De uma conversa com meu
amigo Pedro Cardoso (de Brasília), sobre literatura, poesia e aldravias, ele
elaborou o belo e interessantíssimo texto que agora publico no Louco. Obrigado,
Pedro!
Aldravias concretas, é possível?
Sempre gostei dos
desafios, principalmente os poéticos. Na poesia a palavra ganha novos sentidos,
novas dimensões e por que não dizer, novos e irreverentes significados?
Pensando nisto foi que me veio a ideia de construir Aldravias no formato dos
poemas concretos. Sei que muitos haverão de achar estranho esta nova vertente,
mas ela não deixa de ser uma outra forma de deliciar-se com os ditos poemas.
Um dos grandes segredos
da poesia é que ela nos leva a imaginar coisas, fenômenos, acontecimentos, que,
de certo modo, vão além do significado puro e simples da escrita. Este
vislumbre pode ter vários significados e várias interpretações, isto, a meu
ver, é o que faz dos poemas algo sempre atual e desafiador.
Esta construção que ora
proponho confere ao autor a possibilidade do desenvolvimento de uma arte visual
e intelectual ao mesmo tempo, sem que haja prejuízo algum para o texto. Por
outro lado, poderá oferecer ao leitor mais atento uma configuração singular,
uma vez que a figura proposta nem sempre trará, em seu bojo, algo transparente
ao primeiro olhar.
A imagem deverá ser
“lida” independentemente do poema. Para que isto aconteça terá que estar, no
mínimo, subliminarmente contida no contexto. Por exemplo:
avião
comissão
de
frente
turbinas
recauchutadas
A figura, retratada,
não pode ser vista como uma fotografia. Terá, obrigatoriamente, que nos levar a
percebê-la. Neste caso, seriam os seios de uma mulher desnuda, dada a
disposição em que os vocábulos foram milimetricamente expostos.
A leitura precisa ser
feita como se descêssemos os degraus de uma escada, aos trancos. Isto mesmo,
tem que ser: palavra por palavra como elas foram expostas. Para que a imagem
criativa se torne uma realidade concreta em nosso cérebro. É importante
ressaltar que neste caso o poeta Aldravista se torna um Artista Plástico por
excelência.
Veja que não há, de
forma alguma, prejuízo para a Aldravia. Muito pelo contrário, a concretude do
poema oferece algo novo, diferente, apenas mais elaborado. Isto não implica
dizer que teremos um esforço extremo para sua elaboração.
Outro exemplo de Aldravia concreta:
ipê
ipê
branco
amarelo
neve
ouro
em
em
pleno pleno
cerrado semiárido
André Viana e Pedro Cardoso
Aqui temos uma Aldravia
composta, feita por dois autores. Uma completa a outra, o que não deve ser uma
obrigação. Podem perfeitamente ser opostas que não mudará nada.
Mesmo sendo dois
autores distintos, acredito que não seja necessário a autorização prévia do
primeiro, porque os créditos estão literalmente consignados. É imperioso dizer
que as parcerias criam vínculos poéticos duradouros. Aqui é possível imaginar
que o ipê-branco nasce no cerrado e que o amarelo, o de grande porte, floresce
nos pés de serra.
Outro ponto que
gostaria de abordar nesta minha proposta é o fato de que as Aldravias
deveriam ser tituladas. Por exemplo:
Maria Fulô
saia
justa
atributos
relevantes
mulata
assanhada
Veja que nesta
composição acrescentei propositalmente o título: Maria Fulô. No meu entender
este detalhe nada mais é do que o registro cabal do nascimento de um poema
oriundo de seis palavras aleatórias. Este fato confere a ele vida própria e
longa.
O título deve servir
como um norte para o leitor. É ele que indica o assunto da obra na sua
essência. Além disto, facilita sua identificação no contexto histórico. No pior
das hipóteses, individualiza a obra.
Para ilustrar meu
raciocínio, exemplifico com um fato bíblico e histórico: quando me refiro a um
dos sonetos de Camões que foi escrito há centenas de anos, tenho que me
reportar a ele através dos seus personagens, Labão, Lia e Raquel. Sem estes
dados sua identificação fica, no mínimo, comprometida. Se ele fosse
individualizado, sua identificação certamente seria muito mais tranquila e
fácil.
Para finalizar minhas conjecturas apresento mais dois exemplos que julgo
relevantes:
1º - Espelho
pétalas
pétalas
perfumadas
perfumadas
alhures
alhures
vasos
vasos
de
de
flores
2º - Vaso de flores
ipê
ipê
branco
amarelo
neve
ouro
em
riqueza
pleno do
cerrado
André Viana e Pedro Cardoso
A palavra CERRADO
serviu aos dois poemas sem que um se sobressaísse ao outro e viva a poesia
concreta!!!
Pedro Cardoso
Interessante! Criativo!
ResponderExcluirEsse é o Pedro Cardoso (de Brasília)! Prolífico escritor de cartas, poesia, palavratrix, etc, tudo publicado na Recanto das Letras.
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