“A Polícia Civil da
Barra do Piraí, no Sul Fluminense, recebeu nesta segunda-feira um documento que
reforça o conjunto de provas contra a manicure Suzana de Oliveira, de 22 anos,
apontada como a assassina do menino João Felipe Eiras Bichara, de 6 anos. A mãe
da acusada, Simone de Oliveira, de 39 anos, entregou ao delegado José Mário
Salomão um caderno usado como diário pela filha. Nele, há detalhes do plano de
sequestrar João Felipe.” (1)
Diante da notícia, instantaneamente ocorreu-me a lembrança
do que podemos chamar de miniconto, escrito por Franz Kafka e registrado em seu
diário, em 6 de dezembro de 1922:
“Duas crianças, sozinhas no apartamento, entraram numa grande
mala, a tampa fechou-se, não a conseguiram abrir e morreram asfixiadas.”
Se Kafka fosse um assíduo
frequentador do Twitter, ou tivesse um Blog, talvez pudesse escrever:
Fazendo-se passar
pela mãe da criança, tirou o menino da escola, levou-o para um quarto de hotel
e o matou. Em casa, guardou o corpo numa mala.
Ficção e realidade
se confundem, e deste fato é que sobrevive a Literatura. Penso que minha dificuldade
para lidar com a realidade, diante da notícia acima, remeteu-me à ficção
kafkiana.
Ao perceber minha
“fuga”, procurei voltar à realidade e encarar os fatos, como se costuma dizer.
E então pude enumerar determinados elementos da trama, numa tentativa de
analisá-los racionalmente:
1. Suzana, acusada de assassinato, tem apenas 22 anos.
2. Ela é uma mulher, e matou uma criança.
3. O menino tinha apenas 6 anos de idade.
4. Ela é manicure.
5. Suzana registrou num diário o plano do crime.
6. Sua mãe encontrou o diário e o entregou à polícia.
Mulheres em geral
não matam crianças. Com apenas 22 anos de idade, Suzana talvez ainda não tivesse
acumulado tantas e tamanhas frustrações ao longo da vida para ter que lidar com
tamanho ódio. E despejar todo esse ódio num menino de 6 anos de idade? Uma
manicure trabalha segurando a mão das pessoas. Além disso, Suzana gosta de
escrever, ela tem um diário (como Kafka!), que a ajuda a organizar os
pensamentos (ou os não-pensamentos, apenas atuações desprovidas de pensamentos,
como os que a levaram ao crime). Ela convive com a mãe. A mãe, tendo encontrado
o diário de Suzana, provavelmente viveu um grande dilema, mas resolveu
entregá-lo à polícia.
Kafka, adepto do
Twitter, teria escrito:
A mãe, tendo
encontrado a prova definitiva que haveria de incriminar a própria filha,
acusada de assassinato, resolveu entregá-la à polícia.
Percebo que ainda
tenho dificuldade em permanecer na realidade e volto a Kafka! A “grande mala” é
a vida. A “tampa que se fecha” é o sentido da vida.
Apurado texto, que exprime com propriedade o espanto da vida, a loucura dos homens, o inusitado das mentes. Inspiradissimo!
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