terça-feira, 28 de outubro de 2014

Um lugar perigoso



              
              Aos 78 anos de idade, o carioca Luiz Alfredo Garcia-Roza acaba de lançar seu décimo-primeiro romance policial, tendo mais uma vez a participação, agora um pouco mais discreta, do delegado Espinosa. Um lugar perigoso (Companhia das Letras, 2014), este o título do livro, traz de forma inequívoca, as marcas da formação original do autor, graduado em Filosofia e Psicologia.
            Garcia-Roza é autor de obras importantes em Filosofia e Psicanálise, como Introdução à metapsicologia freudiana, em três volumes, O mal radical em Freud, Freud e o inconsciente. Palavra e verdade na filosofia antiga e na psicanálise (Jorge Zahar Editor, 2001, 4a edição), é um livrinho precioso, muitíssimo bem escrito, e transcrevo aqui o primeiro parágrafo, com o intuito de aguçar a curiosidade do leitor deste blog:

“Houve um tempo, na Grécia arcaica, em que as palavras faziam parte do mundo das coisas e dos acontecimentos. Ela era voz e gesto, dia e noite, verão e inverno. Signos mundanos e signos sagrados remetiam o indivíduo a um outro tempo e a um outro lugar: ao tempo dos começos e ao mundo dos deuses e dos heróis. A palavra, juntamente com as condições de sua enunciação, não valia apenas pelo seu sentido manifesto, mas como signo a ser decifrado para que um outro sentido, oculto e misterioso, pudesse emergir, num interminável de decifrações. Essa era a palavra do aedo, poeta-profeta da Grécia arcaica, palavra portadora da alétheia, da verdade. Passados três mil anos, vamos encontrar a psicanálise ainda à procura de sua alétheia e, para ela, a verdade fundamental é a verdade do desejo.”

            Dono de um estilo clássico, elegante, claro, Garcia-Roza de repente deixa de lado os escritos acadêmicos e passa a dedicar-se ao romance policial, para surpresa e desapontamento dos profissionais da área psi, e para imenso prazer do próprio autor, segundo ele mesmo. Sua estreia foi com O silêncio da chuva, ganhador dos prêmios Nestlé de Literatura (1996) e Jabuti (1997).
            As tramas de seus romances passam-se invariavelmente em Copacabana, Ipanema e Bairro do Peixoto, onde mora o já famoso delegado Espinosa. Em Um lugar perigoso a geografia não muda, e embora se trate de lugares onde o perigo é real na cidade do Rio de Janeiro, o leitor, logo no primeiro capítulo, se depara com uma frase tão reveladora quanto intrigante, que dará o tom do romance até o seu final: “A memória é um lugar perigoso.”
            Mais, não é prudente revelar. Vale a pena conferir.

2 comentários:

  1. Bela resenha! Assim dá vontade de sair correndo até a livraria mais próxima, à procura dos dois livros!

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  2. Os policiais do Garcia-Roza são deliciosos presentes!! Não há dúvida! Além disso, a resenha despertou a vontade de ler também esse outro "livrinho precioso".
    Eita blog cultural!!

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