sexta-feira, 21 de abril de 2017

Suzete atordoada


Meu querido André,

olha eu de novo aqui!
            Tenho acompanhado você pelo Louco por cachorros, blog informativo, divertido, que faz pensar, rir, até chorar. Daí a vontade de lhe escrever, eu que me sinto muito só, angustiada com a situação vergonhosa em que vive o nosso Brasil. Confesso que ando atordoada.
            Acompanho o canal de notícias GloboNews, e me chamou a atenção um anúncio que não é bem um anúncio, porém inteligente, que diz o seguinte: “é tanta coisa acontecendo (ao mesmo tempo) que nós decidimos te dar alguns segundos para não pensar em nada”, e então surgem imagens como um hipopótamo e seu filhote entrando na água, nuvens sobre montanhas, coisas desse tipo, aparentemente sem sentido, que não querem dizer nada, para o expectador não pensar em nada.
            Essa história de não pensar em nada achei uma grande babaquice (olha o Mirisola aí!). Mas a ideia de que está acontecendo muita coisa ao mesmo tempo, achei isso uma grande verdade: talvez seja a causa do meu atordoamento.
            Os poucos segundos que o tal anúncio oferece para a gente não pensar não são suficientes. Então resolvi desligar a tv e escrever a você. Sobre o quê? Tudo, menos essa situação que envergonha, dá raiva, entristece, faz a gente desacreditar no país e até na vida.
            Quero falar do livro Oswald de Andrade – Poesias Reunidas, que você divulgou no blog. Você só não disse que o homem era meio difícil, aliás muito difícil, pelo menos pra mim. Mas tem um livro dele que eu adorei: Cântico Dos Cânticos Para Flauta E Violão. E que começa assim:

oferta

Saibam quantos este meu verso virem
Que te amo
Do amor maior
Que possível for

canção e calendário

Sol de montanha
Sol esquivo de montanha
Felicidade
Teu nome é
Maria Antonieta d`Alkmin

No fundo do poço
No cimo do monte
No poço sem fundo
Na ponte quebrada
No rego da fonte
Na ponta da lança
No monte profundo
Nevada
Entre os crimes contra mim
Maria Antonieta d`Alkmin

Felicidade forjada nas trevas
Entre os crimes contra mim
Sol de montanha
Maria Antonieta d`Alkmin

Não quero mais as moreninhas de Macedo
Não quero mais as namoradas
Do senhor poeta
Alberto d`Oliveira
Quero você
Não quero mais
Crucificadas em meus cabelos
Quero você

Não quero mais
A inglesa Elena
Não quero mais
A irmã da Nena
Não quero mais
A bela Elena
Anabela
Ana Bolena
Quero você

Toma conta do céu
Toma conta da terra
Toma conta do mar
Toma conta de mim
Maria Antonieta d`Alkmin

E se ele vier
Defenderei
E se ela vier
Defenderei
E se eles vierem
Defenderei
E se elas vierem todas
Numa guirlanda de flechas
Defenderei
Defenderei
Defenderei

Cais de minha vida
Partida sete vezes
Cais de minha vida quebrada
Nas prisões
Suada nas ruas
Modelada
Na aurora indecisa dos hospitais

Bonançosa bonança

            Gostei muito do poema. Não sei quem é esta tal de Maria Antonieta d`Alkmin nem quero saber, mas morri de inveja dela, nunca ninguém escreveu um poema de amor para mim, assim tão simples e tão bonito. “Cais de minha vida”... Isso é lindo!
             Meu antídoto para tanta desgraça.
            Hoje comprei um livrinho novo da Heloisa Seixas, que eu amo. Chama-se “agora e na hora”, é um romance, da Companhia das Letras. Se for tão bom quanto estou tomarando (do verbo tomarar, que vem de tomara, desejo, desejando, entendeu?), escrevo para você contando minha opinião.
            Beijo grande
                                    da sempre sua
                                                                                    Suzete.