quarta-feira, 9 de maio de 2018

Catálogo de perdas

Aos amigos
Sergio e Suzete



            Para mim o slogan está certíssimo: livro é o melhor presente. Meu amigo Sergio Pripas pensa o mesmo e brindou-me com belo volume de sugestivo título: Catálogo de perdas, com textos curtos de João Anzanello Carrascoza e fotografias de Juliana Monteiro Carrascoza, da SESI-SP Editora, 2017.
            De início, confesso que o título me assustou. É tão difícil lidar com perdas, o que precisamos fazer inevitavelmente durante a vida inteira, e agora um catálogo! Será que vou reviver a perda de meu amigo Camões, York que me acompanhou durante 17 anos e de quem ainda sinto muita falta?
            Na Exposição de motivos, espécie de prólogo, os autores escrevem:

“Não há experiência mais dolorosa que a perda. A história de cada um se desdobra no tempo e carrega à sua sombra uma coleção de ausências. Coleção que só se amplia ao longo da vida. Este livro reúne relatos de perda simbolizada sempre por um objeto e também representada em fotografia – registro visual da relação partida. Nossa pequena contribuição para o imenso museu de dores que é a história da humanidade.”

            A elegância de estilo mostra-se já neste prefácio! Mas há um pequeno conto, Chapinha, que desejo transcrever aqui, para demonstrar que até mesmo a perda pode ser tratada com humor. Vejamos:

         “Do tipo que engana, ele. Igual a muito cabelo que já penteei. Parece lisinho, suave, mas logo a gente percebe, ao tocar outros, que é fio grosso.
        Me elogiou quando cortei seu cabelo pela primeira vez.
– Encontrei a cabeleireira dos meus sonhos – disse.
Continuou elogiando, não só a minha habilidade com a tesoura, mas meu sorriso, minha pele morena, meus olhos verdes. 
E eu sempre encrespada com os homens, amores complicados como pixaim.
De elogio em elogio, ele me amaciou. Seis meses de namoro. Dois de casamento.
Aí me mandaram aqueles e-mails que ele trocou com a fulana.
Arrepiei, a raiva em pé.
Cheguei em casa, ele dormindo de shorts no sofá. Tesoura, não, óbvio demais. Queimei-o com a chapinha.” 

            (Sei que Suzete vai morrer de inveja, mas o que posso fazer se o Carrascoza é bom como o diabo!)       
            Ao abrir a página dupla após o conto, o leitor depara-se com a bela fotografia.


            Um belo livro, sem dúvida.