sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Perguntas e respostas

Extraído do livro Trópicos utópicos, de Eduardo Giannetti (Companhia das Letras, 2016, pág. 60):

“Quando Mahatma Gandhi desembarcou no porto de Southampton, no sul da Inglaterra, em 1931, a fim de participar de uma conferência sobre o futuro da Índia, um jornalista teria perguntado a ele: “O que o senhor acha da civilização ocidental?”. E o líder indiano respondeu: “Acho que seria uma boa ideia.”

            O noticiário atual, principalmente da televisão, está repleto dessas perguntas irreverentes (para dizer o mínimo), e os jornalistas estão convencidos de que esta é a função deles: espicaçar, cutucar a onça com vara curta, provocar o interrogado em busca de uma resposta violenta, escandalosa, e isso vira imediatamente um furo jornalístico. Viraliza!
            Se o inquirido é macaco velho, ele não cai na armadilha. Mesmo um macaco velho pode cair na armadilha. Outro dia, perguntado sobre o que achava de um certo assunto, um senador da república respondeu:
– O  que interessa o que penso sobre isso?
Virou notícia, pois o ódio estava implícito na resposta malcriada e estampado na face do senador.
            O diálogo entre a senadora e uma transeunte é outro bom exemplo de pergunta complicada e resposta difícil:
            – A senhora está preparada para ser presa?
            – Quem vai ser presa é você.
            – Eu?! Eu não roubei!
            – Polícia, tira ela daqui...
            Viralizou!
            A resposta oferecida por Gandhi ao jornalista arrogante e preconceituoso – embora a pergunta tenha sido elaborada num nível bem mais elevado do que os questionamentos atuais – exprime bem a consciência plena que ele possuía de seu lugar no mundo e o lugar de seu país. A consciência do próprio valor. Ninguém poderia rebaixá-lo, nem a seu país, porque Gandhi conhecia o significado e a extensão da palavra civilização. Trata-se do bom emprego da fina ironia como resposta.
            Ter consciência que cometeu atos ilícitos dificulta a resposta adequada à pergunta impertinente. Ou se faz silêncio – o que muitas vezes soa como uma confissão –, ou a resposta sai mascada, torta, autoincriminatória, um desastre. E viraliza!

            Nada como a consciência limpa.

Berthe Morisot

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