terça-feira, 5 de março de 2019

Bom uso do palavrão


Em sua crônica de hoje para a Folha de S.Paulo (5.mar.2019), Qual crime?, Hélio Schwartsman aproveita o desmoronamento da barragem em Brumadinho para fazer a distinção entre homicídio culposo e homicídio doloso.
Escreve ainda sobre a figura do dolo eventual, “que ocorre quando o acusado, embora não desejasse a morte da vítima, assume o risco de causá-la, revelando verdadeiro desprezo por sua vida”. Ao explicar a diferença entre dolo eventual e culpa consciente, Schwartsman utiliza-se do palavrão, pelo que pede desculpas antecipadamente.
            Eis o excelente parágrafo do articulista:

“Imagine um cidadão de bem, armado, que quer dar um susto no ladrão, atirando em sua direção. Se ele tem consciência de que pode acertar um órgão vital e matar o bandido, mas diz "foda-se" e atira, temos dolo eventual. Se, ao contrário, depois de atirar e matar o gatuno ele exclamar "fodeu", ocorre a culpa consciente. Brumadinho parece mais um caso de "fodeu" do que de "foda-se".”

            A palavra em questão não tem uso corrente nos principais jornais do país, todos com seu Manual de Instruções aos respectivos jornalistas. Schwartsman tem autoridade moral para registrá-la, e o faz com propriedade.
            Repito uma pequena história pessoal, que me marcou para a vida inteira. Tive ótimo professor de português no ginásio e científico (era assim que se chamava, naqueles idos de 50), tratado por Seu Afonso, e que dizia enfático, As palavras são criadas para serem usadas adequadamente, uma bela menina possui lábios, mas o demônio tem beiço.
            O foda-se do Schwartsman é para a vida toda.