O filme rodava já há uns cinco minutos quando um sujeito senta-se a
duas cadeiras do meu lado esquerdo. Ele não vai entender nada, pensei. Pois é, Every thing will be fine, título
traduzido literalmente para Tudo vai ficar bem, é um desses filmes que você precisa ver desde o começo, ou terá
dificuldade para acompanhá-lo.
O diretor dispensa comentários, é o
alemão Win Wenders. Depois de alguns filmes documentais, ele se entrega à
ficção. E o resultado é muito bom. Nota-se perfeitamente a mão de um diretor
competentíssimo em várias passagens do filme.
O tal início que você não pode
perder, não vou revelá-lo aqui, em respeito ao futuro expectador, o que torna
bem mais difícil escrever esta crônica. Trato apenas da essência do filme, os
modos de viver o luto.
O tema interessa a todos nós, que
perdemos desde que nascemos e continuamos a perder ao longo da vida, até a
morte, a perda de nós mesmos. Aprender a viver com as perdas, eis um dos
fundamentos da Sabedoria.
Pois o filme mostra pelo menos
quatros maneiras diferentes de lidar com o luto, através das histórias dos
respectivos personagens. O primeiro deles, o protagonista, é um escritor que
luta em busca do reconhecimento, com altos e baixos após o trauma inicial.
Arrisco dizer que a escrita funciona para ele como uma forma de terapia
(trata-se de um ponto de vista muito pessoal, um aspecto discutido com
frequência neste blog); nos piores momentos da vida, ele não desiste da escrita,
e certamente se beneficia dela, a despeito do esforço para realizá-la. (Nada se
consegue sem esforço.)
Sua noiva, embora não tivesse
sofrido as consequências do acidente inicial, lida mal com a quebra da relação
entre eles. Numa cena interessante, anos depois, casada e com filhos, ao
encontrar o escritor num teatro, agride-o com dois retumbantes tapas na face.
A mãe, estrelada pela exótica
inglesa Charlotte Gainsbourg, a maior vítima de todo o enredo, nos dá uma lição
de vida, de como enfrentar uma perda insuportável, e superá-la tanto quanto
possível.
O quarto personagem, um menino
pequeno que cresce ao longo do desenrolar da trama, tem sua atuação já no
difícil período da adolescência, e é aquele que vive a perda com maior
dificuldade, beirando a doença mental.
Ao final, como sugere o título, tudo
fica bem. Ou seja, a vida prossegue, como a vida de todos nós, com uma
quantidade de frustrações sempre muito superior a de alegrias e realizações.
Esta última frase não está no filme, está na vida.