segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Vermelho e amarelo

Da série Fotominimalismo



Foto: AVianna, dez 2017, jardim

Ateismo e espiritualidade

Lá vem Luiz Felipe Pondé, espumando ironias e sarcarmos, desde o título de sua crônica Quem ainda crê que ser ateu implica querer comer criancinhas?, nesse primeiro dia do ano de 2018.
            Diz ele que o tema do ateísmo não lhe interessa (embora trate dele ao longo de toda a crônica), muito menos as “provas” da existência de Deus. Fala dos ateus chatos, dos que têm raiva de Deus, daqueles que insistem em dizer que são bons cidadãos.
            E continua espumando, demolindo com crueza impiedosa as crenças mais comuns a respeito do que é ser ateu ou ser religioso.
            De repente o texto muda de direção (o autor já expeliu quase toda sua bile) e torna-se interessante:
“Independentemente dessas questões risíveis, creio, sim, ser possível um ateu ter vida espiritual, claro, se você não associar "vida espiritual" a vida religiosa institucional. A questão que normalmente soa estranha é que a espiritualidade parece nos levar diretamente a Deus ou similares. Mas isso não é, necessariamente, uma verdade evidente.”
Pondé ampara-se no darwinista Edward O. Wilson ("The Meaning of Human Existence", 2014), que defende a ideia de uma espiritualidade ateia, associada à “indagação acerca do significado último da existência humana”.
Tal indagação surge em momentos em que a vida parece não fazer sentido, como nas grandes perdas.
A espiritualidade lida com indagações como essa. Afirma Pondé: “As religiões respondem a questões como essa, costumeiramente, oferecendo práticas (leituras, rituais, liturgias e narrativas cosmológicas) que respondem à indagação acerca do sentido da vida e do sofrimento. A espiritualidade estaria ligada a questões de sentido da existência, mas não, necessariamente, dependentes de crenças em divindades.”
E nosso articulista filósofo conclui: “Não há um sentido último da existência humana a não ser enfrentar essa contingência absoluta a partir dos meios (frágeis, sim) de que dispomos para enfrentar um universo que nos devora a cada minuto. Esse sentido passa pela busca de compreender (cientificamente) este universo e lidar com ele. O darwinismo nos ensina que a existência é uma batalha sem fim cujo sucesso não é garantido. [O grifo é meu.] O darwinismo carrega em si uma cosmologia trágica. Enfim, arrancamos o sentido das pedras.”
Gostei muito desta última frase: é da Natureza, do estudo da formação e evolução do Universo que podemos, com enorme dificuldade e passos de tartaruga, construir algum sentido para nossa existência. A Evolução das Espécies em nosso próprio planeta também nos é de grande valia. São pensamentos que vão do concreto ao quase abstrato, daí a possibilidade de dar a isso o nome de Espiritualismo Ateu.
            Posso pensar que o estudo permanente das Artes em geral e da Literatura em particular ajuda em muito na construção dessa espiritualidade, quer seja religiosa ou ateia.