Nina Simone
Ainda não li o livro de Brian
Hare e Vanessa Woods, Seu Cachorro É um Gênio! (Ed. Zahar), mas não
resisto, desde já, a tratar do assunto!
Começo por relatar o intrigante
comportamento de um de meus cachorros, uma Yorkshire atualmente com 8 anos de
idade, que atende pelo nome de Nina Simone, mas também responde pelas alcunhas
de Nina, Nininha e Menina. Ela é filha de Camões e Lola, ambos adquiridos de
bons criadores, mas Nina nasceu aqui em casa – eu e minha mulher fizemos o
parto.
Dos três, é a única que
sobe na mesa ao final das refeições, em busca de restos de comida. Ela
não aprendeu isso com seus pais, que nunca o fizeram, porém, é interessante registrar,
dois irmãos dela, vivendo em casas de amigos, também desenvolveram tal comportamento.
Serão os tais genes recessivos?
Logo que percebemos esta
característica pouco civilizada, tratamos de educá-la, reprimindo-a com
energia. Em nossa frente, Nina Simone nunca mais cometeu tamanha deselegância.
Ela espera que nos levantemos, deixemos o ambiente, para só então voltar a
subir na mesa...
Nos fins de semana
costumamos tomar o café da manhã na varanda. Ao terminá-lo, caminhamos até o
jardim, quando somos acompanhados por Camões, Lola e Nina. Para nossa surpresa,
vimos que Nina, a meio do caminho, dá meia volta e, sorrateiramente, retorna à
varanda e sobe na mesa. Incrédulos, repetimos a experiência por três ou quatro
vezes, fingindo não prestar atenção na Menina, e ela repetiu a artimanha de
sempre. Inteligência não lhe falta, tivemos que admitir!
Hare, neurocientista
fundador do Centro de Cognição Canina da Universidade Duke, nos EUA, e sua
mulher Vanessa Woods, baseados em estudos sobre o assunto que chamaram de caninognição
– a cognição dos cães – chegaram à conclusão de que o processo evolutivo que
transformou lobos em cachorros domésticos fez com que os animais adquirissem um
novo tipo de inteligência social, tornando-os o segundo mamífero mais bem
sucedido no planeta, atrás apenas do homem.
A população de cães de
estimação aumenta em praticamente todos os países, ao passo que o mesmo não
ocorre com o nascimento de bebês, que cai progressivamente em alguns países
mais civilizados. É cada vez mais comum
encontrar animais cercados de mimos, tratados como filhos por seus donos. O
sucesso dos cachorros entre os humanos pode ser explicado pela genialidade
canina. Os autores descrevem seis características principais do cão, que
justificam a teoria.
1. Entende a
linguagem corporal humana:
O cachorro compreende perfeitamente
gestos e olhares de seu dono, habilidade extremamente rara entre os animais (nem
mesmo os chimpanzés podem interpretar tão bem nossos gestos).
2 . Pode
aprender palavras:
Os cães podem ser treinados para
aprender um grande número de palavras e seus significados, com relativa
facilidade.
3. Consegue se comunicar com as
pessoas:
Os cães usam diferentes tipos de
latidos, rosnados, gemidos, ganidos para se expressarem e serem compreendidos
pelos humanos. E os donos muitas vezes conseguem compreender os significados desses
diversos “ruídos” de seus animais.
4. Faz e valoriza amizades:
As
amizades estabelecidas pelos cães ocorrem primordialmente para com os donos,
mas também para com os filhos dos donos, os amigos dos donos, e entre os outros
animais da casa . (Isso sou eu quem diz, não deve estar escrito no livro...)
5. Sente empatia:
O sentimento de empatia manifesto pelo
cão, ou seja, de se sentir mal ao ver alguém sofrendo, ou ficar feliz quando
alguém sorri, pode ser facilmente percebido por seu dono, em inúmeras circunstâncias.
Podemos afirmar que, às vezes, o cão chora conosco, ou ri conosco.
6. É capaz de enganar o dono:
Bem, aqui é preciso citar textualmente
o artigo cuja referência está no final desta crônica (1):
“A
inteligência dos cachorros também tem seu lado negativo. Um estudo realizado na
Universidade de Viena, na Áustria, mostrou que os cães sabem quando estão ou
não sendo observados pelo dono e se comportam de formas diferentes de acordo
com isso. Os pesquisadores chegaram à conclusão de que os animais desobedecem
mais ordens quando os donos não estão no mesmo ambiente que eles ou estão
distraídos por alguma outra atividade, como ler ou ver TV.”
Discordo radicalmente de que esta seja
uma característica “negativa” dos cachorros. Esta é uma visão moralista do
comportamento animal. As crianças pequenas exibem com frequência este mesmo
tipo de comportamento, narcisista e de autopreservação. Os preceitos morais, o
chamado processo civilizatório, vêm depois, para os humanos! Não para os cães.
Nina
Simone sabe quando está ou não está sendo observada, e decide qual atitude
tomar, em função desta variável. O mais notável é que ela é capaz de conter o
forte impulso instintivo de ir em busca de comida, ao saber que está sendo
vigiada, pois já aprendeu que esta não é uma atitude permitida, civilizada
portanto. Contudo, se reconhece que não está sendo observada, o instinto fala
mais alto. Nina Simone não faz julgamentos morais.
Nós,
humanos, somos muito diferentes disso?
(1) http://veja.abril.com.br/noticia/saude/seu-cachorro-e-um-genio-saiba-o-porque?utm_source=redesabril_veja&utm_medium=twitter&utm_campaign=redesabril_veja&utm_content=feed&
Foto: A.Vianna, Brasília, 2009.
Foto: A.Vianna, Brasília, 2009.
Que texto delicioso! Cachorro é um tema que nao acaba.
ResponderExcluirEstou pensando em levar Nina Simone para a Universidade de Duke, para dar uma força aos pesquisadores... Que tal, Paulo?!
ResponderExcluirAdorei sua crônica, André! Vou mostrar à minha irmã que é uma apaixonada por cães e sai pelas madrugadas para tratar dos cachorros sem lar.
ResponderExcluirDê meu abraço a ela, Nazaré!!!
ExcluirTalvez a malícia seja um atributo típico dos mamíferos e que, como outros tantos, atingiu o ápice de sua sofisticação no ser humano. Seria então mais adequado o nome "homo malignavérunt" (malicicoso) ao invés do "homo sapiens"?
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