Foto: A.Vianna, Brasília, 2012.
Embora tenha adquirido há pelo menos três anos uma esmoleira – comprei-a num antiquário, com a palavra de que se tratava de móvel do século XVIII – só hoje me dei conta de que tenho em casa uma esmoleira. Comprei-a porque precisava de um suporte para um novo aparelho de som, e ela preenchia as exigidas medidas de largura, comprimento e altura, além de combinar com o mobiliário existente.
Tenho a vaga lembrança de ter ouvido do antiquário, homem de aparência
séria, respeitável conhecedor, algo sobre esmoleiras de igreja, no Brasil
Colônia, mas nada daquilo permaneceu em meu espírito, utilitarista naquele
momento.
Depois de algum tempo, adquiri suporte mais adequado ao som,
desonerando a esmoleira de função tão trivial, tão prosaica, promovida que foi a
móvel decorativo. Desde essa época – nunca soube o porquê, agora sei – adquiri
inusitada prática, que se tornou para mim uma espécie de sagrado ritual. Todos
os dias colho uma flor no jardim e a coloco em um pequeno vaso de vidro, cuja
água também é trocada regularmente, sobre a esmoleira.
Hoje, trocadas a água e a flor, me dei conta de que tenho em casa uma
esmoleira de igreja, e que faço dela um altar.
Não posso saber por quanto tempo ela esteve no átrio de uma igreja do
interior – talvez em Minas Gerais, ainda segundo o vetusto antiquário – a
recolher piedosamente esmolas destinadas aos necessitados. Vale ressaltar, para
os que nunca tinham visto uma esmoleira de igreja, que a peça traz em seu
tampo, ou superfície, uma ranhura de alguns poucos centímetros, por onde eram
depositadas as esmolas. Desnecessário dizer que a gaveta onde caiam as moedas
(e notas?) traz uma boa fechadura. O padre haveria de trazer a chave bem
guardada.
Os bons dicionários que consultei registram:
esmoleira: mendiga, aquela que pede esmolas; bolsa ou alforje de mendigo; saco ou bolsa
para guardar esmolas.
Não encontrei outros significados. E
também não encontrei referências sobre esmoleira de igreja. Mas gosto de pensar
que tenho em casa uma esmoleira de igreja, sobre a qual deposito, todos os dias, uma flor.
Móvel fino,delicado e portentoso ao mesmo tempo com uma finalidade e nome que se opõem. Mas a Igreja sempre foi ostensiva. Texto e flor adornam o altar.
ResponderExcluirTudo serve para a escrita, Sergio! Até esmoleiras...
ExcluirEmbora não seja possível utilizá-la para fins de suporte, esta me parece tecnologicamente mais avançada para a coleta de óbolos: http://mcantiguidades.com.br/web/?204,cofre-esmoleira-209
ResponderExcluirRoberto, grato pelo endereço. Bonitas as peças! Mas ainda estou a procura de um texto sobre estes móveis.
ExcluirTexto bonito como tudo o que vem das Minas Gerais de outrora... mesmo com o talvez...:)
ResponderExcluir"Não posso saber por quanto tempo ela esteve no átrio de uma igreja do interior – talvez em Minas Gerais..."