Já escrevi
sobre Amós Oz romancista, ao comentar seu brilhante Judas, um livro fascinante. (http://loucoporcachorros.blogspot.com.br/2015/04/judas-de-amos-oz.html
)
Agora desejo falar do contista!
Amós Oz é um excelente contista, o que se pode conferir em pelo menos dois
de seus livros: Cenas da vida na aldeia
(2009) e Entre amigos ( 2014), ambos
editados pela Companhia das Letras, com a tradução do hebraico de Paulo Geiger.
Oz retrata a vida de um kibutz
através de seus moradores, protagonistas de histórias cheias de sentimento.
Trata de temas próprios daquele sistema de vida comunitária, como a
distribuição das tarefas diárias, a inutilidade do dinheiro, a educação das
crianças, misturando realidade e ficção na dose certa. Trata também dos temas
universais que povoam a literatura desde que ela existe: amor, ódio, traição,
inveja, orgulho, preconceito, abandono.
A elegância de sua escrita é a mesma
encontrada em Judas, como se pode ler
nesse trecho do conto Entre amigos:
“Antes do amanhecer a primeira chuva
começou a cair sobre as casas do Kibutz e sobre os campos e pomares. Um cheiro
fresco de terra molhada e de folhas que tinham sido lavadas da poeira encheu o
ar. A chuva varria os telhados vermelhos e as coberturas de zinco e fazia
barulho nas calhas. À primeira luz do dia pairava entre as casas o vapor de uma
neblina rala e nas flores dos jardins do kibutz brilhavam gotas d‘água. Um
aspersor continuava, sem necessidade, a girar e a lançar jatos de água sobre os
gramados. Velocípedes vermelhos molhados atravessavam, enviesados, a largura
dos caminhos. De dentro das copas das árvores ornamentais se ouviam os cantos
agudos e urgentes dos espantados passarinhos.
A chuva acordou Nahum Ashrov de um
sono ruim.”
Não é preciso sair do kibutz para
que Amós Oz construa a sua comédia humana.