Cinco
respostas de Sérgio Moro aos jornalistas Fausto Macedo e Ricardo Brandt (5/11/2016), em entrevista para o jornal O Estado de S. Paulo.
Estado – O que o chocou mais na Lava Jato?
Moro
– A própria dimensão dos fatos. Eu tenho falado que a corrupção existe em
qualquer lugar do mundo. Considerando os casos já julgados aqui, o que nós
vimos foi um caso de corrupção sistêmica, corrupção como uma espécie de
regra do jogo. O que mais me chamou a atenção, talvez tenha sido uma quase
naturalização da prática da corrupção. Empresários pagavam como uma
prática habitual e agentes públicos recebiam como se fosse algo também
natural. Isso foi bastante perturbador. Ilustrativamente, também a
constatação, e aí me refiro a casos que já foram julgados, de que algumas
pessoas que haviam sido condenadas na ação penal 470 persistiam recebendo
propinas nesse outro esquema criminoso na Petrobrás. Inclusive, durante o
julgamento pelo
Plenário do Supremo Tribunal Federal, a
demonstrar que a pessoa está sendo julgada pelo Supremo e sequer aquilo
teve efeito preventivo para deixar de receber propinas. Foi uma coisa
bastante perturbadora.
Estado – Como o sr. viu os protestos das ruas?
Moro – Acredito que seja um amadurecimento progressivo da
democracia brasileira. Ilustrativamente, nós tivemos aí milhões de pessoas
que saíram às ruas, protestando também contra a corrupção e dando apoio
às investigações. Isso é algo muito significativo. E situa de uma
maneira muito clara esse enfrentamento da corrupção como uma conquista
da democracia brasileira.
Estado – Crítica recorrente das defesas é que há um excesso de
prisões na Lava Jato. A operação prende para arrancar delações?
Moro – É uma questão interessante, até fiz um levantamento,
temos hoje dez acusados presos preventivamente sem julgamento. Dez,
apenas. Então, se afirma que existe um uso excessivo de prisões
preventivas, e, claro, mais prisões preventivas foram decretadas no
passado. Mas se existem dez acusados, pessoas que já respondem ações
penais e que estão submetidas a prisão preventiva, sem julgamento no
presente momento. Não me parece que seja um número excessivo. Isso a gente
tem colocado de uma maneira muito clara. Jamais se prende para
obter confissões. Isso seria algo reprovável do ponto de vista
jurídico. Sempre as prisões têm sido decretadas quando se entende que
estão presentes os fundamentos das prisões. Quando se vai olhar mais
de perto os motivos das prisões, se percebe que todas as prisões estão fundamentadas.
Pode até se discordar da decisão do juiz, mas estão todas fundamentadas na
lei. Não existe nada, ninguém advoga uma solução fora da lei aqui nos
processos da Lava Jato. Estamos seguindo estritamente o que a lei prevê.
Estado – A Lava Jato vai acabar com a corrupção no Brasil?
Moro
– Não, não existe um salvação nacional, não existe um fato ou uma pessoa
que vai salvar o País. Isso era uma reminiscência daquilo que a gente
chama Sebastianismo. Acho que a democracia é construída no seu dia a dia.
Agora, um caso, pela escala que ele tem, como esse da Lava Jato, ele pode
auxiliar a melhorar a qualidade da nossa democracia. Identificando essas
situações, dando uma resposta efetiva, as pessoas passam a ter mais fé nas
instituições e na aplicação igual da lei. E se for aproveitada esse
oportunidade também serem aprovadas reformas legais, que não só tornem mais
eficientes o sistema de Justiça criminal, mas diminuam oportunidades para
a corrupção, aí sim podemos superar esse quadro de corrupção sistêmica.
Estado – O sr. sairia candidato a um cargo eletivo? Ou entraria para a
política?
Moro – Não, jamais. Jamais. Sou um homem de Justiça e sem
qualquer demérito, não sou um homem da política. Acho que a política é
uma atividade importante, não tem nenhum demérito, muito pelo contrário, existem
muitos méritos em quem atua na política, mas eu sou um juiz, eu estou em
outra realidade, outro tipo de trabalho, outro perfil. Então, não existe
jamais esse risco.