segunda-feira, 28 de abril de 2014

Caipira picando fumo (1893)



José Ferraz de Almeida Júnior: Itú, 1850 - Piracicaba, 1899.

Precursor da temática regionalista no Brasil.

"Almeida Júnior morreu precocemente, aos 49 anos, em 13 de novembro de 1899. Foi apunhalado em frente ao Hotel Central de Piracicaba, hoje já demolido, por José de Almeida Sampaio, seu primo e marido de Maria Laura do Amaral Gurgel, com quem o pintor manteve um relacionamento secreto por vários anos."

Este quadro pertence hoje à Pinacoteca do Estado, em São Paulo. 

Ref.: http://pt.wikipedia.org/wiki/Almeida_Júnior

Chuveiro de hotel


Álvaro era o tipo do sujeito considerado por todos que o conheciam como politicamente incorreto. Desse a ele uma chance e faria um discurso capaz de escandalizar o mais libertário dos homens. Às vezes Álvaro abusava dessa qualidade e tornava-se inconveniente, antissocial, agressivo mesmo, Tudo em prol da liberdade de pensamento e expressão, dizia ele, certo de que sempre os fins justificavam os meios.
            Preparava-se para uma curta viagem a São Paulo no fim de semana e antegozava aquilo que julgava ser um dos maiores prazeres dessa vida, um banho num bom chuveiro de hotel. Sempre que ia à Capital hospedava-se num hotel 5 estrelas e logo ao chegar, antes mesmo de desfeitas as malas, tomava um banho de chuveiro, com duração de no mínimo 30 minutos, É pra relaxar, dizia ele, a água na temperatura ideal, o jato forte caindo sobre a cabeça, a nuca, o dorso, verdadeira massagem de relaxamento. Isso é o que há de melhor num 5 estrelas, repetia ele.
            Pois daquela vez não seria diferente. Realizado o check-in, Álvaro foi conduzido a uma bela suíte, com cama king size, tv 52 polegadas 3D, decoração impecável. Álvaro só tinha olhos para o banheiro. O box do chuveiro pareceu-lhe perfeito, revestido de mármore de carrara, com aquela ducha enorme, verdadeira cachoeira. Despiu-se e foi ao banho.
            Ajustada a temperatura da água pela abertura milimetricamente dosada das torneiras quente e fria, Álvaro iniciou a tão esperada experiência que rotulava de Terapia pela água! Transcorridos apenas dois ou três minutos do delicioso banho, surgiu-lhe na mente, sabe-se lá de onde, em alto e bom som, sílaba por sílaba, a terrível palavra: CAN-TA-REI-RA!
            E não ficou nisso, para desespero de nosso hóspede 5 estrelas. As imagens sucediam-se:
            – Cantareira 12,9.
            – Cantareira 12,6.
            – Cantareira 12,2.
            – Cantareira 12,1.
            – Cantareira 11,9.
            Álvaro fechou imediatamente as torneiras para recuperar-se do susto e poder pensar. O que é isso, um pesadelo?, perguntou a si mesmo. Como se encontrasse ensaboado, abriu novamente as torneiras, mas a contagem regressiva continuou:
            – Cantareira 11,8.
            Álvaro fechou a água e saiu do banho. Isso é cansaço, tenho trabalhado muito, não tenho dormido bem, pensou. Vestiu-se e saiu para o almoço. Entretido com os negócios, a razão da viagem, voltou no início da noite para o hotel, ansioso por um bom banho de chuveiro.
Repetiu-se a experiência: nem bem havia regulado a temperatura da água, martelou-lhe na cabeça a palavra CANTAREIRA. E pior:
            – Cantareira 11,7.
            Álvaro fechou as torneiras suando frio e com taquicardia. O que é isso, meu Deus? Beliscou-se para ter certeza de que estava acordado. O que está acontecendo comigo? Não estou nem aí pra Cantareira, só desejo tomar o meu banho!
            Porém, a cada nova tentativa de banhar-se, o pesadelo voltava: CANTAREIRA CANTAREIRA CANTAREIRA.
Na manhã seguinte, bem cedo, Álvaro fechou a conta no hotel, antecipou o voo para casa, e à noite recusou-se a ver os jornais pela tv.