Andrew Higgins, correspondente do The New York Times e O Estado de S.Paulo, publicou artigo intitulado A mentira como ferramenta política (tradução de Romina Cácia, 12 jan 2021). Relata que “Em um telegrama para Washington em 1944, George F. Kennan, conselheiro da Embaixada dos EUA na Moscou de Stalin, alertou sobre o poder oculto mantido por mentiras, observando que o governo soviético "tinha comprovado algumas coisas estranhas e perturbadoras sobre a natureza humana." A mais importante entre elas, escreveu ele, é que, no caso de muitas pessoas, “é possível fazê-las sentir e acreditar em praticamente qualquer coisa”. Não importa o quão falso algo possa ser, ele escreveu, “para as pessoas que acreditam nisso, torna-se verdade. Ela conquista a validade e todos os poderes da verdade.”
O assunto nunca foi tão atual e ao mesmo tempo assustador: Trump mente de maneira descarada nos Estados Unidos e Bolsonaro faz o mesmo no Brasil, e a manada acredita.
Maquiavel, no século 16, escreveu, "aquele que engana sempre encontrará aqueles que se permitem ser enganados.” Adolf Hitler chegou ao poder “com a mentira de que os judeus foram responsáveis pela derrota da Alemanha na 1ª Guerra.”
“Para os ditadores alemães e soviéticos, mentir não era apenas um hábito ou uma maneira conveniente de dar fim a fatos indesejáveis, mas uma ferramenta essencial de governo.” Os subordinados eram forçados a aplaudir declarações que sabiam ser falsas, fenômeno frequentíssimo na política brasileira de hoje, verificável até mesmo na fala de Ministros de Estado.
Kennan escreveu: “O controle ilimitado da mente das pessoas [depende] não apenas da capacidade de alimentá-las com sua própria propaganda, mas também de ver que nenhum outro sujeito as alimenta com a dele”.
Afirma Higgins, “Isso foi mais notavelmente personificado pela expansão global do QAnon, um fenômeno outrora obscuro que afirma que o mundo é dirigido por uma conspiração de poderosos políticos liberais que são pedófilos sádicos. Trump não repudiou os discípulos do QAnon, muitos dos quais participaram do caos no Capitólio na última quarta-feira. Em agosto, ele os elogiou como pessoas que “amam nosso país”.
O filósofo francês Alexandre Koyré escreveu em 1943, em Reflexões sobre a mentira: “quanto mais grosseira, maior, mais imperfeita a mentira, mais prontamente ela é acreditada e seguida”.
Penso que estas são ideias que precisam ser difundidas, um alerta para as pessoas que talvez possam parar e pensar sobre em quem e no que estão acreditando. A tática desenvolvida pelo nosso presidente, de mentir diariamente ao pequeno grupo de seguidores em frente ao Alvorada, e com isso manter a mídia reverberando e discutindo mentiras, nada mais é que ferramenta política de governo.
Não há nada de novo no que acabo de escrever, mas talvez seja preciso repetir repetir repetir. Pensar, eis a questão.