segunda-feira, 17 de julho de 2017

Paterson e a Atenção




Parece que o consumidor está trocando a leitura em meios eletrônicos pelo bom e velho papel, sugerindo a consolidação do movimento "slow media". “Se o "slow food" buscou restaurar o prazer de comer sem pressa e reabilitar o interesse pela origem dos alimentos, o "slow media" pretende provocar o mesmo efeito na dieta de informação.” 
É o que afirma Ronaldo Lemos, no longo texto “Sereias digitais, vício em tecnologia e dicas para um uso saudável da internet”, para a Ilustríssima de ontem (Folha de S.Paulo).
            Lemos informa que Tristan Harris, jovem designer americano, busca promover o uso mais saudável da internet; para tanto fundou uma organização sem fins lucrativos chamada Time Well Spent (tempo bem empregado). Sua intenção é "ajudar as pessoas a libertar suas mentes do sequestro promovido pela tecnologia".
            Li, pois, nesta fria e ventosa manhã de domingo, com grande interesse, o bom artigo de Ronaldo Lemos, alarmado com certos números: 6% da população mundial já estão viciados em Internet, o que pode requerer tratamento específico, em clínicas de reabilitação. (Em tempo, apenas 50% da população mundial têm acesso à Internet.) Segundo Tim Wu, professor da Universidade Columbia, em seu livro mais recente The Attention Merchants: The Epic Scramble to Get Inside Our Heads (Os mercadores da atenção: a luta épica para entrar dentro de nossas cabeças), “há uma nova e insólita fronteira do capitalismo: a atenção humana, disputada até nas frações mais ínfimas”.
            Passei o resto do dia pensando na ideia de atenção, em tudo o que nos chama a atenção, naquilo em que não prestamos atenção nenhuma, quanto do nosso tempo é desperdiçado com coisas que não deveriam merecer atenção, ou com aquelas para as quais deveríamos estar atentos e deixamos passar, a cabeça cheia de dúvidas, muitas perguntas, poucas respostas.
            À noite – que coincidência! – assistimos Paterson, com roteiro e direção de Jim Jarmusch (2017), filme premiadíssimo em Cannes, Palma de Ouro, melhor diretor, Prêmio do Júri, etc.
            Paterson é o nome de uma pequena cidade em Nova Jersey e também do protagonista (Adam Driver), motorista de ônibus, casado com uma linda-mulher-doidinha-de-tudo (Golshifteh Farahani). Paterson é também poeta, o que faz toda a diferença para o desenrolar da história. Ah!, há também um buldogue, personagem fundamental, o simpático Marvin.
            Paterson não tem celular! Ele é o que comumente chamamos de desligado, concentrado apenas na poesia dele. A história começa numa segunda-feira e termina uma semana depois, mas parece que dura pelo menos um ano, tão devagar e repetitivos transcorrem os fatos. A atenção de Paterson – ou o que de fato lhe interessa na vida – está voltada apenas para a poesia. (Isso é realmente extraordinário: um filme sobre poesia!)
            (Detalhe que penso não vai estragar o filme, para quem ainda não o viu: os poemas apresentados no filme são de Ron Padgett, um dos poetas contemporâneos preferidos de Jim Jarmusch. Além de permitir que o diretor usasse alguns dos seus poemas antigos, o autor também escreveu novos poemas especialmente para o longa. Isso me parece inédito na história do cinema!)
            O casal é amoroso, o filme é delicado, o cão é dedicado, a vida passa devagar, uma homenagem à poesia e à simplicidade das coisas. E nós, os expectadores, prestamos atenção em quê?


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