Eu tinha um amigo, homem cultíssimo, de
rara inteligência e memória prodigiosa, que gostava de repetir, Não leio
ficção. Ele lia apenas não ficção, ensaios, esse tipo de literatura. Eu
insistia com ele sobre a importância de se ler ficção, boa ficção,
naturalmente, que trata de sentimentos e emoções, mas ele permanecia
irredutível, Não leio ficção. Deve pensar assim até hoje.
O fato é
que eu não dispunha de argumentos sólidos para defender minhas ideias, tinha
apenas a intuição sobre o assunto. Agora surge o artigo de Marya
González Nieto para El País (19/jul/2016),
cujo título é bastante sugestivo: “Ler ficção nos torna mais empáticos”.
Keith
Oatley, psicólogo e romancista, em uma revisão sobre os benefícios da leitura sobre
a imaginação, publicado nesta terça-feira na Trends in
Cognitive Sciences,
afirma que ler
ficção ajuda nas relações sociais, auxilia na formação de ideias sobre as emoções,
as motivações e os pensamentos dos outros, possibilitando a transferência dessas
experiências para a vida real.
Segundo Oatley, professor emérito de psicologia aplicada e
desenvolvimento humano na Universidade de Toronto, “a ficção simula uma espécie
de mundo social que provoca compreensão e empatia no leitor. Quando lemos
ficção nos tornamos mais aptos a compreender as pessoas e suas intenções”.
“A característica mais importante do
ser humano é a sociabilidade”, afirma Oatley. “O que nos diferencia é que nós,
humanos, nos socializamos com outras pessoas de uma forma que não está
programada pelo instinto, como é o caso dos animais”, explica o psicólogo, para
quem a ficção pode ampliar a experiência social e ajudar a entendê-la.
Penso que, quem lê boa ficção – leia-se
boa literatura – sabe disso de forma instintiva, ou melhor dizendo, “sente”
isso!