A frase que empresta título a esta crônica é de Arthur Bispo do Rosário, e permanece inscrita na face
lateral de pequena caixa de madeira, de aproximadamente 30 cm de comprimento
por 3 ou 4 cm de largura, preenchida por cimento e encimada por uma fieira de
cacos de vidro, ao todo 26 pequenos cacos de vidro.
Trata-se de uma maquete,
portanto; da representação em escala reduzida de uma obra a ser construída. E
para que isso fique bem claro, o autor reafirma sua ideia utilizando-se de palavras.
Mais do que a orientação espacial para um determinado projeto (esta a
finalidade da maquete), a frase que ele faz questão de escrever soa como se
fosse uma ordem: “como é que eu devo
fazer”.
Mas apenas a ideia/ordem não é suficiente para aquele
que pensa, que imagina, que fantasia, enfim, que cria, pois ele precisa de uma
representação concreta, ele precisa de um objeto que dê forma a sua ideia, mesmo
que construído em escala reduzida, para exprimir aquilo que pensa. Ele deseja
ser compreendido.
De que casa estava a
falar Arthur Bispo do Rosário, quando, antes mesmo da própria casa, erigiu o
muro? Na época, ele residia na Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá, cujos
limites geográficos, segundo a biógrafa Luciana Hidalgo, “encampava uma área de
sete milhões de metros quadrados nos arredores do Maciço da Pedra Branca”.
Difícil imaginar que Bispo planejasse murar tão vastíssima área, a despeito de
seus delírios. Mais fácil supor que a ameaça, diante da qual ele precisava
levantar muro coberto com cacos de vidro, fosse de outra ordem, da ordem do
psíquico.
Ainda mais interessante
de se supor é que, a forma encontrada pelo autor para lidar com o que supomos
fosse uma ameaça, seja a manifestação artística, a construção do pequeno muro
de cacos de vidro, reforçado em seu alicerce pelas palavras “como é que eu devo fazer um muro no fundo
da minha casa”.
Hoje, quando se procura definir Arthur Bispo do
Rosário, tarefa sem dúvida difícil, diz-se que se trata de um artista, antes de
rotulá-lo como doente mental. A força da Arte, e consequentemente daquele que
cria, prepondera sobre qualquer outra circunstância. Questões acerca Do que é
Arte ?, Das funções da Arte, Das relações entre Arte e Loucura, são pertinentes
e inevitáveis ao nos depararmos com a produção de Arthur Bispo do Rosário.
No
entanto, nada disso importa àquele que se surpreende com uma pequena caixa de
madeira de 30 x 4 cm, preenchida por cimento e recoberta por cacos de vidro,
com a inscrição “como é que eu devo
fazer um muro no fundo da minha casa”, e que se emociona com esta indiscutível
pequena grande obra de arte.
E
o artista, então, logrou comunicar-se.
Olá, André Luiz Viana!
ResponderExcluirSeu texto é muito interesante. Minha filha é uma jovem psicanalista e está trabalhando um projeto de texto que aborda a interface entre Psicanálise e Arte.
Parabéns!
Otima cronica, rica de sugestoes psiquicas. Da uma vontade de ir la ver o Bispo...
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