quinta-feira, 31 de outubro de 2013

A perda das referências


               – Não sei onde vi que...
            Esta tornou-se uma frase recorrente em minhas conversas, tanto eu como as pessoas de meu convívio a repetimos a todo momento, para introduzir qualquer tema ou assunto. Por exemplo:
            – Não sei onde vi que... o número de casos de poliomielite na Síria e em Israel tem aumentado, depois de anos de erradicação da doença.
            O assunto nem precisa ser tão relevante assim:
            – Não sei onde vi que... o Palmeiras vai contratar o Messi para a próxima temporada!
            Resta pouca dúvida de que isso é fruto do massacre de informações a que somos submetidos cotidianamente, pelas mais diversas mídias, das quais a Internet é a campeã. Fica a notícia – quando fica –, vai-se a fonte.
            Como tudo na vida, há prós e contras para o fato em questão. Comecemos pelos contras. Se perdemos a referência, corremos o risco das afirmações falsas, das distorções, das deturpações, das mentiras mesmo. Faltar com a referência é correr o risco de perder a credibilidade.
            Há um recurso muito utilizado, especialmente por aqueles cuja credibilidade já se encontra consolidada para a opinião pública, os chamados famosos, que afirmam sem medo de errar:
            – Alguém já disse que...
            Pronto, isso é o suficiente para que o ouvinte ou leitor acreditem piamente na informação prestada. Um certo psicanalista, do qual já não me lembro o nome, só me lembro de seu narcisismo exagerado, gostava de acrescentar em tais circunstâncias:
            – E se ele não disse, Eu estou dizendo agora! (E o ouvinte permanecia na eterna dúvida sobre a verdadeira referência ou afirmação original.)
            Para o cientista, a ausência de referências é imperdoável. O próprio rigor do pensamento científico advém das “verdades” científicas preestabelecidas, o que não quer dizer que tais verdades não possam ser completamente modificadas com o passar do tempo.
            A favor do fato que estamos tentando compreender, a ausência ou imprecisão das referências, temos o exercício de liberdade de quem fala ou escreve, a certeza de que estamos inserindo algo de pessoal na afirmação que fazemos. Isso chama-se criatividade, é próprio do espírito humano! Digo Eu vi em algum lugar..., mas na realidade estou me referindo a alguma coisa que eu sinto ou penso. E muitas vezes não tenho consciência se vi mesmo em algum lugar, ou se o que digo é de exclusiva responsabilidade de minha mente.
            Isso funciona muito bem quando se escreve ficção. Se o escrito permanece na gaveta por um certo tempo, quando se relê o texto surge a pergunta Fui eu mesmo quem escreveu isso? É quando se confundem ficção e realidade.
            Vi na televisão (e cito a referência porque foi hoje que eu vi) o grande jornalista Geneton de Moraes Neto afirmar que, infelizmente ele não conhecia o autor da frase de que tanto gosta: “Das coisas menos importantes da vida, o futebol é a mais importante.” Em volta, todos riram, e eu também. Que se dane o autor da frase!
            Bem, então como ficamos diante da incerteza gerada pela falta de referências? Se nosso interlocutor é ouvinte atento (vale dizer também leitor atento), ele poderá discriminar entre o verdadeiro e o falso, ou ao menos levantar o benefício da dúvida, o que é sempre saudável. Se o ouvinte ou leitor têm como funcionamento mental predominante o pensamento mágico ou religioso (nada contra as Religiões), tal discriminação torna-se difícil de ocorrer, se não impossível. Vende-se e come-se gato por lebre.
            Repito, ao cientista cabe apenas o pensamento científico; ao filósofo, o modelo filosófico. Mas se a conversa é de botequim – e como às vezes é gostosa uma conversa de botequim! – tanto faz se o frango à passarinho é lebre, gato, coelho, ou, na China e Tailândia, até cachorro. Aliás, não sei onde vi que... estão servindo carne de cavalo na Europa.

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Insanidade


Baseado em fatos reais.

Após sofrer tortura e abuso sexual pelo próprio pai, não resistiu aos ferimentos e morreu. Ah!, tinha apenas 1 ano de idade.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

o sentido simples das coisas


noite de tempestade, raios, trovoada
árvores perdem alguns
de seus galhos mais frágeis
assustam-se os cães
(como assustavam-se
os homens primitivos)

na manhã seguinte
o ar está limpo
e assim é desde
o princípio dos tempos
(sem que para isso haja
uma razão plausível)

como tudo na vida
                        é porque é...

Desolação

A foto do dia.


Protestos ontem em São Paulo.

Foto: Marcelo Camargo, Agência Brasil.

O Enem deve ditar as diretrizes do ensino?


O artigo “Novo Enem faz colégio modificar currículo e contratar consultoria”, publicado no O Estado de São Paulo em 21 de agosto último, de autoria de Fábio Mazzitelli e Laís Cattassini, parece ter passado despercebido, embora se trate de notícia com graves repercussões para o ensino no Brasil. (1)
            Os articulistas apontam que “O novo formato do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que será aplicado a partir deste ano, e o desempenho na prova de 2008 levaram escolas particulares de São Paulo a mudar a proposta pedagógica e até a contratar consultoria para tentar ampliar o número de alunos com notas altas na avaliação.”
            O artigo destaca ainda que numa “escola tradicional da capital, com mensalidade em torno de R$ 1.500,00 o resultado ruim do Enem no ano passado –  unidades em 130º e 134º lugares – gerou mudanças. Para nortear a reestruturação, foi contratada uma consultoria – a direção do colégio não revelou o nome da empresa. Houve uma cobrança maior. Alguns pais ficaram inseguros. Agora, temos diagnósticos a curto, médio e longo prazo, afirma a coordenadora do centro pedagógico.”
            A posição do MEC também é registrada pelo jornal: “Ao lançar a nova proposta do Enem, o MEC afirmou que uma das metas era levar escolas a rever o currículo do ensino médio. "É bom repensar o currículo para inseri-lo no mundo moderno. Mas, se essa mudança for só para o Enem, é precipitado", diz Maria Inês Fini, que participou da equipe que criou o exame no fim de 1990.”
            Conhecemos de longa data os chamados “cursinhos” preparatórios para os vestibulares: os melhores eram aqueles que obtinham maior número de aprovações (e maior número de alunos no ano seguinte). Para tanto, o ensino que ofereciam era o mais específico possível, direcionado apenas às possíveis questões das provas, sem qualquer outro critério quanto ao mérito do conteúdo.
            Pois agora são os melhores colégios a guiarem-se pelo mesmo viés comercial: os alunos precisam obter bons resultados no Enem, o que elevará a classificação da escola no ranking nacional. Com isso, pais mais satisfeitos, mensalidades em dia...
            Então, agora é o Enem que dita as diretrizes do ensino médio para o país? Parece que sim. O Brasil não tem mais um programa elaborado por educadores de comprovado saber, coordenados pelo MEC, imunes aos ventos políticos que porventura assolem o país. O MEC abriu mão de sua prerrogativa de Educar em detrimento dos fazedores de provas do Enem. Se muda a comissão que elabora as provas, as escolas devem mudar seus currículos a fim de se manterem bem colocadas.
            Trata-se portanto de estratégia absurda, que jamais poderá substituir um projeto educacional sério, abrangente, com repercussões a longo prazo, possibilitando as transformações sociais que todos almejamos. E sem Educação, não há futuro para o Brasil.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Assustado

Tamanha a intolerância dele a sustos que, independente do filme, quando as luzes do cinema se apagavam ele saía correndo.