segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Educar-se segundo Karnal




“Sozinho ou acompanhado, o vinho dialoga e vive com alma. Amo isso, cada garrafa é uma surpresa. É um ser vivo e tem personalidade. Uma taça é um ponto para ver o mundo.”

            Assim termina a excepcional crônica de Leandro Karnal deste domingo (24 set 2017) para O Estado de S. Paulo, com o título Beber e viver. Ele trata de um tema relativamente banal, porém do gosto deste blogueiro, e o autor revela-se mais humano do que nunca, a ponto de enaltecer o ato de beber vinhos.
            Porém, no fundo está falando de Educação!
            Inicia a crônica com a estranheza que sentimos quando nos deparamos com alguém que não bebe. Olhamos para a pessoa e ainda pedimos uma confirmação, Mas você não bebe? Parece-nos à primeira vista um ser de outro planeta. Outro aspecto nos atinge com mais força: o ar de censura moral que paira no ambiente – eu bebo, ele não bebe. Em função desta censura nunca tenho coragem de perguntar Por que você não bebe? Não me atrevo, parece uma invasão de privacidade. Pior, pode ser uma questão religiosa. A curiosidade permanece, no entanto.
            Karnal não fica por aí. Descreve como se educou para chegar a beber – e reconhecê-los – bons vinhos. Depois de enumerar visitas a diferentes vinícolas, acrescenta: “Comprei mais livros. Comecei a participar de uma experiência interessante: dar palestras sobre a História da Borgonha, por exemplo, acompanhado de um sommelier que explicava e servia um vinho borguinhão. As aulas melhoravam a cada rolha extraída.”
            De onde se depreende que, como tudo na vida, beber vinho é um aprendizado para a vida inteira, em cada garrafa uma surpresa. Karnal confessa, curiosamente, que por “ligação profissional com algumas pessoas muito poderosas” chegou a provar vinhos excepcionais, o que considero um privilégio dos deuses. Infelizmente não é meu caso, não possuo amigos poderosos e suspeito que jamais provarei um Petrus de boa safra e devidamente envelhecido. (Cheguei a propor uma vaquinha entre quatro pessoas, compraríamos uma garrafa dez anos envelhecida, cada um entraria com cinco mil pratas, uma taça para dada um, porém a pobreza ou a usura de meus amigos impediram a realização do sonhado projeto.)
            Educar-se, em tais circunstâncias, não compreende apenas aquisição de conhecimento teórico, é preciso experimentar, vivenciar, utilizar-se plenamente dos órgãos dos sentidos. De modo semelhante aos livros, gosto de pegar na garrafa, sondar-lhe o fundo com os dedos, ler detalhadamente os rótulos e conferir-lhes a beleza ou mau gosto, conferir o teor alcoólico, a safra, depois a cor no copo, o perfume, um sentir que não acaba mais.
            Mas é preciso uma boa companhia, com quem trocar tal experiência, ou perde-se a maior parte do prazer.




Um comentário:

  1. Tenho minhas dúvidas. Nunca me esqueço do Parker, dizendo que nenhuma garrafa de vinho devia custar mais que 30 dólares...
    (O louco fica louco quando eu repito isso...)

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