Um ex-grande amigo, pessoa inteligente e culta, gostava de dizer O Brasil é um país de cronistas! Assim mesmo, com exclamação e tudo. Falava de deboche, ácido crítico que era da “literatura tupiniquim”, palavras dele. Em vão eu brandia nomes como Machado, Graciliano, Mário de Andrade, Drummond, João Cabral, Bandeira, além de Rosa – gênio. De nada adiantava, O Brasil é um país de cronistas...
(Antes de prosseguir: me bate uma tristeza enorme ao escrever as palavras Um ex-grande amigo... Mas essa é outra história.)
O imperdoável era que eu me esquecia de defender o gênero, a crônica, que se tornou tão grande e de tamanha importância, que eu bem poderia torcer a fala do ex-amigo e dizer O Brasil é o berço dos maiores cronistas da literatura universal!
Daí o prazer renovado, com a crônica de Álvaro da Costa e Silva para a Folha de S. Paulo de hoje (29 nov 2021), com o título O talento das cronistas mulheres - Elas escreveram em pé de igualdade com os homens na era de ouro do gênero.
Afirma Silva: “Um mistério da crônica como gênero tipicamente brasileiro é seu frescor. Escritos há mais de 60 ou 70 anos, no improviso e às pressas, textos feitos para o momento e para encher meia página de jornal ou de revista tinham tudo para ser esquecidos imediatamente e virar embrulho de peixe. No entanto, pela sua qualidade, vão ficar para sempre.”
Que linda defesa do gênero ‘tipicamente brasileiro’; a palavra ‘frescor’ é magnífica; escrita nas coxas (expressão autorizada por Sérgio Rodrigues, grande cronista): ‘no improviso e às pressas’; feitas para encher página de jornal’; o destino, ‘embrulhar peixe’; no entanto, tornaram-se imortais!
Silva relembra os nomes de Antônio Maria, Rubem Braga, Vinicius de Moraes, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, José Carlos (Carlinhos) Oliveira, Stanislaw Ponte Preta, os conhecidos “sabiás da crônica”. E enaltece a escrita de mulheres como Clarice Lispector, autora de ótima definição para o gênero: "Vamos falar a verdade: isto aqui não é crônica coisa nenhuma. Isto é apenas".
Cita ainda Rachel de Queiroz, a mais longeva, Cecília Meireles, sempre a brigar pela educação no país, Eneida de Moraes e seu livro "Cão da Madrugada" (1954), Elsie Lessa, 40 anos como cronista de O Globo.
Por que as mulheres haveriam de ser menos brilhantes cronistas que os marmanjos? Eram todas grandes escritoras, e escreviam crônicas. E isso vale para os tempos atuais!
Este meu Louco por cachorros registra até o presente momento 628 crônicas, todas de qualidade mais que duvidosa, e que jamais se eternizarão. Mas que prazer eu sinto em escrevê-las, sempre nas coxas, e que não servirão nem para embrulhar peixe.
A propósito, gosto mesmo é de escrever cônicas esportivas, quase todas sobre futebol, e que não servirão nem para embrulhar gambá-morto-que-vai-pro-lixo.
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