Querido André,
faz tempo que não lhe escrevo, eu sei, é que ando trabalhando muito, porém feliz como sempre com meu trabalho – que todos conhecem e reconhecem, aqui no salão, na cidade, aqueles que leem seu blog –, cortar cabelo de homem.
O número de clientes aumentou muito! Você não faz ideia, a dona do salão está marcando hora para o corte, senão dá briga na fila. E sabe por que? Por causa da Copa da Rússia e dos cabelos dos jogadores de todo o mundo!
Não é só o nosso Neymar; são ingleses, dinamarqueses, japoneses, suecos, russos, senegaleses, todos os africanos, os europeus, os sul-americanos, sem contar os próprios brasileiros, todos disputando quem tem o corte mais original. Ou mais horroroso.
E tem também os filhos dos jogadores, e, por imitação, todas as crianças da cidade pedindo cortes iguais aos dos jogadores. Chegam a me trazer fotografias, Moça, corta igual ao Paulinho!
Virou epidemia!
E eu corto. O cliente pede, eu corto. Os pais pedem, eu corto. Quando é a criança que pede, exijo autorização por escrito do pai ou da mãe, que não sou doida. Quanto mais feio é o resultado, mais eles gostam. Outro dia saiu um marmanjo daqui parecendo que carregava um gambá na cabeça. Com rabo e tudo.
André, encontrei na Internet essa fotografia do vilão do filme O último dos Moicanos (bem antigo, não!), certamente um personagem inspirador. As crianças adoram!
Há os que pedem máquina zero, Moça, raspa tudo, Mas seu cabelo é tão lindo, Moça, raspa tudo, que nem o Fernandinho. Fazer o que, eu raspo.
Virou moda!
E moda é coisa séria! Você não vive dizendo que futebol é coisa séria? Pois moda também é. Moda é moda, não é preciso explicar. E por isso vou cortando cortando cortando, eu não critico, aliás, estou ganhando um bom dinheiro com isso. Quem sabe vou conhecer Nova Iorque com esses extras!
Como tudo que é moda, há de passar. Então voltaremos aos cortes tradicionais sérios comportados (adoro copiar suas manias, como esta de dispensar as vírgulas), cortes de bons-moços, talvez a valorizar muito mais o que vai dentro da cachola do que aquilo que a enfeita.
Você costuma dizer e repetir que “tudo é uma questão de Educação”, não é mesmo? Você não acha que falta conteúdo craniano aos jogadores brasileiros? A maioria deles nem sabe falar, André. Tudo faremos para alcançar a vitória, Daremos tudo de nós, Darei tudo de si, Vamos virar o placar no segundo tempo, Faremos o que o professor mandar, as entrevistas antes, no intervalo e depois do jogo são sempre as mesmas, todos olhando para o vazio como se robôs fossem, automáticos vazios enfeitados com brincos de diamantes e cabelos estrambóticos.
Vou lhe confessar uma coisa que nunca tive coragem de confessar: uma vez namorei um jogador de futebol! Por 3 dias. No primeiro dia, a novidade, a curiosidade; no segundo dia, o espanto; no terceiro, dei-lhe um pontapé na bunda. Com todo respeito aos jogadores, gente como a gente. Mas bem que eles podiam estudar um pouco, ler quando não estiverem treinando ou jogando, educar-se um pouco mais. (Acho que isso vale para jogadores de futebol e presidentes da república.)
Bem, isso não é da minha conta. Meu ofício é cortar cabelo de homem, jogador de futebol ou não.
São estas as novidades. Você, querido amigo, como vai? Não demore para enviar notícias suas.
Fico por aqui, receba um grande beijo.
Da sempre sua,
Suzete.