quinta-feira, 3 de novembro de 2016

J. J. Veiga melhor do que nunca




Registro de duas postagens anteriores:
Em março do corrente ano (2015) este blog registrou o que denominou O renascimento de José J. Veiga, com o relançamento de Os cavalinhos de Platiplanto, pela Companhia das Letras (2015). (http://loucoporcachorros.blogspot.com.br/2015/03/o-renascimento-de-jose-j-veiga.html)
Depois veio A hora dos ruminantes, pela mesma editora. E agora surge o excelente romance Sombras de reis barbudos. Redescobrir um autor como J. J. Veiga nos dias de hoje é uma felicidade inspiradora para a literatura brasileira contemporânea.

            Pois agora o blogueiro retorna ao mesmo autor, para saudar De jogos e festas – Novelas (Companhia das Letras, 2016).
            O volume de Veiga traz três “novelas”, intituladas De jogos e festas, Quando a Terra era redonda e O trono no morro.
            O livro traz ainda um belo Posfácio de José Castelo (J. J. Veiga detestava prefácios...).
            Os três textos são maravilhosos. Quando a terra era redonda, com apenas 8 páginas, é um conto do mais puro realismo fantástico, que poderia fazer parte das melhores antologias do gênero. (Não é o caso de entrarmos na polêmica diferença entre novela e conto. Há quem diga que a novela não passa de conto mais extenso.)
            Mas gostei mesmo de O trono no morro, história comovente de um bando de matadores.
            Às tantas, o chefe do bando interroga um novato, considerado por ele muito magrinho:

“ – Eu comia sim senhor.
 – Comia o que?
 – Arroz. Feijão. Mandioca. Essas coisas.
 – Não comia carne?
 – Asveis.
 – Com a gente você vai comer carne todo dia. Não tendo de vaca, a gente come de porco. Não tendo porco, come queixada. Não tendo queixada, come tatu. Isso no normal. Quando está correndo dos bodes a gente come o que achar, até bunda de tanajura.”

            De jogos e festas é o sétimo livro de Veiga, lançado em 1980. Nessa época o autor já era considerado pertencente à escola do realismo fantástico. Ele mesmo não aceitava esse rótulo, e segundo Castelo, dizia “não passar de uma invenção da crítica literária francesa, sem outros recursos conceituais para classificar os novos escritores latino-americanos que chegavam às livrarias parisienses”.
            Castelo termina seu Posfácio revelando antiga entrevista de Veiga a Edla van Steen, em que o autor fala dos ”elementos fantásticos que constituem a escrita”, tema recorrente neste blog. Segundo ele, “Um escritor nunca escreve o que quer – alguma coisa se interpõe entre ele e as palavras e toma o controle da ação. A coincidência entre o pretendido e o conseguido é impossível.”
            O Louco arremata: não temos mesmo controle sobre nosso inconsciente.