terça-feira, 13 de março de 2018

Carta ao Amigo


Caro amigo,

não escrevo apenas para agradecer a hospitalidade que me dispensou no último fim de semana enchendo-me de mimos surpresas agrados gentilezas e tantas outras coisas, escrevo principalmente para dizer do meu estado de felicidade naqueles poucos e intermináveis dias, ao comer o pão amassado pelas mãos do amigo, ao saborear o almoço com gosto de carinho feito por A., ao caminhar por entre as sombras de altas árvores na mágica Morená, sempre  festejado pelos cães amorosos, ao parar e apreciar uma flor para mim desconhecida e que é imediatamente nomeada pelo amigo de prodigiosa memória, ambos contando histórias banais entrecortadas por longos silêncios, quando apenas as emoções afloram dispensando palavras, ao ver os filmes que o amigo selecionou para assistirmos juntos e em seguida conversarmos sobre eles, ao receber a atenção de Sua Majestade o Gato, personagem capaz de encher a casa de mistério e silêncio com seu caminhar discreto onipresente em todos os cômodos, guardião da paz e da boa convivência entre todos que habitam aquela casa, incluindo a presença gentil e respeitosa de S., escrevo para agradecer as conversas que tivemos e o tanto que aprendi com elas, pensamentos que ressoam em minha mente diante de experiência tão intensa,  escrevo para agradecer pela amizade de trinta anos que nutrimos um pelo outro e que é capaz de nos proporcionar momentos como os que vivemos no último fim de semana, o que me faz repensar sobre o significado da Amizade, dos sentimentos nela contidos, frutos da extensa convivência, do desenvolvimento da tolerância mútua, da completa aceitação do outro e de nós mesmos, Amizade, palavra que dispensa definições e que requer Silêncio para poder Ouvir o amigo e depois Pensar sobre o que ele disse para só então Responder a ele e estabelecer aquilo que chamamos Conversa, e esta amizade tão intensa chega a dispensar a presença física do outro, pois ao voltar para casa – e como é bom voltar para casa! – os sentimentos permanecem claros vívidos perenes a adoçar nossos dias, a dissipar tristezas, a atenuar as frustrações inevitáveis desta vida, pois o amigo está sempre presente, não há distância para esta amizade, e quando passeio agora em meu próprio jardim é como se ele estivesse aqui comigo, nomeando plantas, admirado com aquelas que ele mesmo me deu e que agora estão crescidas e viçosas, ambos contando histórias banais entrecortadas por longos silêncios, quando apenas as emoções afloram dispensando palavras, e esse dispensar de palavras é que torna possível a Presença Constante Do Amigo Distante, e que, num paradoxo, são essas palavras mesmas que preciso utilizar para escrever esta carta ao amigo, para agradecer a hospitalidade que me dispensou no último fim de semana enchendo-me de mimos surpresas agrados gentilezas e tantas outras coisas...

            

2 comentários:

  1. O louco com fôlego olímpico! Não é fácil um sopro de texto dessa magnitude. Só uma grande amizade para inspirar essa força toda. Um exercício e tanto de explorar os limites do fraseado!

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  2. Linda, linda, linda carta. Escrever eterniza momentos.

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