quarta-feira, 26 de abril de 2017

Mário de Andrade sempre



EU SOU TREZENTOS...
(7-VI-1929)

Eu sou trezentos, sou trezentos e cinquenta,
As sensações renascem de si mesmas sem repouso,
Ôh espelhos, ôh Pireneus! Ôh caiçaras!
Si um deus morrer, irei no Piauí buscar outro!

Abraço no meu leito as melhores palavras,
E os suspiros que dou são violinos alheios,
Eu piso a terra como quem descobre a furto
Nas esquinas, nos taxis, nas camarinhas meus próprios beijos!

Eu sou trezentos, sou trezentos e cinquenta,
Mas um dia afinal eu toparei comigo...
Tenhamos paciência, andorinhas curtas,
Só o esquecimento é que condensa,
E então minha alma servirá de abrigo.


Do livro Remate de males
de Mário de Andrade

In:  DE PAULICEIA DESVAIRADA A LIRA PAULISTANA
Ed. Martin Claret, 2017.

(A edição está belíssima, capa dura de muito bom gosto, marcador, cabeceado, folhas de guarda ilustradas, preço adequado.)




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