terça-feira, 22 de outubro de 2013

As imagens e as palavras


No caderno Ilustrada da Folha, no último domingo (20/10), Ferreira Gullar publicou a crônica A magia da imagem (1), título que sugere algo aparentemente batido, repetitivo, exaurido mesmo, embora verdadeiro: a força da imagem. Ele começa falando da necessidade do homem pré-histórico em pintar bisões cravejados de flechas nas paredes das cavernas, talvez para que as caçadas tivessem êxito. Ou seja, imagem e realidade unindo-se em uma única representação, dando origem à Arte.
            Às tantas, o poeta afirma: “Esse universo de significações, no entanto, não se contenta com a expressão visual das formas, das imagens. Ele necessita decifrá-las, traduzi-las na linguagem das palavras. Mas como disse Ernst Cassirer, as linguagens são intraduzíveis entre si, ou seja, o que a imagem diz, a palavra não consegue dizer.”
            Eis a contradição interessantíssima: a necessidade humana de interpretar imagens e, ao mesmo tempo, a impossibilidade de fazê-lo.
            O que me remete imediatamente a Arthur Bispo do Rosário e sua obra indecifrável. Falo especialmente das peças em que repetição de objetos comuns, prosaicos, banais, causam no expectador o indizível impacto, a impossibilidade do entendimento, a falta de sentido.
            Num primeiro momento, o expectador associa esta falta de sentido à reconhecida loucura do autor. Num segundo momento, e esta é a ideia que prevalece hoje em dia, percebe-se que há algo mais além da loucura, ou que a loucura por si só não explica a obra de arte.
O expectador “sofre” em silêncio o impacto da imagem, sem ter o que dizer, sem saber o que pensar, diante do objeto que se lhe é apresentado. Chega a doer na alma.



 









Gullar acrescenta mais adiante: “Isso não significa, porém, que a expressão vocabular seja um exercício descabido e inútil. Pelo contrário, por ser também uma linguagem autônoma, a palavra cria significações – leituras – que se somam à expressão visual das imagens. Nesse sentido, o texto crítico, analítico ou poético sobre uma obra de arte pode de certo modo incorporar-se a ela, não como tradução da obra, mas como interpretação que a enriquece.”
Quando o homem dedica-se ao estudo da História da Arte – as imagens e as palavras lado a lado –, é precisamente isso que ele busca, enriquecer-se a partir das diferentes leituras das obras de arte, que são dinâmicas e mudam com o passar do tempo e com os diferentes modos de ver e pensar a própria arte.