Com o título A
república das Marcelas, o reino das princesas e o sonho das meninas, a
senhora Angela Alonso, professora do departamento de sociologia da USP e
presidente do Cebrap, analisa o comportamento da primeira-dama do país em crônica
publicada ontem (23/10/2016) em
caderno nobre – Ilustríssima – da Folha de S. Paulo.
A senhora Angela é
bastante agressiva, para dizer o mínimo, em seu texto:
“A
primeira-dama reza por breviário mais simples e bem conhecido. Trafega em zona
ultrassegura, nada precisa prover ou provar. Tem as contas pagas, as falas
prontas, a vida decidida. Nem o nome do filho careceu escolher: no menino se
reproduziu o senhor seu pai.
Marcela
não se exprime, comparece. No papel de compor a paisagem, talvez visasse o
estilo Jackie Kennedy, da simplicidade elegante. Mas acabou em campo retrô,
meio Barbie, meio Rapunzel, entre dois mundos, o da boneca, boa moradia para
ex-miss dedicada ao consumo, e o reino do faz de conta, onde se encastela qual
a mocinha do cabelão.
A
senhora Temer pertence a uma linhagem, a das primeiras-damas decorativas,
afeitas ao serviço social –a caridade, a filantropia e outras formas de
generosidade talhadas para camuflar a desigualdade.”
Passado o
ataque pessoal à primeira-dama, a senhora Angela chega então à essência de seu
pensamento, ao comentar sobre o modelo de comportamento feminino esperado:
“Recomendam
às meninas se distanciarem dos assuntos públicos em troca de um reinado
doméstico. ... a Marcela de verdade encarna um ideal: o da princesa. ... A
educação para o casamento avança com candura, como avançam pelo país os
profetas do reino de Deus e os arautos do Estado liberal. Aí se abre amplo
mercado para a herdeira de Silvio Santos. Se seguir a trilha dos negócios
paternos, sua franquia logo abastecerá o país com profusão de princesinhas,
prontas a seguirem em júbilo os passos de Marcela. ... Todo sonho de menina é
tornar-se uma princesa".
Porém,
bem no final da crônica a senhora Angela acerta a mão:
“O
sonho de toda menina devia ser se tornar o que quiser. [O país] precisa de
mulheres de nervo e cérebro.”
Eis a
questão: é preciso atacar a pessoa de Marcela Temer, para defender o direito
das mulheres, que elas deixem de viver à sombra dos maridos, que se tornem
independentes, que possam educar-se cada vez mais, que sejam donas do próprio
nariz, enfim, o que toda pessoa minimamente esclarecida pensa nos dias de hoje?
A virulência da senhora Angela resulta exatamente naquilo que ela condena, o direito da mulher ser o que ela quiser.
Marcela tem esse direito. Todos temos.
Senhora Angela, para desfazer o infantil ideal de princesinha não é preciso perder a ternura e a elegância.