sexta-feira, 4 de julho de 2014

Alemanha, França e feijoada


              A Alemanha começa o jogo com mais posse de bola, a bola de pé em pé, como se diz. A torcida chega a vaiar.
            Com menos de 10 min de jogo a França ataca e com chute perigoso de Benzema ameaça a meta alemã, e equilibra a partida.
            (É um jogo de xadrez disputado por 22 jogadores e 2 técnicos.)
            Aos 12 min, gol da Alemanha, após cruzamento sobre a área e cabeçada certeira de Hummels.
            Depois do gol o jogo fica feio, cheio de faltas, amarrado no meio campo.
            A Alemanha segue dominando e aos 33 min o ataque francês é barrado pelo monstro Manuel – isso é lá nome de goleiro alemão?
            Termina o primeiro tempo com equilíbrio entre os dois times, com predomínio das defesas sobre os ataques.
O segundo tempo começa amarrado, a França ataca um pouco mais, enquanto a Alemanha espera por um contra-ataque. Aos 15 min, cabeçada perigosa da França e defesa de Manuel.
            ...
            Quando acordei, ainda sob o efeito de uma ótima feijoada, com direito a caipirinha e tudo, soube que a Alemanha estava classificada para as semi-finais.
Agora vamos ver o Brasil contra a Colômbia...

O sucesso da Copa!


              Vencida a fase de grupos, iniciado o chamado mata-mata, podemos afirmar sem medo de errar que esta Copa do Mundo é um sucesso! Dois aspectos podem ser considerados, um objetivo e outro subjetivo.
            Os jogos têm sido ótimos em sua grande maioria, sob o ponto de vista técnico. O treinador do time russo, italiano de larga experiência, declarou que “nunca viu uma copa como esta”. As seleções jogam ofensivamente, não há retrancas, são raros os zero a zero. Até mesmo quando os times não apresentam um nível ótimo, os jogos são movimentados, prendem a atenção do torcedor pelo entusiasmo e empenho dos jogadores.
            Os estádios, de Manaus a Porto Alegre, sempre lotados, são um espetáculo a parte, com a torcida colorida do mundo inteiro. Se os dois times são estrangeiros, os autóctones escolhem um deles para torcer, geralmente o mais fraco, o que acaba por animar o jogo.
            Episódios tristes não poderiam faltar, ou não seríamos todos humanos. O pior deles até agora foi a surpreendente mordida do uruguaio Suárez, contumaz mordedor, agora sabemos. Ora, quase todas as crianças passam pela fase das mordidas, não se trata de algo estranho à espécie, seja por causa da freudiana fase oral, seja porque se trata da arma mais eficiente de que dispõem as crianças, com poucos recursos físicos para o ataque e defesa. Agora, se o sujeito não cresceu, se não sabe lidar com sua agressividade, se não pode controlar certos impulsos, melhor buscar tratamento adequado. (Pobres terapeutas...)
            Até mesmo os times eliminados após a fase de grupos perderam com dignidade, pois perder faz parte do jogo, um clichê verdadeiro. Talvez a seleção russa pudesse ter brigado um pouco mais no último jogo contra a Argélia. Portugal, se acreditasse mais, poderia ter feito 4 gols em Gana. De modo geral os resultados foram justos, os classificados para a segunda fase fizeram por merecer. Ah!, e os goleiros têm brilhado!
            Muito mais poderia ser dito a respeito dos jogos e jogadores, deixo para os comentaristas em suas mesas redondas, pois é disso que eles vivem. O que desejo acrescentar diz respeito aos aspectos subjetivos do futebol, pois eles existem, inegavelmente. Trata-se do jogo fora das quatro linhas (nem é preciso dizer que adoro o jargão futebolístico; desde menino penso em publicar um dicionário do futebol, dirigido àqueles que não possuem familiaridade com as expressões utilizadas pelos narradores, como o drible da vaca, gol espírita, gol olímpico, chapéu, chaleira, bola passada na caneta, elástico, frango, carrinho, banheira, bater roupa pelo goleiro, matar a bola, mão de alface, tapetão, folha seca, bola no ângulo, furada – furar o quê, o vento? – enfim, só esta riquíssima linguagem já seria motivo de grande respeito e admiração pelo futebol, e que ocorre, naturalmente, fora dos gramados.)
            Como explicar que um simples jogo, com poucas regras, diga-se de passagem, seja capaz de despertar tamanha paixão mundo afora? Não são poucos os estudos psicológicos, antropológicos e sociais tentando desvendar este mistério. A origem da minha paixão, esta eu sei explicar. Dos 7 aos 17 anos eu jogava bola todos os dias! Nossa casa, no interior de São Paulo, ficava ao lado de um lindo campinho de futebol, margeado por um ribeirão, e bastava pular o muro e ganhávamos – eu e meu irmão – um mundo de fantasia. A ótima escola onde fizemos o segundo grau, com o pomposo nome de Instituto de Educação Conselheiro Rodrigues Alves, tinha sua quadra de futebol ainda de terra batida, os joelhos e cotovelos permanentemente ralados. Estudávamos pela manhã; terminadas as aulas, íamos para casa almoçar, havia um descanso forçado (pela mãe) de trinta minutos, e lá estávamos novamente na escola, para o diário futebol de todas as tardes, para desespero da progenitora, que reclamava da falta de tempo para os estudos.
Para mim, futebol tem o puro gosto do que de melhor vivi na infância.
            

Morre um poeta




             Há quem afirme que quando morre um poeta uma estrela se apaga no céu. Penso que as estrelas se apagam independentemente do que ocorre nesse pequeno planeta que habitamos, mas é sempre triste a morte de um poeta, pois o mundo torna-se mais concreto.
            Ontem morreu Ivan Junqueira, poeta, ensaísta, crítico literário, tradutor de primeiríssima qualidade.
            Vou a minha estante de poesia e retiro um pequeno livro com o delicioso título de A sagração dos ossos (Civilização Brasileira, 1994). O prefácio é de Antônio Carlos Secchin e tem uma bela abertura: “Entre mortos e feridos, salva-se ninguém. Com efeito, é de perdas e dissipações que se ocupa este livro de Ivan Junqueira, e não será exagero afirmar que, na muito intensa e pouco extensa poesia do autor, A sagração dos ossos representa a culminância de temas e formas obsessivamente trabalhados ao longo de mais de trinta anos de exercício criador”.
            Pois é deste livro que retiro certo poema, que transcrevo como singela homenagem ao poeta Ivan Junqueira.

E se eu disser

E se eu disser que te amo – assim, de cara,
sem mais delonga ou tímidos rodeios,
sem nem saber se a confissão te enfara
ou se te apraz o emprego de tais meios?
E se eu disser que sonho com teus seios,
teu ventre, tuas coxas, tua clara
maneira de sorrir, os lábios cheios
da luz que escorre de uma estrela rara?
E se eu disser que à noite não consigo
sequer adormecer porque te agarro
à imagem que de ti em vão persigo?
Pois eis que o digo, amor. E logo esbarro
em tua ausência – essa lâmina exata
que me penetra e fere e sangra e mata.

            Morre o poeta, fica a poesia.