Dá o que pensar a crônica de ontem do grande Ruy Castro para a Folha de S. Paulo, Dilema do escritório (6 abr 2020). Ele fala da criação dos escritórios, e de como “o mundo melhorou com os escritórios”, embora tenham gerado “afetos, desafetos, intrigas e paixões, com tudo que isso implica —prazer, êxtase, amor, assim como, às vezes, sofrimento, desespero, dor”. Enfim, Ruy Castro fala das consequências das mudanças do comportamento humano diante de uma crise.
E conclui sua crônica: “É o que veremos depois de superado o coronavírus: se o mundo a que voltaremos será o de antes, que nos moldou como somos, ou se será um novo mundo, habitado por pessoas que talvez não reconheçamos de saída e custaremos a entender quem são — nós mesmos.”
Com o isolamento social temos tempo de sobra para pensar. É tanto tempo sobrando que começamos a conjecturar Sobre O Que Virá Depois. Isso faz parte da natureza humana, conjecturar diante do desconhecido, talvez com o intuito de aplacar o medo e a angústia.
Ruy Castro nos apresenta uma inquietante questão: haveremos de nos reconhecer a nós mesmos depois da catástrofe? Espertamente, ele não nos oferece qualquer resposta.
Se a resposta for negativa, é possível que sobrevenham transtornos mentais, mais ou menos intensos conforme os fatores preexistentes. Portanto, a melhor pergunta não é o que virá depois, mas o que podemos fazer hoje para que não venha o pior. Enfim, o que fazer hoje para que Não Deixemos De Nos Reconhecer?
Pensar pensar pensar, manter o aparelho de pensar (Bion) em pleno funcionamento, dormir bem, fazer exercícios físicos, ler bons (?) livros, ouvir boa (?) música, cozinhar a própria comida, informar-se minimamente sobre o que ocorre no mundo, e, dentre outras coisas, escolher duas ou três pessoas que também saibam pensar e conversar – o que não é fácil – e conversar com elas, mesmo que virtualmente, à distância, com certa regularidade. (Digo duas ou três pessoas porque não acredito que haja tanta disponibilidade assim, para quem deseja conversar. Como é difícil conversar, meu deus!)
A qualidade dos livros e da música fica por conta de cada um. Contra a praga das tais redes sociais, recomendo um livro de 700 páginas que prenda o leitor como chiclete. Na música, em função das comemorações dos 250 anos de nascimento de Beethoven, ouvir a obra completa do compositor ocuparia isolamento social de um semestre. Ficam aqui as dicas.
Quanto aos amigos, ah! isso é mais difícil de recomendar...
Muito interessante! A indagação ultrapasse a figura do profissional. Como quero eu levar a minha vida, afinal?
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