“Então, em que consiste o
trabalho realizado pelo luto? Creio que não é forçado descrevê-lo da seguinte
maneira: a prova de realidade mostrou que o objeto amado já não existe mais e
agora exige que toda a libido seja retirada de suas ligações com esse objeto.
Contra isso se levanta uma compreensível oposição; em geral se observa que o
homem não abandona de bom grado uma posição da libido, nem mesmo quando um
substituo já se lhe acena. Esta oposição pode ser tão intensa que ocorre um
afastamento da realidade e uma adesão ao objeto por meio de uma psicose
alucinatória de desejo. O normal é que vença o respeito à realidade. Mas sua
incumbência não pode ser imediatamente atendida. Ela será cumprida pouco a
pouco com grande dispêndio de tempo e de energia de investimento, e enquanto
isso a existência do objeto de investimento é psiquicamente prolongada. Uma a
uma, as lembranças e expectativas pelas quais a libido se ligava ao objeto são
focalizadas e superinvestidas e nelas se realiza o desligamento da libido. Por
que essa operação de compromisso, que consiste em executar uma por uma a ordem
da realidade, é tão extraordinariamente dolorosa, é algo que não fica
facilmente indicado em uma fundamentação econômica. E o notável é que esse
doloroso desprazer nos parece natural. Mas de fato, uma vez concluído o
trabalho do luto, o ego fica novamente livre e desinibido.”
Sigmund
Freud
Luto
e melancolia
Tradução
de Marilene Carone
Cosacnaify,
2011