Para começar
a conversa, devo dizer que não sei o que dizer aos pais que perderam seus
filhos. É sempre uma conversa muito difícil, quanto a isso não resta dúvida.
Nas ocasiões
em que me vi em tal situação, a primeira coisa que me ocorreu dizer foi que,
não tendo vivido aquela experiência, a de perder um filho, tinha muito mais a
aprender do que ensinar. Isso parecia imprimir um tom de realidade, porque
verdadeiro, à conversa que se iniciava, e trazer alguma segurança a ambos os
interlocutores. Como se eu dissesse, Você sabe mais do que eu e está em
melhores condições para se ajudar a si mesmo. Porém, deixava claro que, mesmo
em desvantagem, minha disponibilidade para ajudar era total.
Num momento
como esse, a pergunta “o que é ajudar?” ganha enorme dimensão! Sei que
“solucionar o problema para o outro” não significa ajudar, mesmo porque
constitui missão impossível. Então, cabe uma outra pergunta, aparentemente
singela mas de difícil resposta, Como posso ajudar? Quem ouve esta pergunta
atentamente e pode pensar sobre ela inicia um processo de autoajuda, com o
auxílio do interlocutor/terapeuta. É como se perguntasse a si mesmo, O que
posso fazer por mim?
Voltemos à
questão inicial, o que dizer aos pais que perderam seus filhos? Embora tenha já
confessado que não sei o que dizer, talvez possa ajudar o fato de que sei o que
NÃO dizer.
1. Jamais
digo Sei o que você está sentindo. Pela simples razão, exposta acima, de que
não posso saber o que nunca experimentei. Esta mentira “sei o que você está
sentindo” é ofensiva àquele que sofre. Em nada conforta. Demonstra apenas que o
interlocutor/terapeuta não dispõe de empatia para aquele com quem conversa. Em
outras palavras, Ele não sabe o que está dizendo. Talvez esteja apenas tentando
aplacar seu próprio sofrimento, diante da enorme impotência por não saber.
2. Nunca
digo Deus sabe o que faz. Ou Deus escreve certo por linhas tortas. Ou Devemos
aceitar os insondáveis desígnios de Deus. Ou Tenha fé em Deus. Isso é tudo que
um pai ou uma mãe não precisa ouvir nesse momento, pois, dirão, É esta a
infinita bondade de Deus!? Talvez eu
possa explicar que, nessas circunstâncias, blasfêmia não é pecado. (O que é o
pecado?) O ódio, bem como o amor, são sentimentos humanos, e é com eles que
devemos trabalhar, depois de reconhecê-los em nós.
3. Não posso
dizer Tenha paciência, isso vai passar. Mas quando?, haverão de perguntar os
pais imersos em insuportável sofrimento. Eles desejam o alívio imediato, pois aquela
dor é mesmo insuportável. Como então ter paciência?
Talvez
possam admitir que o tempo, que passa, ajuda, mas a questão é o que fazer
enquanto o tempo passa!
4. Não digo
Você precisa consultar um psiquiatra, que lhe prescreverá um antidepressivo e
um ansiolítico. Luto não é depressão. Por mais impiedoso que possa parecer,
viver e sofrer a tristeza do luto são necessários para a superação do próprio
luto. Tristeza não é depressão, portanto não precisa ser medicada.
Porém, luto
pode transformar-se em depressão. Então, é possível que seja necessária a ajuda
do psiquiatra.
5. Se os
pais apegam-se fervorosamente a uma religião ou seita num momento como este,
não me cabe condená-los, por mais que aquela seita ou religião contrariem
minhas próprias convicções. A ilusão, muitas vezes, é o recurso possível, e
fazemos isso desde que nascemos, diante das dificuldades que vamos encontrando.
6. Não faço
promessas que não poderei cumprir, como garantir a eficácia de qualquer forma
de tratamento ou terapia. Não pode haver qualquer garantia com relação ao que o
outro vai pensar, sentir ou fazer.
7. Se não
sei o que dizer, permaneço em silêncio. Talvez seja esta a regra fundamental, e
a mais difícil de ser praticada. Ouvir não é pouco.
Há muitas
outras coisas que posso ou devo dizer, e que não posso nem devo dizer aos pais
que perderam seus filhos. Sempre digo que se trata de algo antinatural, pois o
natural é que os pais morram antes dos filhos.