde vão
os que passam
por essa estrada?

vistos do alto
parecem insetos
sem rumo desgarrados
perdidos no tempo

perdidos no espaço
buscam algum sentido
para uma existência
que não podem compreender

não importa de onde vêm
para onde vão
os que passam
por essa estrada

apenas passam



Foto: Paulo Sergio Viana, jul 2018

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Ainda 30 anos depois

NO MEIO DO CAMINHO

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

CDA



QUADRILHA

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

CDA


30 ANOS DEPOIS

faz falta
na vida de gente
um homem que escreva
essas coisas
alegre nossos dias
ou nos faça chorar
com o suicídio
de Joaquim
que também não havia entrado na história
tal qual J. Pinto Fernandes
que pelo menos
casou-se com Lili


Pobre homenagem a CDA

terça-feira, 25 de julho de 2017

presença do pai


almoço servido às onze
em ponto e ai do filho
se não estivesse à mesa
às onze em ponto
mãos lavadas roupa limpa
à espera do arroz fumegante
do feijão fumegante
exigências do pai
à cabeceira da mesa
a comandar todas as coisas

ainda hoje quando destampo
a panela do arroz fumegante
sinto a presença forte
do meu pai tentando
comandar a hora do almoço
a comida bem quente
e todas as coisas