Os gorilas vivem em pequenas unidades familiares,
com um macho dominante, várias fêmeas e filhotes.
Foto: REUTERS/Thomas Mukoya
“Os gorilas têm uma estrutura social mais complexa do que se imaginava e muito similar à das sociedades humanas, revela novo estudo. As descobertas sugerem que os nossos sistemas sociais remontam ao ancestral comum entre humanos e macacos e não teriam se originado do “cérebro social” dos hominídeos surgido depois de se separarem dos outros primatas.” A reportagem é de Roberta Jansen, para O Estado de S.Paulo (11 jul 2019).
O estudo foi baseado em dados coletados na República Democrática do Congo ao longo de quase vinte anos. “Estudar a vida social dos gorilas não é fácil”, afirmou a principal autora do estudo, Robin Morrison, uma bioantropóloga da Universidade de Cambridge. “Os gorilas passam a maior parte do tempo em florestas densas, e pode levar anos até que se habituem à presença de humanos.”
Os gorilas costumam se reunir para se alimentar da vegetação aquática em clarões na floresta. A maior parte das informações vem da clareira Mbeji Bai, onde cientistas trabalham há mais de vinte anos.
“Os gorilas vivem em pequenas unidades familiares, com um macho dominante, várias fêmeas e filhotes. Alguns machos vivem isolados, como “solteirões”.
“Além da família imediata, existem indivíduos com quem são mantidas interações regulares – um grupo de aproximadamente 13 gorilas. Nas sociedades humanas tradicionais, esse grupo poderia ser comparado ao da “família estendida”, ou seja, tios, avós, primos.”
“Para além desse grupo, há um outro que envolve, em média 40 gorilas, e que seria similar ao de agregados entre os humanos, gente que passa muito tempo junto sem necessariamente ter alguma relação de parentesco. “Fazendo uma analogia com os primeiros assentamentos humanos, seria como uma tribo ou pequeno assentamento, um vilarejo”, disse Morrison.”
“Quando os machos dominantes (os de costas prateadas) são aparentados, as chances de conviverem na mesma “tribo” é maior.”
“Ao longo da vida, as fêmeas frequentam vários grupos ao mesmo tempo, o que torna possível que machos não aparentados cresçam nos mesmos ambientes, como se fossem irmãos postiços. E os laços que eles criam levam a essas associações que vemos quando estão adultos.”
“Às vezes, explica a pesquisadora, quando os jovens machos deixam suas famílias originais, mas, ao mesmo tempo, ainda não estão preparados para formar o seu próprio núcleo familiar, eles formam grupos somente de machos solteiros. Soa familiar?”
“Essa estrutura social que constatamos entre os gorilas provavelmente já estava presente entre os primatas antes de a nossa espécie divergir das demais; uma estrutura que se adapta muito bem ao modelo de evolução social humana”, explicou Morrison. “Nossas descobertas oferecem ainda mais indícios de que esses animais ameaçados são profundamente inteligentes e sofisticados e que nós, humanos, talvez não sejamos tão especiais quanto gostamos de acreditar.”
Desejo acrescentar apenas: talvez, não; não somos tão especiais quanto gostamos de acreditar.
Dito de outra maneira: somos especiais na medida em que a evolução das espécies, inicialmente descrita por Darwin, é um processo especialíssimo, fantástico, maravilhoso, de tal modo que todos os seres vivos desenvolvidos a partir dele são verdadeiramente especiais.