segunda-feira, 15 de julho de 2013

9. Medo de morrer


            Se tenho medo de morrer? Não tenho. Há poucos anos vivi a experiência que chamo de quase morte. Descrevo-a aqui, para que o leitor possa compreender o porquê não tenho medo de morrer. Eu estava só, não importam aqui as razões. Certa noite apresentei febre alta, súbita manifestação de infecção urinária grave. Como não pudesse permanecer de pé, deitei-me. Não sei se dormi, mas com certeza delirei pela febre. Cometi o grave erro de não ingerir líquidos durante a noite. Quando a empregada chegou encontrou-me prostrado na cama. Percebi que o volume de urina havia diminuído consideravelmente pela manhã, o que agravou-se durante o dia. Praticamente, parei de urinar. O diagnóstico era fácil: insuficiência renal aguda. Iniciei com antibióticos, o que melhorou rapidamente o quadro infeccioso, porém a diurese não voltou ao normal. Comecei a apresentar intensas câimbras nas pernas, e notei arritmia cardíaca com taquicardia, algo parecido com fibrilação auricular, assim eu pensava. No quinto dia do processo resolvi chamar o médico, meu amigo pessoal, em minha casa. Ele atendeu-me prontamente, solicitou alguns exames de sangue, e assustou-se com os níveis sanguíneos do potássio.: 7,8 miliequivalentes por litro. Valores acima de 5 mEq/l são considerados fatores de alto risco para uma arritmia grave, com parada cardíaca. Meu amigo pediu-me gentilmente que me internasse em um hospital, insistiu comigo, apelou para a ajuda de amigos comuns, alguns chegaram a vir à minha casa. Recusei a internação porque não queria continuar vivendo. Simplesmente isso. Minhas filhas não suportaram a situação e me deixaram só. Foram 48 horas de espera, de espera pela morte. As câimbras pioraram muito, mal conseguia me levantar da cama. Passei duas noites em claro, observando o ritmo cardíaco, esperando pela parada cardíaca. Encontrava-me em paz.
            Depois destas 48 horas comecei a melhorar. Voltei a urinar, uma urina clara como água, mas abundante. Sabia que era a fase poliúrica da insuficiência renal. Alimentava-me exclusivamente de sopa, feita por minha empregada. Quando meu amigo voltou a me visitar, encontrou-me vivo, Isso é um milagre!, É impossível!
            Melhorei progressivamente, algumas semanas depois realizei novos exames de sangue, que vieram praticamente normais, com uma leve alteração da função renal.
            Foi assim que vivi a experiência de quase morte.

            Estiveram ao meu lado, com relativa consciência do que estava ocorrendo, meus três pequenos cães, Camões, Lola e Nina Simone. 

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