Resposta do grupo feminista, na tradução da filósofa da
UFRJ, Tatiana Roque:
"Os porcos e seus (suas) aliado(a)s têm razão de se
inquietar
Cada vez que os direitos das mulheres progridem, que as
consciências acordam, as resistências aparecem. Em geral, elas tomam a forma de
um “é verdade, mas...”. Com diversas militantes feministas, respondemos à
tribuna do Le Monde.
Este 9 de janeiro tivemos direito a um “#Metoo é
legal, mas....”. Nada realmente novo nos argumentos utilizados. Encontramos os
mesmos argumentos no texto publicado no Le Monde no trabalho, em
torno da máquina de café ou em refeições familiares. Esta tribuna é um pouco o
colega incômodo ou o tio cansativo que não entendem o que está acontecendo.
"Arriscaríamos ir muito longe". Sempre que a
igualdade avança, mesmo que meio milímetro, as boas almas imediatamente nos
alertam para o fato de que arriscamos cair no excesso. No excesso, estamos
totalmente dentro. É aquele do mundo em que vivemos. Na França, todos os dias,
centenas de milhares de mulheres são vítimas de assédio. Dezenas de milhares de
agressões sexuais. E centenas de violações. Todos os dias. A caricatura está
aí.
"Não se
pode mais dizer nada". Como se o fato de nossa sociedade
tolerar - um pouco - menos do que antes as propostas sexistas, assim como as
propostas racistas ou homofóbicas, fosse um problema. "Nossa! Era
francamente melhor quando podíamos chamar as mulheres de vagabundas
tranquilamente, hein?". Não. Era pior. A linguagem
tem influência no comportamento humano: aceitar insultos contra as
mulheres significa, na verdade, autorizar as violências. O controle de nossa
língua é um sinal de que nossa sociedade está progredindo.
“É puritanismo”. Fazer com que as feministas pareçam
travadas ou mesmo mal-amadas: a originalidade das signatárias da tribuna é...
desconcertante. A violência pesa sobre as mulheres. Todas. Pesa sobre nossos
espíritos, nossos corpos, nossos prazeres e nossas sexualidades. Como imaginar,
só por um instante, uma sociedade liberada, na qual as mulheres disponham
livremente e plenamente de seus corpos e de suas sexualidades, enquanto uma em
cada duas declara já ter sofrido violência sexual?
“Não se pode mais paquerar”. As signatárias da tribuna
misturam deliberadamente uma relação de sedução, baseada no respeito e no
prazer, com uma violência. Misturar tudo é prático. Permite colocar tudo no
mesmo saco. No fundo, se o assédio ou a agressão são “a paquera pesada”, é que
não é tão grave. As signatárias se enganam. Não há uma diferença de grau entre
a paquera e o assédio, mas uma diferença de natureza. As violências não são
“sedução exagerada”. De um lado, considera-se a outra como igual, respeitando
seus desejos, quaisquer que sejam. De outro, como um objeto à disposição, sem
ligar para seus próprios desejos nem para seu consentimento.
“É responsabilidade das mulheres”. As signatárias falam
sobre a educação a ser dada às meninas para que elas não se deixem intimidar.
As mulheres são, portanto, designadas como responsáveis por não serem
agredidas. Quando colocaremos a questão da responsabilidade dos homens de não
estuprar ou agredir?
As mulheres são seres humanos. Como os outros. Temos direito
ao respeito. Temos o direito fundamental de não sermos insultadas, assobiadas,
agredidas, estupradas. Temos o direito fundamental de vivermos nossas vidas em
segurança. Na França, nos Estados Unidos, no Senegal, na Tailândia ou no
Brasil: este não é o caso hoje. Em nenhum lugar.
As signatárias são, em sua maior parte, reincidentes
na defesa de pedófilos ou de apologias ao estupro. Elas usam, mais
uma vez, sua visibilidade midiática para banalizar a violência sexual. Elas
desprezam de fato as milhões de mulheres que sofrem ou sofreram essas
violências.
Muitas delas estão, frequentemente, prontas a denunciar o
sexismo quando vem de homens de bairros populares. Mas a mão na bunda, quando é
exercida por homens de seu meio, tem a ver, segundo elas, com o "direito
de importunar". Essa estranha ambivalência permite apreciar seu apego ao
feminismo que elas reivindicam.
Com este texto, elas tentam recolocar a camisa de força que
começamos a retirar. Elas não conseguirão. Nós somos as vítimas de violência.
Não temos vergonha. Estamos de pé. Fortes. Entusiastas. Determinadas. Vamos acabar
com as violências sexistas e sexuais.
Os porcos e seus (suas) aliado(a)s estão preocupados? É
normal. Seu velho mundo está desaparecendo. Muito devagar – devagar demais –
mas inexoravelmente. Algumas reminiscências empoeiradas não mudarão nada nisso,
mesmo publicadas no Le Monde."