segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Liberdade de expressão sempre


A Origem do Mundo, de Gustave Courbet (1866)


Não visitei o Queermuseu em Porto Alegre e só por isso relutei em tratar do assunto no blogue. Desde que as obras lá expostas quase que se tornaram de domínio público através da mídia, arrisco aqui meu palpite, em defesa de um certo ponto de vista.
Reações violentas de pessoas conhecidas minhas (para não dizer iguais a mim) e que eu julgava possuírem a mente mais aberta, igualmente motivaram esta minha manifestação.
Repito (incansavelmente) meu bordão: Tudo Na Vida É Uma Questão De Educação.
Informa o IBGE: 92% dos brasileiros nunca visitaram um museu e 93% nunca foram a uma exposição de arte. Daí a primeira conclusão: a exposição Queermuseum (qualquer exposição?) não passou de pérolas atiradas aos porcos. O povo completamente deseducado em matéria de Arte não poderia mesmo presenciar – e tolerar – tamanha provocação.
Eles jamais viram Picasso, Dalí, Klimt, Daumier, Egon Shiele, aos quais chamariam de obscenos, imorais, pervertedores de crianças. Jamais se depararam com A Origem do Mundo, de Gustave Courbet, exposta no Museu d’Orsay, em Paris. (As crianças visitam aquele museu livremente.).
São todas provocações, cada qual em sua época, e o que antes escandalizava, tempos depois já não escandaliza mais. Tal evolução faz parte de um processo civilizatório, no qual a Educação desempenha papel primordial. Intolerância e obscurantismo, muitas vezes exacerbados pelo fundamentalismo religioso, travam o processo civilizatório, buscando manter o homem dentro da caverna, coberto por uma burca.
Obscurantismo e intolerância não vencerão. Uma exposição se fecha, abrem-se cem outras mundo afora. Porque a Arte é necessária, ela alimenta o espírito, desde o tempo das cavernas.
Bem verdade que perdura – provavelmente desde a pintura rupestre – a interminável discussão sobre o que é Arte, e o que não é Arte. Para aqueles que protestaram em Porto Alegre (alguns continuam protestando!), aquilo que viram não era Arte, e eles têm todo o direito a esta opinião: basta que virem as costas e deixem o prédio da exposição. Ou nem lá apareçam. (Se algum deles tiver um blogue, que proteste no blogue!)
Fechar a exposição, NUNCA!
(A primeira apresentação do balé A Sagração da Primavera, de Igor Stravinski, quase não chegou ao final, tantos os apupos, vaias, gritos histéricos, o protesto de uma plateia furiosa e indignada diante de algo novo, muito novo, desconhecido, desconcertante, impossível de ser assimilado e por isso rejeitado a priori. No dia seguinte houve uma segunda apresentação do balé, agora ovacionada pela mesma plateia, recuperada do susto e capaz de enxergar e sentir aquela magnífica obra de arte.)
Estes que protestam diante do Queermuseu, do que é que têm tanto medo? De reconhecer em si mesmos algo que imaginam ver numa pintura ou escultura? A Psicanálise tratou e trata do assunto exaustivamente. Esta é a base do que chamamos Moralismo. Daí para a histeria, é um pulo.
Alguns poucos haveriam de se educar com a exposição Queermuseu – ou com qualquer exposição. Educar-se é penoso processo individual. Você pára diante de um quadro, de uma escultura, ou qualquer outro tipo de manifestação artística, olha, vê, analisa, pensa sobre o que está vendo, permite que fluam os sentidos, resta então uma impressão. Algo permanece impresso na alma. Você pode dizer Gostei! Ou Detestei. Não importa. A impressão está lá, e estará lá para sempre. O conjunto dessas impressões, constantemente acrescido de novas experiências, vai compondo nossa personalidade, nossa compreensão do que significa Arte, ao mesmo tempo que se desenvolve em nós sensibilidade, tolerância e menos preconceito. Vamos nos educando.
E tudo é mesmo uma questão de educação. Para tanto, a liberdade de expressão é fundamental. Cada vez que ela é cerceada, como ocorreu em Porto Alegre, precisamos protestar, em nome da Educação e do Processo Civilizatório.

7 comentários:

  1. Muito bom ,lúcido e claro. Principal : quem não gostou esperneie,proteste, escreva, discuta ou melhor nem vá,mas nunca fechar uma exposição.

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  2. Olha! Estive pensando sobre o assunto e sua análise/resposta ao cerceamento de liberdade ocorrido é perfeito! Exprime exatamente o que penso mas não sabia expor em palavras. Parabéns!

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    1. Que bom, Miledi! Fico feliz com seus comentários no blogue. Abraço e bons vinhos!

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    2. Triste é que ao tentar compartilhar em minha página do facebook, fui cerceado, ou melhor, fomos! Sr. Zuckerberg e suas políticas de seguranças.

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  3. Gostaria de ter escrito esse texto!!!
    Que bom ler um texto de uma mente lúcida e tolerante

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  4. É o velho recurso do totalitarismo: eu não gosto, isso me desrespeita, eu não admito!
    Por trás, um medo tremendo de perder seus pontos de referência do mundo! Quanto mais acanhados esses pontos, mais iminente a tentação do totalitarismo.
    Censura é um perigo! Viva o louco!

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