segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Educação, mais uma vez


A entrevista de Nuccio Ordine, sociólogo e professor de Literatura Italiana na Universidade da Calábria, para o Estadão no último domingo, 16 de fevereiro, dá o que pensar. (1)
A ideia central é a de que o Professor Nuccio está desanimado, como devem estar desanimados todos os professores de boa fé em nosso país, pelo rumo que vem tomando a Educação no Brasil. Ou que não vem tomando, pois parece não haver rumo algum.
           O Ministério da Educação continua prestigioso, porém tão somente como trampolim para o próximo cargo, seja ele eletivo ou não. As ações visando uma Educação de melhor qualidade permanecem em segundo plano ou são completamente inexistentes. Com a Saúde acontece a mesma coisa, mas as repercussões do mau atendimento à população aparecem com maior frequência e amplitude na mídia, a gritaria é maior. Com a Educação a resposta é o silêncio. Qualquer mudança na área só poderá ser aquilatada daqui a 30 anos!
            As estatísticas revelam que um número cada vez maior de pessoas concluem um curso superior. Mas a que preço? O Professor Ordine alerta:

“A ditadura do lucro e do utilitarismo infectou todos os aspectos da nossa vida, chegando a contaminar esferas nas quais o dinheiro não deveria ter peso, como a educação. Transformar escolas e universidades em empresas que devem produzir unicamente diplomados para o mundo do trabalho é destruir o valor universal do ensino. Os estudantes adquirem créditos e pagam débitos com a esperança de conquistar uma profissão que possa dar a eles o máximo de riqueza. A escola e a universidade, ao contrário, devem formar os heréticos capazes de rejeitar o lugar-comum, de repelir a ideologia dominante de que a dignidade pode ser medida com base no dinheiro que possuímos ou com base no poder que possamos gerenciar. A felicidade, como nos recorda Montaigne, não consiste em possuir, mas em saber viver. ... Sem a literatura, a filosofia, a música e a arte, nós construiremos uma humanidade desumana, violenta, formada por indivíduos capazes de pensar exclusivamente em interesses egoístas.”

            O fenômeno não abarca apenas as instituições privadas. Na universidade pública, a relação entre alunos e professores em sala de aula mudou dramaticamente, e para pior, nos últimos anos. Pude constatar pessoalmente a deterioração desta relação ao perceber que os estudantes estavam muito mais ocupados com seus tablets e iphones, sem qualquer disposição para ouvir, muito menos considerar o que o professor tinha a dizer. Para minha surpresa, o Professor Ordine volta ao tema:

“As invenções mais revolucionárias da técnica (basta pensar no iPhone ou na internet) também podem se transformar numa forma de escravidão. Os estudantes que não conseguem desligar o celular nas aulas (ou as pessoas que não o desligam num concerto, no cinema, no teatro, numa conferência) comportam-se como drogados. O dispositivo tecnológico é como um fármaco: pode curar e pode matar. Tudo depende da dose.”

            Portanto, a responsabilidade é de todos nós. Ninguém discute que Educar é a prioridade, mas é preciso assumir a decisão política de fazê-lo. Isso, não tem sido feito.


Guernica revisitada



Não posso admitir que eu seja um neófito em visitas a museus. Se posso apreciá-los à altura é outra história, mas me considero um rato-de-museu. Qualquer cidade que planejamos visitar, pergunto logo à minha mulher, Tem museu? Se não tem, nada feito.
            Pois me preparava para visitar o Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, ou simplesmente Reina Sofia, em Madri, onde descansa em paz a Guernica, de Pablo Picasso. Ao entrar no museu procurei logo a sala do painel, e ao encontrá-la fui entrando, chegando perto, mais perto, fui chegando chegando chegando, parece que uma sirene disparou, não estava certo de tê-la ouvido, talvez muito distante, embora fosse agudo e estridente o alarme, que não foi capaz de me deter, e fui chegando cada vez mais perto, até que fui agarrado por dois seguranças. Foi quando acordei.
            Não foi um sonho, eu não estava dormindo. Estava numa espécie de transe, disparado pelo primeiro olhar ao painel. Logo em seguida chegou minha mulher, André, André, a sirene é para você...
            Envergonhado, pedi desculpas aos guardas e me postei atrás da faixa riscada no chão, que não podia ser ultrapassada e que eu nem reparei. Por sorte não fui confundido com um desses psicopatas que esfaqueiam quadros ou martelam esculturas. Por via das dúvidas, pude perceber que por um bom tempo os guardas não tiraram os olhos de mim, enquanto eu apreciava o mural.
            (Apenas duas obras de arte me impressionaram mais que a Guernica: a Capela Sistina e o David, ambos de Michelangelo.)
Semana passada, quando bati o olho na capa do livro e vi o nome de Carlo Ginzburg, autor do recém lançado Medo, reverência, terror, com o subtítulo Quatro ensaios de iconografia política (Companhia das Letras, 2014), fui ao índice e lá estava A espada e a lâmpada: uma leitura de Guernica.
            Pois o painel de Picasso permanece intrigando estudiosos e críticos de arte, segundo Ginzburg:

“– uma pintura fundamentalmente antifascista da qual o inimigo fascista está ausente, substituído por uma comunidade de seres humanos e animais ligados pela tragédia e pela morte.”
           
A frase do autor de O queijo e os vermes deixou-me pensando se não é isso mesmo: as únicas situações ainda capazes de mobilizar a humanidade, em busca de um destino melhor: a tragédia e a morte. Os últimos acontecimentos em nosso país apontam neste sentido.  

Inútil procura


...
 coitado do Seymour Hoffman.
– eu também gostava dele.
– grande ator.
– diretor de teatro...
– fez papel de mocinho.
– de bandido.
– foi padre.
– jornalista escritor.
– detetive.
– fez todos os papeis!
– talvez não tenha encontrado seu próprio papel.
...