sexta-feira, 27 de março de 2020

Vagalumes




“– Estão enganadas, olhem quantos. Venham para o lado de cá.
Foram então penetrando na mata, às margens do córrego, e conseguiram entrever, num pequeno espaço de tempo entre o crepúsculo e a escuridão total, vagalumes rumarem de ambos os lados do riacho em direção ao centro, desenhando pequenos arcos semelhantes aos das eulálias. Acompanhando as margens até onde a vista alcançava, podia-se divisar os vagalumes movendo-se no ar ao longe, de um lado para outro. Elas não os haviam avistado até aquele momento, porque o mato estava alto e eles voavam baixo, rente à água. Pouco antes do anoitecer, contudo, quando a escuridão no leito rebaixado do córrego não era total e ainda podiam enxergar o mato sob o vento, avistaram em suas margens longínquas, lá onde o regato seguia seu curso, inúmeros pontos de luz piscando de modo desordenado e traçando linhas intermináveis. As luzes misteriosas dos vagalumes pareciam ainda presentes nos sonhos de Sachiko, mesmo de olhos fechados ela podia distingui-las nitidamente. Aquele pequeno instante fora, sem dúvida, o momento mais marcante de toda a noite. Só por ter participado dele, já valera a pena ter vindo. O deleite com vagalumes não era algo tão pitoresco como a festa das cerejeiras em flor. Era, digamos, mais escuro, onírico, possuindo o sabor infantil de um conto de fadas. Quem sabe, este mundo pudesse ser mais bem expresso em música do que em desenho. Era provável que houvesse alguma composição musical, em coto ou em piano, que transmitisse aquela sensação.
            Extasiou-se numa sensação romântica ao pensar que, enquanto estava de olhos fechados em seu leito, uma infinidade de vagalumes flutuava no ar, piscando de um lado para outro na escuridão da noite. Era como se o seu espírito fosse atraído para junto deles e, com o bando, fosse embalado bem rente da superfície da água, ou mais alto...”


            O trecho acima ilustra bem o estilo literário de Jun‘Ichiro Tanizaki, em As irmãs Makioka (Estação Liberdade, 2019), à página 484. O tijolo contém 742 páginas, e cheguei, por ora, apenas até à 500; não resisti e publico no blog o lindo trecho sobre os vagalumes.
            Em meu ponto de vista, trata-se de um livro esplêndido, maravilhoso, que nos põe em contato com um mundo completamente diferente daquele em que sempre vivemos, ao descrever a cultura japonesa do início do século XX. É considerado a obra prima do autor.
            Voltarei a ele assim que terminar a leitura.

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