Parece que o consumidor está trocando a
leitura em meios eletrônicos pelo bom e velho papel, sugerindo a consolidação
do movimento "slow media". “Se o "slow
food" buscou restaurar o prazer de comer sem pressa e
reabilitar o interesse pela origem dos alimentos, o "slow media"
pretende provocar o mesmo efeito na dieta de informação.”
É o que afirma Ronaldo Lemos, no longo texto “Sereias
digitais, vício em tecnologia e dicas para um uso saudável da internet”, para a
Ilustríssima de ontem (Folha de S.Paulo).
Lemos
informa que Tristan Harris, jovem designer americano, busca promover o uso mais
saudável da internet; para tanto fundou uma organização sem fins lucrativos
chamada Time Well Spent (tempo bem empregado). Sua intenção é "ajudar as
pessoas a libertar suas mentes do sequestro promovido pela tecnologia".
Li,
pois, nesta fria e ventosa manhã de domingo, com grande interesse, o bom artigo
de Ronaldo Lemos, alarmado com certos números: 6% da população mundial já estão
viciados em Internet, o que pode requerer tratamento específico, em clínicas de
reabilitação. (Em tempo, apenas 50% da população mundial têm acesso à
Internet.) Segundo Tim Wu, professor da Universidade Columbia, em seu livro
mais recente The Attention Merchants: The Epic Scramble to Get Inside Our Heads
(Os mercadores da atenção: a luta épica para entrar dentro de nossas cabeças), “há
uma nova e insólita fronteira do capitalismo: a atenção humana, disputada até
nas frações mais ínfimas”.
Passei
o resto do dia pensando na ideia de atenção, em tudo o que nos chama a atenção,
naquilo em que não prestamos atenção nenhuma, quanto do nosso tempo é
desperdiçado com coisas que não deveriam merecer atenção, ou com aquelas para
as quais deveríamos estar atentos e deixamos passar, a cabeça cheia de dúvidas,
muitas perguntas, poucas respostas.
À
noite – que coincidência! – assistimos Paterson, com roteiro e direção de Jim
Jarmusch (2017), filme premiadíssimo em Cannes, Palma de Ouro, melhor diretor,
Prêmio do Júri, etc.
Paterson
é o nome de uma pequena cidade em Nova Jersey e também do protagonista (Adam
Driver), motorista de ônibus, casado com uma linda-mulher-doidinha-de-tudo
(Golshifteh Farahani). Paterson é também poeta, o que faz toda a diferença para
o desenrolar da história. Ah!, há também um buldogue, personagem fundamental, o simpático Marvin.
Paterson não tem celular! Ele é o que
comumente chamamos de desligado, concentrado apenas na poesia dele. A história
começa numa segunda-feira e termina uma semana depois, mas parece que dura pelo
menos um ano, tão devagar e repetitivos transcorrem os fatos. A atenção de
Paterson – ou o que de fato lhe interessa na vida – está voltada apenas para a
poesia. (Isso é realmente extraordinário: um filme sobre poesia!)
(Detalhe
que penso não vai estragar o filme, para quem ainda não o viu: os poemas
apresentados no filme são de Ron Padgett, um dos poetas contemporâneos
preferidos de Jim Jarmusch. Além de permitir que o diretor usasse alguns dos
seus poemas antigos, o autor também escreveu novos poemas especialmente para o
longa. Isso me parece inédito na história do cinema!)
O
casal é amoroso, o filme é delicado, o cão é dedicado, a vida passa devagar, uma homenagem à poesia e à simplicidade das coisas. E nós, os expectadores, prestamos atenção em quê?
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