quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Contos e contistas




Tenho um amigo inteligentíssimo que diz, em tom de mofa troça galhofa – e com isso ele deseja diminuir a importância da literatura nacional –, que o Brasil é um país de contistas. A canadense Alice Munro, recém ganhadora do Nobel de Literatura, é considerada uma especialista: ao que me consta, publicou quinze livros de contos, e com eles foi laureada!
            Vai longe a discussão sobre a importância/relevância do conto e a do romance na Literatura. Quando se trata de um cânone como Machado de Assis, fica fácil tecer os mais rasgados elogios a um e outro gênero. O homem era um mestre em ambos. Mas quando se fala, por exemplo, em Dalton Trevisan (que salto no tempo!), fica claro que estamos a falar de um contista, também um mestre no gênero dos curtos.
            Desde logo advirto, não sou especialista, sou apenas um apaixonado leitor, de tudo que é bem escrito, especialmente em língua portuguesa. (De alguns anos para cá, raramente leio uma tradução.) E como amador irresponsável, vejo com ótimos olhos a contemporânea publicação de contos em nossa literatura. Não é à toa que proliferam as antologias dos “melhores” contos brasileiros. (Infelizmente, muitas vezes fica evidente apenas o interesse comercial em tais publicações.)
            Nelson de Oliveira compilou os escritos da Geração 90 – manuscritos de computador (Boitempo, 2001). Gente de peso, como Marçal Aquino, Fernando Bonassi, Rubens Figueiredo, Marcelino Freire, Marcelo Mirisola, Luiz Ruffato, para citar alguns deles. Em seguida, este antologista publica  Geração 90 – os transgressores (Boitempo, 2003), com textos especialmente escritos para esta antologia.
Mais recentemente, o mesmo Nelson publicou Geração zero zero – fricções em rede (Língua geral, 2011), incluindo os ficcionistas que surgiram na primeira década do século 21: João Filho, Andréa del Fuego, Daniel Galera, Lourenço Mutarelli, José Rezende Jr, muitos deles postando sua produção na Internet, de onde se tornaram conhecidos antes mesmo da publicação em livro. Em tempo, José Rezende Jr. publicou o interessantíssimo Estórias mínimas (7 letras, 2010), coletânea de microcontos cabíveis no Twitter. (O autor deste blog nutre particular predileção pelos microcontos, e os cultiva sempre que uma boa ideia lhe surge no bestunto.)
Em 2012, o número 9 da prestigiosa revista Granta (em português), consagrada internacionalmente, teve como título Os melhores jovens escritores brasileiros (Ed. Objetiva), trazendo nomes como Michel Laub, Laura Erber, J.P.Cuenca, Luisa Geisler, Ricardo Lísias, Tatiana Salem Levy.
Há três autores, nem tão conhecidos assim, que gostaria de citar individualmente, pela qualidade excepcional de seus textos: Ronaldo Cagiano, com Dicionário de pequenas solidões (Língua geral, 2006); Cesar Cardoso, com As primeiras pessoas (Oito e meio, 2012); e Paulo Sergio Viana, com Fica limpo! – quase heresias (Perse, 2012).
A lista de antologias e de autores avulsos que se dedicam ao cultivo do conto é interminável, mas não posso deixar de citar a minha preferida: Mar de Histórias – antologia do conto mundial, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira e Paulo Rónai (Nova Fronteira, a primeira edição em 1945, e a terceira em 1980). No prefácio, os autores levantam a questão:

“Que é, afinal, o conto? A etimologia da palavra sugere de pronto a primeira resposta: o que se conta. Mas nem tudo o que se conta é conto.”

Aurélio e Rónai buscam uma definição para o conto, no intuito de diferenciá-lo do romance, da novela, e concluem:

“Em razão de sua indefinibilidade, suas flutuações constantes, suas possibilidades inesgotáveis, sua incessante diferenciação, o conto é, pois um gênero típico que se renova sem cessar.”

Melhor conceito não pode haver! E, penso eu, a produção da literatura brasileira contemporânea atesta essa constante renovação. Se chegamos ao Nobel ou não, esta é uma outra história.
            

impossibilidade



manacá florido
pena, perfume não cabe
dentro do haicai

Foto: A.Vianna, out. 2012, Brasília.

Tibouchina mutabilis

A foto do dia.


O manacá-da-serra daqui de casa!

Foto: A.Vianna, out.2012, Brasília.