Foto: AVianna, dez 2017, IPhone8
domingo, 31 de dezembro de 2017
sábado, 30 de dezembro de 2017
A bruxa de A.
(Peço encarecidamente ao leitor deste blogue que leia primeiro (caso ainda não tenha feito) as postagens anteriores a esta, Suzete em apuros, e a Reviravolta no Caso do Assassinato no Salão de Beleza, para depois sim, ler a presente A bruxa de A.)
A hipótese
levantada por Dr. Wellington, o inspetor, ganhou força quando encontraram
frasco com arsênio, em meio a enorme quantidade de substâncias as mais
diversas, na casa de Margarida. Também Suzete havia proposto a tese da
cabeleireira estranha, mulher calada, de muito pouca conversa, possível
suspeita.
A batida em casa de Margarida foi
ordenada pelo delegado Arturo, sugestão de Wellington. (Para surpresa geral,
ambos os policiais desenvolveram parceria exuberante, verdadeira amizade, ou
mais que isso, nascida ao longo da investigação, contrariando o que se vê no
cinema, nos filmes ditos policiais, em que há rivalidade explícita entre agentes
do FBI e da Polícia Estadual. Nas horas de folga saiam para beber, comiam em
restaurantes modestos, eu diria que românticos, a tal ponto que as
maledicências proliferaram. Dava gosto vê-los juntos, discutindo
particularidades do crime, aventando hipóteses.)
Margarida recebera a alcunha de
bruxa e não foi de graça; a casa dela mais parecia um laboratório de misteriosos
experimentos. Até sapos imersos em vidros de formol havia, além de aranhas
caranguejeiras, percevejos, caranguejos, pererecas, minhocas gigantes, lagartas
de todos os tipos, pequenas cobras verdes, coloridas, venenosas e não
venenosas, tudo muito bem acondicionado por gente que entendia do assunto. Para
que aquilo tudo servia, não se sabe. Os supersticiosos chamavam-na de bruxa.
Faltava, porém, a ligação entre
Margarida e os possíveis comparsas, ainda não identificados pela polícia.
Também não havia qualquer ligação entre ela e Edson Maranhão, vulgo Socó, o
homem encontrado estirado na cadeira de Suzete, com uma tesoura cravada na
virilha. O que havia eram muitas coincidências, filósofo da criminalística, afirmava
Dr. Wellington Marins, com a aprovação de Arturo de Barros.
O povo da cidade de A.,
açodadamente, pedia a cabeça de Margarida, mulher, calada, estranha, dona de
laboratório suspeito, ela mesma suspeita de bruxaria. A Idade Média revivia em
A.
A conversa que tive com Suzete
levava a motivação do crime para outra direção:
–
E o que o tal Socó faz na vida, Suzete?
–
Traficante de drogas.
–
Bem, já é meio caminho para morte violenta, não é mesmo?
–
Se é! Parece que nenhuma das meninas do salão teve contato com ele, nem mesmo
Margarida.
–
Pegou a droga e não pagou...
–
No meu ponto de vista trata-se de ajuste de contas.
–
E por que no salão de beleza, e ainda por cima na sua cadeira, Suzete?
–
O crime foi cometido à noite. A porta do salão não é difícil de ser arrombada.
O lugar é sossegado, adequado para o tal ajuste de contas, e por isso não houve
testemunhas.
–
E a cabeça raspada pela metade, a orelha cortada...?
–
Não há respostas para todas essas perguntas, incluindo o achado de arsênio. Ao
que tudo indica, o assassino, mesmo não sendo cabeleireiro, sabia manejar a
tesoura, coisa nada difícil, convenhamos, e conhecia a localização precisa da
artéria femoral.
–
Então vocês estão aliviadas?
–
Acho que sim.
Suzete não parecia assim tão segura
de si, não havia convicção em suas respostas. A investigação prosseguia.
Wellington e Arturo, inseparáveis, empenhadíssimos na solução do enigma
amplamente conhecido como o Assassinato no Salão de Beleza.
A vizinhança de Margarida foi
minuciosamente vasculhada. Até que uma das vizinhas resolveu dar com a língua
nos dentes: ela vira Edson Maranhão, dito Socó, entrar e sair várias vezes da
casa de Margarida, altas horas da noite. Pela manhã bem cedo, despediam-se aos
beijos, afirmou categórica dona Zulmira, vizinha de porta. “Eram namorados, com
certeza.”
Dr. Wellington não pestanejou, pediu
a prisão preventiva de Margarida, apoiado pelos métodos da Lava Jato. A bruxa,
que não esperava por essa, descompensou, teve um ataque de nervos ao entrar no
camburão, outro ao ser empurrada para a cela gelada, na companhia de ratos e
baratas. Foi nesse ponto dos acontecimentos que entrou a expertise (jamais
poderia imaginar que um dia me utilizaria desta palavra em algum texto meu!) de
Wellington Marins: o interrogatório!
O inspetor era implacável,
incansável, determinado, obstinado, criativo, verdadeiro virtuose na arte de
extrair qualquer segredo do interrogando, sem uso da força física,
naturalmente. A tormenta era tão somente psicológica, e que tormenta! A coisa
piorou para Margarida quando Arturo, que ainda se dedicava a explorar o bairro
onde ela morava, descobriu que dois comparsas na execução do crime eram primos
da bruxa, ambos residentes em A. Ela não teve outro jeito senão confessar o
crime.
De fato, ela acreditava no efeito
mortal agudo do arsênio. Como Socó não sucumbiu ao veneno, o remédio foi
segurá-lo à força pelos dois capangas, enquanto a própria Margarida
aplicava-lhe a fatal tesourada na virilha, com habilidade no manejo da tesoura
digna de uma boa cabeleireira. Enquanto o homem era exsanguinado, um dos
marginais brincava de barbeiro, raspando-lhe a cabeça com máquina zero,
operação interrompida pela metade com o advento da morte, quando fugiram todos.
–
E por que na cadeira da senhora Suzete, perguntou Wellington?
–
Porque Edson andava arrastando asa pra cima de Suzete ultimamente, respondeu
Margaria, com expressão de ciúme, filho do ódio.
Por
esta ninguém esperava; eu, menos ainda. Suzete negou qualquer participação sua
no triângulo amoroso, porém nem todos se convenceram. (A agitação dela, a
permanente e exagerada angústia durante todo o desenrolar das investigações,
sei não...)
Agora
começava a caçada aos primos de Margarida. Voltei para casa, dando o caso por
encerrado. Na minha partida, recebi efusivos agradecimentos de Suzete:
– Desejo agradecer-lhe mais uma vez
pelo apoio que me deu, André. Foram dias de muita angústia e sua presença fez
toda a diferença para mim. Sou-lhe imensamente grata. Que Deus lhe pague, pois
eu mesma jamais poderei pagar esta dívida.
O salão foi reaberto, a vida
prosseguiu. Pelo sim, pelo não, Suzete resolveu trocar de cadeira.
Algo
de bom sempre pode surgir da mais negra tragédia (nem Shakespeare foi capaz de
elaborar afirmação deste quilate): Arturo e Wellington mudaram-se para São
Paulo, alugaram confortável apartamento nos Jardins, vivem felizes, feitos um
para o outro.
quinta-feira, 28 de dezembro de 2017
Reviravolta no Caso do Assassinato no Salão
(Peço
encarecidamente ao possível leitor deste blogue que leia primeiro (caso ainda não tenha feito) a postagem
anterior a esta, Suzete em apuros,
para depois sim, ler a presente Reviravolta...)
Por um lapso imperdoável,
justificável apenas pela agitação de que foi tomado este narrador tão logo
soube dos apuros em que se meteu Suzete, até agora não mencionei o nome do
senhor delegado de polícia, que com tanto zelo vem conduzindo o Caso do Assassinato
no Salão de Beleza. Arturo, chama-se o homem, nome italiano, sabe-se lá se os
pais dele não eram aficionados pela música de Verdi, Beethoven ou Brahms.
Nas conversas que tenho com Suzete
diariamente fui informado de que transcorridos seis dias do crime, o caso ainda
não foi solucionado, o que deixa o delegado Arturo em situação difícil, pressionado
pela mídia local e até estadual. Não foi por outra razão que chegou à A. o inspetor
chefe Dr. Wellington, enviado pelo próprio Governador.
Dr. Wellington é tido como sumidade
na área da perícia investigativa, cuja fama corre mundo, por ser desvendador
dos crimes mais complexos. Em silêncio, sem os arroubos do delegado Arturo,
ouviu com cuidado o relato de tudo o que havia sido apurado até então,
incluindo a tese de que o homem não havia morrido pela tesourada na virilha, e
sim por intoxicação por arsênio, através do pequeno corte na orelha direita,
tese esta repetida ad nauseam pelo
delegado.
Minuciosa busca em casa de Suzete
não evidenciou qualquer traço de arsênio, porém ela foi intimada a depor diante
do inspetor Wellington, para enorme constrangimento de nossa amiga cabeleireira.
O inspetor escarafunchou-lhe o passado, perguntou sobre o casamento com Afonso,
a tentativa de homicídio, por ciúme, que ela sofrera pelo próprio marido, a
posterior prisão de Afonso, sua morte por câncer na prisão, como ela foi parar
em A. tendo residido vários anos em Brasília, e ela foi respondendo tintim por
tintim, muito calma, sem qualquer indício de que fosse uma criminosa.
Seguiu-se o interrogatório das
outras cabeleireiras, incluindo Albertina, dona do salão. Terminada essa fase
da investigação, Dr. Wellington reuniu-se com o delegado Arturo, na presença de
todos os interrogados, inclusive Suzete. O inspetor afirmou com voz pausada e
grave:
“A hipótese da morte pelo arsênio,
seguida da tesourada (parece que até ele, o inspetor, gostou do termo) na virilha,
exposta pelo delegado Arturo é bastante engenhosa, brilhante mesmo, porém não
pode estar correta.”
Ouviu-se um Óóóóóó!!! na delegacia, exclamação
de espanto geral, “permita-me o pleonasmo, André”, afirmou Suzete ao telefone,
com aquele seu tom de sabe-tudo. O inspetor prosseguiu:
“O
arsênio, cuja história foi tão bem enunciada pelo delegado Arturo, não provoca
a morte por simples contato com a pele, mesmo havendo um ferimento como aquele na
orelha direita da vítima. Algum grau de intoxicação haverá de causar, porém é necessária
a ingestão de quantidade maior, ou injeção intravenosa do arsênio, para causar
o óbito. Nada disso ocorreu. Talvez o delegado tenha se confundido com o efeito
altamente letal da estricninina, esta sim, substância perigosíssima, mortal em
doses mínimas. Porém, não há referência a esta substância no laudo do legista.
Por
que então a presença de arsênio, substância incomum, na orelha da vítima e na
tesoura? Penso que se deve ao fato do
assassino ou também confundir o efeito do arsênio com o da estricnina, como fez
nosso delegado Arturo, ou então trata-se de algum tipo de despistamento, apenas
desejo de nos confundir a todos. Porém, é possível que esta pessoa tenha alguma
familiaridade com venenos ou substâncias estranhas. Estranha pessoa...
Desse
modo, concluo que o homem morreu mesmo por exsanguinação provocada pela
tesourada na virilha. Digo ainda que foram necessários pelo menos dois
comparsas para segurar a vítima, para que ela fosse imobilizada na cadeira na
posição em que foi encontrada, semideitada, com a cabeça pendente, antes do
ataque final. Aliás, a distribuição dos fios de cabelo espalhados pelo chão, em
volta da cadeira onde o crime foi perpetrado, indica sinais de luta corporal.
Suponho
ainda que o golpe mortal tenha sido desferido por uma mulher, mais precisamente
uma cabeleireira, cuja escolha da arma, uma tesoura de cortar cabelo, parece-me
bastante natural. A criminosa há de ter intimidade com a arma, que desferida em
região do corpo onde se encontra uma artéria relativamente superficial e
calibrosa, como é o caso da artéria femoral, palpável com facilidade na
virilha, um golpe bem desferido no local há de ser mortal.”
Disse-me
Suzete que a plateia estava estupefata – palavra empregada por ela mesma – com o
discurso do inspetor. Quando ele falou em “intimidade com tesoura”, bambearam-lhe
as pernas.
Suzete
estava miseravelmente abalada.
Naquele
momento eu tinha compromisso inadiável e precisei interromper a conversa com
Suzete pelo telefone. Prometi-lhe que ligaria na manhã seguinte. E assim o
farei. Talvez fosse melhor voltar a A., pessoalmente.
terça-feira, 26 de dezembro de 2017
Suzete em apuros
Tão logo recebi a notícia pelo celular da própria Suzete,
tomei o primeiro voo para São Paulo, aluguei carro no aeroporto, rumei para a
cidade de A., distante aproximadamente 300 Km da capital, onde reside Suzete.
Não poderia deixar de prestar-lhe apoio num momento tão difícil.
Cheguei a
A. no começo da tarde e ainda encontrei Suzete na delegacia, exausta, diante de
interminável interrogatório sobre o assassinato. Confesso que levei um susto ao
ver nossa querida Suzete, pacífica cabeleireira, especialista em corte de
homem, envolvida em um crime. Sim, envolvida, ou por quê outra razão estaria então
sendo submetida àquele massacrante interrogatório?
Liberada
pelo delegado, sob a condição de não deixar a cidade em hipótese alguma, Suzete
levou-me para sua casa, respirou fundo e contou-me o sucedido. Reproduzo aqui
suas próprias palavras.
“André, nem
te conto. Sou eu quem abre o salão todas as manhãs, por ser a mais antiga e ter
a confiança de Albertina, a dona do estabelecimento. O tranco que levei ao ver
a cena foi como se levasse um soco na cara. Bem na minha cadeira, estirado,
quase caindo, estava o corpo de um homem completamente nu, a cabeça pendida
para trás, com uma palidez impressionante, mais parecia de cera, com uma
tesoura – a tesoura que utilizo para cortar cabelo de meus clientes – cravada
na virilha! No chão, uma enorme poça de sangue escuro.
Numa
primeira avaliação, o perito constatou que houve secção da artéria femoral
direita seguida de exsanguinação. Ou seja, o homem foi sangrado até a morte!
Fico
arrepiada só de lembrar, André. Mas que bom que você está aqui comigo, nunca
imaginei passar por uma situação dessas, fui eu quem encontrou o cadáver, bem
na minha cadeira, e com a minha tesoura cravada na virilha. O assassino (ou
assassina) deseja me incriminar, estou certa disso, daí a razão do
interrogatório do delegado que não acabava mais.
Na lógica
do delegado, o assassino sabe manejar uma tesoura com extrema destreza. Não
pude negar minhas habilidades... Mas jamais faria uma coisa daquelas: metade do
cabelo do homem estava intocada, a outra metade cortada rente, com máquina
zero. E o perito notou também um pequeno corte na parte superior da orelha
direita, sugerindo acidente no momento do corte de cabelo, fato bastante comum nas
barbearias mas coisa que eu jamais faria.”
Perguntei,
e quem é o morto? Gente conhecida sua, Suzete?
“As roupas
encontradas no chão não continham qualquer documento, não se sabe até agora
quem é o sujeito. André, mas eu tenho um suspeito. Melhor dizendo, uma
suspeita. Margarida não foi trabalhar hoje, e ela nunca falta. O telefone dela
não atende, fora de área. Sabe, ela é uma moça estranha, está no salão faz
poucos meses, sempre calada, corre o boato que ela mexe com feitiçaria, é o que
dizem, você deve conhecer o ditado: Salão de beleza e barbearia, paraíso da
fofocaria.”
Confesso
meu atordoamento com tanta informação, recebida em tão pouco tempo. Saímos para
comer alguma coisa, que eu ainda estava com o café da manhã, varado de fome.
Tentei mudar de assunto, perguntar como estava a vida de Suzete, se tinha
namorado, essa conversinha boba para distrair. Mas ela só podia falar do
assassinato, repetia a descrição da cena que encontrou ao chegar no salão, a
tesoura cravada na virilha... “Como era possível cravar a tesoura e o homem
permanecer estirado na cadeira? Então ele não reagiu, permaneceu imóvel diante
da tesourada? Ainda por cima nu? E que golpe certeiro, um único golpe e lá se
foi a artéria femoral? O cabelo cortado pela metade?” Suzete não parava de fazer perguntas a si
mesma, diante do crime inexplicável, atormentada pela suspeita que recaia sobre
ela.
Três dias
depois eu estava de mala pronta para voltar para casa, Suzete mais sossegada,
quando logo pela manhã ela recebe telefonema do próprio delegado, pedindo o
comparecimento dela à delegacia. Novo susto. Fiz questão de acompanhá-la,
identifiquei-me diante da autoridade, e para meu espanto, ouvi relato
extraordinário das investigações levadas a cabo até aquele momento. Eis a fala
do delegado, proferida com ares de profundo conhecedor do assunto, talvez até
mesmo se tratasse de um especialista:
“O arsênio (do
grego auripigmento amarelo) é conhecido desde tempos remotos assim como
alguns de seus compostos, especialmente os sulfetos.
Dioscórides e Plínio conheciam suas propriedades; Celso Aureliano, Galeno e Isidoro Largus sabiam de seus efeitos irritantes, tóxicos, corrosivos e sua ação parasiticida, e observaram suas virtudes contra a tosse, afecções da voz e dispneia.
Dioscórides e Plínio conheciam suas propriedades; Celso Aureliano, Galeno e Isidoro Largus sabiam de seus efeitos irritantes, tóxicos, corrosivos e sua ação parasiticida, e observaram suas virtudes contra a tosse, afecções da voz e dispneia.
Os médicos árabes usaram também
compostos de arsênio em inalação, pílulas e poções, e também em aplicações
externas. Durante a Idade Média os compostos arsenicais caíram no esquecimento
sendo relegados aos curandeiros que os prescreviam contra algumas
enfermidades. Roger Bacon e Alberto Magno se
detiveram no seu estudo.
O primeiro que o estudou em
detalhes foi George Brandt em 1633, e Johann Schroeder
o obteve em 1649 pela ação do carvão sobre
o ácido arsênico. A Jöns Jacob Berzelius se devem as
primeiras investigações acerca da composição dos compostos de arsênio. A partir
do século XVIII os compostos arsenicais conseguiram um posto de primeira ordem
na terapêutica até serem substituídos pelas sulfamidas e
os antibióticos.
Porém, o
arsênio continua sendo um veneno mortal, utilizado em muitos assassinatos. Pois
nosso perito chamou-me a atenção para a tonalidade cinza metálico encontrada na
extremidade da orelha direita do cadáver, exatamente no ponto onde havia um
corte provavelmente efetuado pela tesoura. Um rápido exame toxicológico revelou
forte presença de arsênio, a mesma substância sendo encontrada na tesoura
cravada na virilha do cadáver.”
O delegado
fez uma pausa solene e, cheio de si, proferiu a sentença final.”
“O homem
não morreu do ferimento na virilha, seguido de exsanguinação. Morreu envenenado
por arsênio. Depois de morto a tesoura foi cirurgicamente cravada, drenando o
sague do cadáver ainda fresco.”
E
arrematou:
“Dona
Suzete, a senhora trabalha com arsênio?”
Outro
susto! Suzete quase caiu da cadeira. “Arsênio? Como assim? O senhor acha que
fui eu quem matou o homem? Só porque estava na minha cadeira? Só porque a
tesoura era minha? O senhor não percebe que o assassino (ou assassina) deseja
me incriminar? Meu Deus, que loucura!”
O
interrogatório estendeu-se por toda a manhã, até que Suzete foi liberada, nas
mesmas condições já citadas; deveria permanecer à disposição do delegado.
Fiquei mais
um dia em A., Suzete ainda agitada, acreditando que a descoberta do arsênio na
tesoura só podia ser coisa da Margarida, tida com feiticeira.
Já em casa,
falo com ela duas ou três vezes ao dia, pelo Skype. O salão permanece
interditado. As buscas para a descoberta do criminoso (ou criminosa) continuam
intensas, o delegado empenhadíssimo em esclarecer o crime, presente em todas as
manchetes dos jornais, na Internet, Tweeter, Facebook, etc.
Procuro
acalmar Suzete, ainda agitada; não é para menos, está em apuros.
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