O velho fazia sua caminhada diária quando um carro parou junto ao meio
fio e pediu informação – supõe-se, pois não houve testemunhas. O caminhante
levou dois tiros no peito e morreu instantaneamente.
Um advogado amigo da família e com vocação detetivesca interessou-se
pelo caso, já que a polícia fez pouco ou nenhum progresso nas investigações
durante os seis meses subsequentes. Aparentemente o velho não tinha inimigos.
Nos últimos dez anos sua convivência social reduziu-se a duas ou três pessoas,
incluindo a própria mulher, de um segundo casamento, com quem estava casado há vinte
e poucos anos. As aventuras amorosas haviam se perdido no tempo. Ele não devia
dinheiro a ninguém, aliás, não devia nada a ninguém. E não dispunha de seguro
de vida.
O advogado amigo da família, residente no bairro da vítima, passou a
fazer a mesma caminhada, repetindo o trajeto e horário, diariamente. Observador
por natureza, mantinha-se atento aos homens e mulheres com quem cruzava, quase
todos acima dos cinquenta anos, contava os carros que rodavam pela rua àquela
hora da manhã, anotava marcas, modelos e cores dos veículos, de um ou outro registrava o
número da placa. Fez isso durante seis meses.
Do mesmo modo que a polícia, não pôde chegar a pista alguma. As marcas
de sangue deixadas pelo morto na calçada estavam quase que completamente
apagadas. Ninguém mais comentava sobre o crime. A esposa do velho, alguns anos
mais nova, havia se casado de novo. O advogado recebeu ótima proposta de
emprego numa grande firma de advocacia e mudou-se para São Paulo.
Ao chegar em casa depois de 50 minutos de caminhada, esta foi a
história que o velho deixou registrada em seu computador, ele que pretendia publicar
um livro de contos sobre crimes sem solução. Morreu de infarto alguns minutos
depois.
Com quem a viuva se casou?
ResponderExcluirEsta será uma outra história...
ResponderExcluirDe fato, primoroso, surpreendente! Um retrato apropriado da insensatez nossa de cada dia... A linguagem enxuta, direta, neutra, acentua o mistério, tirando dele qualquer ameaca de sentimentalismo. Na medida.
ResponderExcluirQue bom receber seus comentários sobre a forma! É o mais importante.
ExcluirDr, o post contém os ingredientes fundamentais de um boa história policial: simplicidade e precisão da narrativa, mistério, assassinato brutal, investigação oficial inconclusiva, investigação paralela interrompida, perguntas sem resposta, dúvidas, enfim, a justiça por fazer. Há material suficiente levantado pelo advogado para que alguém continue a investigação paralela, sem falar no trabalho da polícia que não pode ser descartado. A história da esposa mais nova que se casa novamente e que provavelmente herdou grande parte dos bens do velho precisa ser detalhada. O novo marido, na certa mais novo que o velho assassinado, também faz parte da trama. A estranha disposição do advogado amigo da família em conduzir seis meses de investigação é algo que precisa ser explorado. Gostei do estilo fluido e sem rodeios, típico destas histórias. Por tudo isso, a história pede uma continuação. Aguardo então os próximos posts...
ResponderExcluirCaro Anônimo, agradeço suas ótimas sugestões, de quem entende do assunto. Porém, você se esqueceu do título do conto: tenho apenas 50 minutos.
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