“Nós, os amigos de Aldir Blanc, não pudemos nos despedir dele. Quando soubemos que fora para o Miguel Couto, Aldir já estava fora do nosso alcance, como acontece com as vítimas da Covid-19. E, quando o transferiram para a UTI e depois para o Pedro Ernesto, nem mais sua família pôde vê-lo. Ninguém, exceto a equipe médica, foi testemunha da luta que, inconsciente, seu corpo travou contra a morte durante 20 dias. Ninguém, exceto os íntimos, pôde levá-lo ao reduto final, e nem mesmo a eles foi concedido um beijo ou olhar de despedida.”
Assim tem início a crônica de hoje de Ruy Castro, para a Folha de S.Paulo (8 mai 2020), com o título A seguir, os omissos e hidrófobos. Transcrevo apenas o primeiro parágrafo, pois é isso que me afeta profundamente.
Não temo a morte, mas sinto pavor em pensar na experiência final descrita por Ruy Castro. Sair de casa, de minha casa, deixar as pessoas que amo, deixar meus cães, me internar em uma UTI, isolado do mundo, com muita falta de ar, ser entubado, colocado num respirador – sabe-se quanto de consciência me restará nesse momento –, e morrer, longe de tudo e de todos.
Depois de tanto sofrimento, enfim, o alívio.
A dor agora é de quem fica.