Raduan Nassar, que acaba de
completar 80 anos, ganha o Prêmio Camões e vai receber 100 mil euros.
Autor das obras-primas Lavoura Arcaica (1975), Um
Copo de Cólera (1978) e Menina a caminho (contos), Nassar há muito se retirou da vida literária.
O leitor menos avisado pode perguntar: apenas três obras e
ganha um prêmio desses? Mas Lavoura Arcaica é um livro tão extraordinário, que
bastava para todos os prêmios!
Assim tem início o romance:
“Os
olhos no teto, a nudez dentro do quarto; róseo, azul ou violáceo, o quarto é
inviolável; o quarto é individual, é um mundo, quarto catedral, onde, nos
intervalos da angústia, se colhe, de um áspero caule, na palma da mão, a rosa
branca do desespero, pois entre os objetos que o quarto consagra estão primeiro
os objetos do corpo; eu estava deitado no assoalho do meu quarto, numa velha
pensão interiorana, quando meu irmão chegou pra me levar de volta; minha mão,
pouco antes dinâmica e em dura disciplina, percorria vagarosa a pele molhada do
meu corpo, as pontas dos meus dedos tocavam cheias de veneno a penugem
incipiente do meu peito ainda quente; minha cabeça rolava entorpecida enquanto
meus cabelos se deslocavam em grossas ondas sobre a curva úmida da fronte;
deitei uma das faces contra o chão, mas meus olhos pouco apreenderam, sequer
perderam a imobilidade ante o vôo fugaz dos cílios; o ruído das batidas na
porta...”
Os seguintes brasileiros já foram vencedores deste prêmio:
João Cabral de Melo Neto (1990), Rachel de Queiroz (1993), Jorge Amado (1994),
António Cândido (1998), Autran Dourado (2000), Rubem Fonseca (2003), Lygia
Fagundes Telles (2005), João Ubaldo Ribeiro (2008), Ferreira Gullar (2010),
Dalton Trevisan (2012) e Alberto da Costa e Silva (2014).