quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Gosto se discute?


O beijo, de A. Rodin (1901-04)


O beijo, de C. Brâncusi (1907-08)

Diante das duas esculturas mostradas acima, ambas com o título O beijo, a primeira do francês Auguste Rodin (1840 -1917) e a segunda do romeno Constantin Brâncusi (1876-1957), me parece “natural” que eu manifeste a minha preferência pela primeira, e estou certo de que serei acompanhado por muitos.
            Depois da leitura do capítulo O primitivismo na escultura, extraído do livro Isto é arte? – 150 anos de arte moderna do Impressionismo até hoje, de Will Gompertz (Ed. Zahar, 2013), devo confessar que mudei de opinião. Hoje prefiro O beijo de Brâncusi.
            Confesso também meu espanto diante de minha própria mudança! Como ela se processou? Que elementos influenciaram, de forma irreversível, meus sentimentos – porque não há dúvida que se trata de sentimentos – meu modo de ver e sentir estas duas obras de arte, ambas de grande valor, indiscutivelmente.
            Não tenho qualquer pretensão de influenciar quem quer que seja – “Todo convencimento é infrutífero”, afirma Walter Benjamin – mas desejo apenas registrar a importância de se pensar a obra de arte.
Segundo Gompertz, “A posição geral de Brâncusi era clara: o que importava era o resultado final, não o processo de produção. Mas sua abordagem pessoal era a de pôr as mãos na massa. (Em muitas obras, Rodin produzia um modelo e o entregava a artesãos, para que executassem a peça final).
Gompertz continua: “Diferentemente de Rodin, ele [Brâncusi] se incumbia de seu próprio trabalho, e muitas vezes eliminava o estágio da feitura do modelo entalhando diretamente em seu material escolhido – pedra ou madeira – para produzir uma escultura. Essa prática era uma novidade, assim como o retorno a materiais “inferiores” como esses, em vez do método mais tradicional de entalhar mármore ou fazer moldes de bronze. Um dos grandes triunfos da famosa escultura O beijo, de Rodin, foi sua dupla ilusão: um único bloco de bronze que é ao mesmo tempo não só os corpos esbeltos de dois jovens amantes, como a pedra irregular sobre a qual eles se acariciam. Ao produzir seu próprio O beijo, Brâncusi fez uso do mesmo truque, mas de uma maneira muito mais moderna e contudo muito mais arcaica. ...Diferentemente de Rodin, Brâncusi não fez nenhuma tentativa de disfarçar as propriedades físicas da pedra; na verdade, escolheu de propósito uma pedra não polida, por sua superfície áspera. Em seguida entalhou uma representação básica de um casal amoroso do peito para cima. A composição é maravilhosamente simples. As duas figuras estão seladas num beijo, seus braços se abraçando, suas mãos de dedos atarracados enroladas por trás do pescoço uma da outra, puxando-a gentilmente para mais perto.”
            E o crítico Gompertz conclui: “Brâncusi estava desafiando a convenção ao usar materiais inferiores e retratar pessoas insignificantes. Estava também dando a conhecer um manifesto pessoal, que era fazer escultura com a humildade de um artesão, não a altivez de um grande artista. Isso, ele acreditava, permitiria uma relação mais honesta entre artista, objeto e espectador. O abandono da feitura do modelo em favor do entalhe direto em materiais era, disse ele, “o verdadeiro caminho para a escultura”.
            Ainda no ginásio, com 11 anos de idade, ouvi de meu professor de arte Quissak Jr (1935-2001), nascido em Guaratinguetá – SP, ele mesmo um artista, filho do pintor Ernesto Quissak (1891-1960),  a frase que me causou grande impacto à época, deixando marca permanente em meu espírito: “Gosto se discute”.
            Mais tarde ampliei-a para Tudo se discute.