Afirma Ruy Castro em sua crônica de hoje na
Folha, Intimidade essencial, que “60,1% dos alunos de português da 5ª série da rede pública
estão abaixo do nível de rendimento que se considera minimamente adequado. Aos
10 anos de idade, são incapazes de identificar o personagem principal de uma
narrativa simples ou reconhecer o assunto de uma reportagem. E, aos 14 anos,
76,4% dos alunos da 9ª série não conseguem interpretar certas expressões ou
analisar o que um cronista quis dizer com seu texto”.
Todos os
dias lemos nos jornais estas estatísticas macabras sobre o estado da educação
no Brasil, todas elas apontando para um beco sem saída. Porém, Ruy Castro chama
nossa atenção para um outro fato, pertencente ao passado, com o qual concordo
plenamente, porque também fui vítima (ou beneficiário) dele:
“Minha
geração sofreu com o gramatiquês obsessivo de muitos professores de português,
mais preocupados com a "pureza" da língua do que com a discussão
sobre os escritores que realmente diziam coisas. À falta desse estímulo, os
próprios garotos se encarregavam – uns torciam por Jorge Amado, outros, por
Graciliano Ramos; eu lia Nelson Rodrigues e achava muito melhor.”
No ginásio
e científico – estas as denominações da época – tive um excelente professor de
português, Afonso o seu nome, conhecido como Seu Afonso, que marcou
definitivamente minha adolescência e a de meu irmão Paulo (hoje um grande
poeta). Acabei tornando-me professor universitário, também por influência dele.
Éramos
obrigados a decorar um poema toda semana, e ler um livro por mês; mas as
escolhas necessitavam do aval do professor, sempre fiel aos clássicos. Nelson
Rodrigues, por exemplo, era proibido, Isso é subliteratura!, exclamava feroz,
Seu Afonso.
O
importante é que tomamos gosto pela leitura, e anos mais tarde pude devorar
Nelson Rodrigues, fazendo meu próprio julgamento sobre o valor de sua
literatura. O mesmo ocorreu com Jorge Amado e outros autores menos clássicos.
(O que diria Seu Afonso, já falecido, da literatura brasileira contemporânea?
Marcelo Mirisola, jamais!)
O que Ruy
Castro chamou de “gramatiquês obsessivo” também era uma das características de
Seu Afonso. Lembro-me de um exemplo bem mundano enfatizado por ele, Digam uma
colher das de sopa, e não uma colher
de sopa! Fã dos programas de culinária da tv, nunca mais ouvi alguém referir-se
a uma colher das de sopa.
Pois até
mesmo aquela obsessão, aquele rigor excessivo com os aspectos gramaticais da
língua, não foram em vão, penso eu. Esforço-me até hoje, um amador que sou – simples
escrevinhador –, por fazer jus ao Mestre.
Isso mesmo! Saudade do Seu Afonso, um dos intelectuais mais autênticos que conheci. Mesmo com seu radicalismo purista e disciplina férrea...
ResponderExcluirCrianças e adolescentes precisam de disciplina.
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