Depois de ver quatro vezes seguidas o filme de 12 min 58 seg, sinto imperiosa necessidade de escrever sobre ele; não penso que esteja fazendo um spoiler, pois o que realmente importa é o que ficará na mente de cada um que o assistir. Cada um ficará com seus próprios sentimentos e ideias sobre o que acabou de ver.
À primeira imagem percebemos que se trata de uma aula para jovens aprendizes de teatro ou cinema; no centro da roda, uma moça imita um felino selvagem, ao rastejar pelo chão. Ao final ela é aplaudida, mas a professora pede mais empenho.
Corte na cena: a sala será ocupada por outra classe, e o grupo se desloca para o andar de cima. No corredor, Jonathan (Jonathan Ajayi), o único negro do grupo, é convidado por alguns colegas, aparentemente de classe sócio-econômica superior, para uma festa, e denota certo desconforto. Os colegas afirmam que ele não precisa se preocupar com as despesas, que ficarão por conta deles. Além do que haverá uma moça muito interessada em conhecê-lo, e a fotografia dela no celular é mostrada a Jonathan. O desconforto dele agora é patente, ao ser tratado como objeto, foco até de curiosidade.
Em seguida dois colegas lhe oferecem um papel em certo roteiro, que vem a calhar com sua pessoa, que será muito valorizada pelo texto. Jonathan segue cada vez mais desconfortável, bastante desconfiado e inquieto, diante da tentativa de manipulação francamente racista. Por quê o papel há de servir para um ator negro? (Não consegui ler o texto mostrado no filme, que parece indicar que o personagem seria um bandido.)
Sentados no chão, formando uma roda, tem início o próximo exercício. A aluna passa uma cartola contendo baralho com figuras de animais. A colega retira carta com a figura de um esquilo e o representa. Agora é a vez de Jonathan; ele fecha os olhos e retira uma carta; a reação de contrariedade é imediata, o semblante se fecha, a perturbação é mais que evidente; a carta mostra a figura de um macaco.
Talvez Jonathan não faça representação alguma, tamanha sua contrariedade. O grupo aguarda, apreensivo; a professora pergunta se está tudo bem. A dúvida sobre o que virá em seguida toma conta igualmente do expectador que vê o filme.
Até que a atuação de Jonathan tem início. Lentamente ele se curva, fecha os punhos e os apoia no chão, com forte ruído. Urros guturais impressionantes são emitidos, à medida que o ator caminha pela sala. A câmera nunca o revela por inteiro, mostra apenas partes desfocadas de seu corpo, sua expressão facial não é revelada, o que potencializa o clima de suspense e mistério.
A câmera passeia pela sala, demora nas expressão de surpresa, aflição, mal-estar, medo, desconforto intenso de todo o grupo, incluindo a professora, que se assusta com um grito mais agudo do “animal”. Aos poucos Jonathan se aquieta, retorna ao seu lugar na roda, o suor pregado em sua testa.
O grupo não volta a ser mostrado, termina o filme. O desconforto persiste em nós.
Acho difícil o curta ser melhor que essa crônica, mas tentarei assistir.
ResponderExcluirHá tempos não assistia algo mais impressionante!!!
ResponderExcluirAchei lindo cinematograficamente.
ResponderExcluirFala do ser humano. Como o ser humano é profundo e complexo. E cheio de possibilidades.
Lembrei de uma cena muito forte mas com outra conotação onde aparece um "homem macaco" que faz uma intervenção. Filme Square" ,sobre o curador de um museu, e a cena se passa em um jantar. Muito perturbadora também.
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