Eduardo Giannetti acaba de
publicar “Trópicos utópicos – uma
perspectiva brasileira da crise civilizatória”, livro que podemos chamar de
fundamental. Sei que o ano ainda não acabou, mas provavelmente será o livro
mais importante do ano!
A edição da Companhia das Letras (2016) é bem cuidada,
capa dura de muito bom gosto, cabeceado, etc.
Segundo o autor, o objetivo da obra é “analisar os elos
que nos ligam ao mundo e distinguir os traços que nos definem como nação, mas a
partir de um olhar utópico e prospectivo.”
Logo na
primeira seção do livro Giannetti delineia o plano da obra:
“A tríplice
ilusão. – O tempo decanta o passado. O que hoje está presente, ontem mal se
antevia. O mundo moderno nasceu e evoluiu embalado por três ilusões poderosas:
a de que o pensamento científico permitiria gradualmente banir o mistério do
mundo e assim elucidar a condição humana e o sentido da vida; a de que o
projeto de explorar e submeter a natureza ao controle da tecnologia poderia
prosseguir indefinidamente sem atiçar o seu contrário – a ameaça de um terrível
descontrole das bases naturais da vida; e a de que o avanço do processo
civilizatório promoveria o aprimoramento ético e intelectual da humanidade,
tornando nossas vidas mais felizes, plenas e dignas de serem vividas.”
O que o autor chamou de microensaios, às vezes resumem-se
a três ou quatro linhas:
“Perante o
leitor. – A palavra incita: decodifique-me;
a frase pleiteia: creia-me; o
parágrafo cobra: interprete-me; o
livro roga: leia-me. O autor semeia,
a leitura insemina.”
Outro exemplo, tema insistentemente tratado neste blog:
“Anatomia do
impasse. – A impossibilidade intelectual de crer não suprime a necessidade
emotivo-existencial da crença.”
Este último aforismo dá o que pensar: ensina que a
tolerância pode começar a partir de nós mesmos, no que se refere às nossas
próprias convicções. Não nos peçam coerência o tempo todo.
Outras vezes o ensaio chega na forma de uma parábola:
“Falácia da
indução. – O granjeiro por meses a fio veio pontualmente dar de comer à
galinha, um belo dia torceu-lhe o pescoço.”
Ou se apresenta como se fosse uma piada:
“Pingue-pongue.
– Quando Mahatma Gandhi desembarcou no porto de Southampton, no sul da
Inglaterra, em 1931, a fim de participar de uma conferência sobre o futuro da
Índia, um jornalista teria perguntado a ele: “O que o senhor acha da civilização
ocidental?” E o líder indiano respondeu: “Acho que seria uma boa ideia.”
A par do
brilhante conteúdo histórico, político, filosófico do livro, sua forma é
impecável, literatura da melhor qualidade – ou não seria um livro fundamental.
Indispensável
a leitura de Trópicos Utópicos nesse nosso mundo conturbado de hoje.
Estou lendo! E digo: o homem pensa com perspicácia e escreve com apuro. Permita o louco a minha citacão:
ResponderExcluir"(...) a crenca de que a a morte é o "nada definitivo" não é menos dogmática que a tese do pré-socrático Heráclito segundo o qual "existem coisas que aguardam os homens após a morte as quais eles não esperam e das quais não possuem nocão alguma".