Com o estranho título Relatos do mundo, a sugerir algo mais sofisticado, a Netflix tenta ressuscitar o velho e agonizante western, espécie de gênero que parece desafiar tantos diretores de cinema.
O argumento baseia-se em Rastros de ódio, do grande John Ford. Relatos contém todos os detalhes que se repetem invariavelmente em cada filme de mocinho: um homem bom em luta permanente contra a humanidade má, os revólveres antigos tipo colt, espingardas enormes, cavalos, carroça, a roda da carroça que se quebra, caminhadas debaixo do sol escaldante de um deserto infinito, a sede mortal e a água do cantil que acaba. É a deliciosa repetição desses detalhes que fazem o western sobreviver.
O filme dirigido por Paul Greengrass tem tudo isso de forma bem dosada, nada de grandes arroubos, o ritmo lento acompanhado de uma fotografia espetacular. (O espectador não pode exigir muito não. Tem que gostar e pronto.)
Há algo extraordinário no filme, o ótimo desempenho de Tom Hanks, cuja versatilidade possibilita a encarnação de um mocinho diferente, ético acima de tudo, cujo papel empresta título ao filme. Acompanha-o na história uma menina muito branca e demasiadamente loura (Helena Zengel), perdida no mundo, completamente desamparada, à mercê dos homens maus, com atuação brilhante. Quando a munição da espingarda de caça acaba, é ela que surge com solução originalíssima!
Em tempos em que os machões estão em baixa, Hanks é o oposto de John Wayne, quase um intelectual, mas que também sabe lutar e matar os bandidos.
Senti falta de uma boa trilha sonora, elemento fundamental nesse tipo de filme.
Com todas as limitações, para quem aprecia o gênero e sabe ser generoso, vale a pena assistir Relatos do mundo.