Um casal de grandes amigos
recentemente teve gêmeos e quando as crianças completaram 3 meses de idade o
pai vestiu-os com a roupinha do Flamengo. Mais precisamente com o “manto
sagrado”, segundo o progenitor, flamenguista roxo, nem é preciso dizer.
Argumentei com ele que aquilo não era correto, pobres crianças, destinadas a
eterno sofrimento. Melhor que fossem palmeirenses. Tudo brincadeira, é claro.
No
dia seguinte surge a imperdível crônica na Folha de S. Paulo, Omissão de socorro, escrita pelo grande
Hélio Schwartsman, tratando de assunto sério, porém usando o futebol como
metáfora, e com grande senso de humor. (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/208903-omissao-de-socorro.shtml)
Eis o trecho que nos
interessa:
“Sou pai
de gêmeos e, alguns anos atrás, quando os meninos estavam descobrindo o
futebol, expliquei-lhes didaticamente que eu torcia para o Corinthians por ser
o melhor time do mundo. Eles se convenceram, mas, pouco depois, provavelmente
por influência de coleguinhas, um dos garotos começou a exibir preocupantes
tendências são-paulinas. Ato contínuo, aumentei a mesada do que permanecera
fielmente corintiano. Funcionou à perfeição. Sem impor nada nem limitar-lhe o
livre-arbítrio, fiz com que o filho rebelde retornasse ao bom caminho, onde
está até hoje.”
O motivo da crônica surgiu porque uma certa jornalista
afirmou que os filhos deveriam ser deixados livres para escolherem seus times
de futebol, da mesma maneira que deveriam escolher livremente uma religião (ou
a ausência dela, acrescento eu). Estamos falando de uma das coisas mais
complicadas desta vida: como educar nossos filhos. (Não é à toa que o
Loucoporcachorros vem tratando do assunto com certa frequência: com minhas
filhas já crescidas, Gabriela, a netinha de 4 anos de idade, é o alvo desta
preocupação.)
Freud
afirmou, não com estas palavras, que há três tarefas impossíveis nesta vida:
governar, educar os filhos e psicanalisar. Estamos, portanto, caminhando em
terreno movediço.
Até onde os
pais têm direito de impor aos filhos determinadas ideias, como a escolha de uma
religião? Mas como bem o disse Schwartsman, “Se o sujeito está convencido de
que todos os que não seguem sua religião estão condenados ao inferno, é demais
cobrar-lhe que não introduza em sua fé um ser que ama, correndo o que imagina
ser o risco de sujeitá-lo a sofrimentos eternos.”
Bem, quando
o articulista fala de “o sujeito”, está a referir-se aos pais, suas convicções
e responsabilidades. Quanto mais ferrenhas estas convicções – leia-se aqui,
fundamentalistas – maior a chance de deseducar. Porém, a total liberdade de
escolha por parte dos filhos gera situação perigosa, como se os pais abrissem
mão de seu dever de educadores. (Será esta uma doença do século XXI?)
Ser pai ou
mãe é andar numa corda bamba!
Schwartsman,
no seu papel de filósofo provocador e adepto do consequencialismo, acrescenta
um novo viés de pensamento:
“Será que
é ético subornar um indivíduo para que faça o que é melhor para ele, como tirar
boas notas, parar de fumar, perder peso? Admito que seria preferível fazer as
coisas certas pelas razões certas ("pelo sentido do dever", no
vocabulário kantiano), mas, se existe um atalho que funciona e o resultado nos
parece vital, será que temos o direito de não utilizá-lo? Isso não seria o
equivalente moral da omissão de socorro?”
Bem, sorte
tive eu que, com duas filhas mulheres, nenhuma interessou-se por futebol...
A crônica é ótima. Por trás do humor, a pergunta filosófica: até onde é lícito influenciar as pessoas? Lembro o famoso best-seller "Como ter sucesso e influenciar pessoas" (ou algo parecido). A segunda pergunta: se viver é conviver, como não influenciar pessoas? Principalmente de pais para filhos, parecer ser esta a quarta coisa impossível. Pobres filhos...
ResponderExcluirDiz uma amiga: os pais dão muito trabalho aos filhos!
ExcluirDisse um amigo: "Anos atrás, eu tinha meia dúzia de teorias e nenhum filho; hoje, tenho meia dúzia de filhos e nenhuma teoria".
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